SÃO PAULO e Londres - Em rara crítica aos governos europeus, o presidente demissionário do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, responsabilizou ontem os países que não agiram para evitar a crise da dívida. Trichet rebateu críticas vindas principalmente da Alemanha, que discorda do programa do BCE de compra de títulos da dívida para ajudar a reduzir as taxas de juros. "Se nós embarcamos no programa [de intervenção], foi porque os governos em questão não se comportaram de forma apropriada", disse Trichet, na Alemanha.

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O programa de intervenção no mercado de títulos começou em 4 de agosto, quando os juros da dívida da Espanha e da Itália com vencimento em dez anos ultrapassavam 6% – um nível considerado insustentável para padrões europeus. Depois das compras, essas taxas caíram para menos de 5%.

Trichet defendeu também as ações do BCE para controlar a inflação nos últimos meses, elevando os juros. Mas, ontem, a instituição manteve a taxa em 1,5%, o mesmo nível de abril e junho, para não prejudicar mais o lento crescimento econômico. Trichet, que passa o cargo em novembro para o italiano Mario Draghi, disse que a instituição sempre defendeu a estabilidade de preços, que fortalece o euro.

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Trichet disse que o nível de incerteza é "enorme", que o crescimento econômico desacelerou e que a inflação deverá cair no próximo ano. É um discurso novo para quem já havia elevado os juros duas vezes neste ano, em abril e julho. As palavras trazem um tom de tranquilidade e estão dentro do cenário de instabilidade atual, no qual os bancos centrais começam a rever suas estratégias. Essa previsão indicou para o mercado financeiro que a taxa de juros pode voltar a cair em outubro, na próxima reunião do conselho de política monetária do BCE.

"Claramente, o comunicado é consistente com uma preparação gradual do BCE para um potencial corte de juros neste ambiente, caso o crescimento ou a inflação caiam", escreve Julian Callow, analista do Barclays Capital. De qualquer forma, os especialistas acreditam que o BCE irá, no mínimo, manter os juros por muito tempo.