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A Agência Nacional de Energia Elétrica anunciou nesta sexta-feira (28) bandeira tarifária verde - sem cobranças adicionais - para fevereiro de 2022, mas apenas para os consumidores beneficiados pela Tarifa Social. Conforme a Aneel "a bandeira em vigor para grande parte dos consumidores, até abril, continua a de Escassez Hídrica, no valor de R$ 14,20 [cobrados adicionalmente nas contas de luz] a cada 100 quilowatt-hora consumidos".
A cobrança extra pela escassez hídrica, criada pela Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética (CREG, hoje extinta) em agosto passado, elevou para cinco os patamares do sistema de bandeiras tarifárias, ao lado das já conhecidas verde, amarela, e vermelhas 1 e 2, empregadas pela reguladora desde 2015.
A escolha dessas cores não é coincidência: pretende indicar ao consumidor, de modo simplificado, como estão as condições de geração do sistema elétrico e, principalmente, sinalizar para a necessidade maior ou menor de economia de energia. É um semáforo que demonstra caminho livre, necessidade de alerta ou de "pé no freio", dando ao consumidor uma ferramenta a mais para decidir sobre seus hábitos, com uma sinalização que lhe permite reagir ao preço mais alto que virá.
Semáforo do consumo
Juntamente com a sinalização por cor vem outra, que pretende convencer o cidadão a poupar energia por meio do peso no bolso. A bandeira verde é a única desacompanhada de acréscimos na conta de luz. A partir do acionamento do patamar amarelo, a conta passa a ficar mais cara, com a subida significativa dos adicionais aplicados à medida que as condições de produção da eletricidade se tornam mais desafiadoras, com a necessidade de fazer uso de fontes mais custosas do que a hídrica:
- Bandeira verde: traz a indicação de condições favoráveis de geração de energia e, portanto, a tarifa não sofre acréscimos;
- Bandeira amarela: pretende acender um sinal de alerta, apontando que as condições de geração estão menos favoráveis. Junto da sua sinalização são cobrados R$ 1,87 extras para cada 100 quilowatt-hora (kWh) consumidos (ou sobre o consumo mínimo, se for o caso);
- Bandeira vermelha - Patamar 1: indica a necessidade de frear o consumo por causa de condições mais custosas de geração de energia no país. Com ela, a tarifa tem ainda acréscimo de R$ 3,97 por 100 kWh consumidos;
- Bandeira vermelha - Patamar 2: aponta um encarecimento ainda maior da geração de eletricidade, com a apelo a fontes bastante caras, como as termelétricas. É o degrau mais alto de acréscimos no sistema regular das bandeiras, com R$ 9,49 adicionais cobrados na conta de luz para cada 100 kWh.
Na prática, essa série de patamares reflete os custos variáveis da geração de energia elétrica no momento em que eles ocorrem, o que deu mais transparência à conta de energia segundo a Aneel. "Antes das bandeiras, essas variações de custos só eram repassadas no reajuste [tarifário] seguinte, o que poderia ocorrer até um ano depois. Com as bandeiras, a conta de energia passou a ser mais transparente e o consumidor tem a informação no momento em que esses custos acontecem", resume a reguladora.
Aqui cabe diferenciar que os reajustes tarifários anuais, aqueles aplicados ao valor que é cobrado pelas distribuidoras de energia, são sempre estimados levando-se em conta a expectativa de um cenário de geração favorável. Por isso, de acordo com a Aneel, "se os custos de geração forem maiores e for necessário acionar as bandeiras amarela ou vermelha, o consumidor paga as variações do custo de geração por meio das bandeiras aplicadas".
Uma bandeira tarifária de exceção
Em setembro de 2021 o brasileiro foi apresentado ao novo patamar, criado em decorrência da pior crise hídrica em 91 anos e batizado de acordo: Escassez Hídrica, nome autoexplicativo para indicar a gravidade da situação enfrentada. Apesar da nova bandeira, o país seguiu gastando mais com geração do que foi possível cobrir com os R$ 14,20 extras desembolsados pelo consumidor a cada 100 kWh consumidos.
A estimativa é de que o déficit alcance R$ 17 bilhões, mais alto do que as previsões do governo federal, e que ainda deve assombrar o consumidor nos reajustes das distribuidoras nos próximos anos.
A decisão impopular de manter a bandeira Escassez Hídrica em vigor até abril, conforme prazo originalmente anunciado, tem relação com a necessidade de pagar a conta da crise de 2021, mas também de evitar problemas futuros para a geração brasileira, ainda bastante centrada nas usinas hidrelétricas (que somam 65% da produção de eletricidade). Consultorias especializadas no setor elétrico apontam que as condições atuais do sistema já são compatíveis com uma volta da bandeira tarifária ao patamar verde, o que não ocorre desde janeiro de 2021, mas cabe olhar além.
As chuvas chegaram na época esperada e os reservatórios têm se recuperando, a geração térmica já passa por reduções, mas a avaliação é de que ainda é cedo para decretar uma normalização das condições de geração após anos de afluência aquém do necessário para recuperar o armazenamento de água – cenário que se prolonga desde 2012. A postura, portanto, é de manter uma abordagem conservadora e garantir segurança energética, evitando novos riscos de desabastecimento (afastados a alto custo em 2021).
Na avaliação de Lígia Schlittler, mestre em Direito Ambiental e da Energia e integrante do Centro de Estudos de Energia da Fundação Getulio Vargas (FGV), o panorama é, sim, frustrante para o consumidor, pressionado pela crise econômica. Entretanto, um encerramento precoce da bandeira tarifária extraordinária não viria sem consequências.
"A Aneel já foi instada a dar satisfações, pedindo a redução imediata da bandeira. Você pode retirar, mas o rombo vai ser maior para pagar com juros. Porque ao menos havendo uma bandeira em vigor hoje os brasileiros pensam antes de ligar tudo ao mesmo tempo. Pesa no bolso e a gente passa a usar de forma mais eficiente os recursos. A bandeira de escassez hídrica é um sinal econômico importante para esse consumidor que precisa, sim, poupar energia. Se tirar a bandeira tarifária vai ter uma conta ainda maior a pagar ", completa.
A expectativa é de que a partir do mês de maio o sistema regular de bandeiras, de verde a vermelha, seja retomado. O anúncio da bandeira tarifária a vigorar a partir de então está previsto para o 29 de abril. Conforme análises da consultoria especializada Megawhat, deve haver retorno para a bandeira verde no decorrer do ano, com a necessidade de acionamento da bandeira amarela entre junho e agosto.