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Dependência das gigantes tecnológicas

Três pontos para entender os riscos de uma vida intermediada pelas Big Techs

Big techs
Avanço da tecnologia deve aumentar a dependência das big techs, as gigantes da tecnologia. (Foto: AFP)

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No dia 14 de dezembro de 2020 os usuários de serviços de tecnologia experimentaram a prova mais recente da sua dependência das plataformas mundiais. Com os serviços do Google fora do ar, muitas pessoas e também empresas se viram impossibilitadas de realizar diversas atividades durante os 45 minutos de falha no sistema de autenticação de ferramentas como Gmail, Google Drive, YouTube e outros. O tempo de indisponibilidade foi curto, mas serviu para – mais uma vez – comprovar que as chamadas Big Techs podem manter o mundo todo refém no mercado superconcentrado em que atuam.

Na avaliação de especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o cenário ainda pode piorar. Quanto mais a tecnologia avança (com a internet das coisas e o 5G, por exemplo), mais nossa vida é intermediada por uma ou mais gigantes globais de tecnologia e maiores são os riscos caso o sistema pare de funcionar – ainda que por poucas horas.

O especialista em tecnologia e inovação Arthur Igreja destaca que episódios de falhas ou instabilidades (mais ou menos pontuais) expõem a dependência da sociedade diante de empresas de tecnologia.

"É só nesses momentos em que [o serviço] para de funcionar que a gente se dá conta disso. O mesmo vale para WhatsApp, para todas essas ferramentas", pontuou. Igreja destaca ainda que essa dependência vai além do cotidiano das pessoas físicas. "As empresas ficam paralisadas e na pandemia, como todo mudo está trabalhando [de foma] mais digital, o impacto é ainda maior", diz.

1. Dependência crescente das Big Techs também nas empresas

Além de a tecnologia se tornar cada vez mais uma ferramenta de intermediação das atividades do dia a dia, com as comunicações realizadas amplamente de modo online e seu uso chegando às tarefas mais rotineiras, como acionar um interruptor, as Big Techs estendem seu alcance também às empresas.

Com um amplo leque de serviços oferecidos por essas gigantes globais, companhias se valem da praticidade e da pronta aplicabilidade das ferramentas – o que barateia os processos na comparação com seu desenvolvimento direcionado – e se colocam vulneráveis diante das possibilidades de falha.

Segundo o professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Vivaldo José Breternitz, um fenômeno atual que trará mais riscos é a migração dos serviços de processamento e da guarda de dados corporativos para a nuvem. "Tudo indica que esse processo em termos de empresas tende a se acelerar. E quem são os grandes provedores do serviço de nuvem? Amazon, Microsoft e outros desse porte. Nós passaríamos a depender cada vez mais dessas empresas", afirma.

Essa preocupação passa pela concentração de mercado, diz Arthur Igreja. "Sempre que ela existe, o risco é maior. Quando nós olhamos o mercado de buscadores, o Google é completamente dominante, é um monopólio. A questão primordial da Amazon é a AWS, de hospedagem [em nuvem]; sistemas operacionais de smartphone temos praticamente apenas Apple e Google", enumera.

Na avaliação de Igreja, esse cenário amplia a força dessas empresas para outras esferas. "Esse movimento das Big Techs censurando o [presidente dos EUA, Donald] Trump e outros conteúdos mostra a força que elas têm", acredita.

2. Mais poder e necessidade de regulação

Neste mês, Trump foi banido de redes sociais e o site Parler (um espécie de "Twitter dos conservadores"), retirado das plataformas de hospedagem, em iniciativas criticadas e apontadas como ameaças à liberdade de expressão. Para Igreja, na nova fronteira para o tema é uma avaliação efetiva sobre o alcance desse poderio.

"Ao longo da história, o que a gente aprendeu é que [a necessidade de regulação] é inevitável. O tema da tecnologia, da conectividade, da internet, nós temos que lembrar: parece que isso existe desde sempre, mas são temas novos em termos históricos, são temas jovens. A gente está aprendendo os limites, aprendendo o lado bom e o lado que não é tão bom. E quem deve estabelecer, demarcar essas linhas são os legisladores e a Justiça. O curioso é que nos últimos anos nós confiamos no bom senso das empresas de tecnologia e agora é exatamente isso que está em xeque", dispara.

Essa preocupação é compartilhada pelo professor do Mackenzie. "Existe uma série de iniciativas por aí que podem ajudar. Na Europa está funcionando muito bem a lei de proteção de dados. Nós tivemos implantada aqui [no Brasil] a LGPD recentemente. Na Europa, isso já está se consolidando e já está um bocado mais difícil para essas empresas fazerem o que elas quiserem conosco", avalia.

Mesmo com passos nesse sentido, Breternitz afirma que a opinião pública precisa estar alerta para o excesso de poder que essas empresas venham a ter, de forma que isso gere nos governos uma conscientização para construir leis que protejam a sociedade.

"A gente tem uma tendência a pensar que empresas desse porte vão ter um comportamento ético. Agora, a gente não pode esquecer algumas coisas. Por exemplo, na 2ª Guerra Mundial a IBM e a Kodak cooperaram com os nazistas até que os EUA entrassem na guerra. Business são business", resume.

3. A história que se repete

Apesar de o tema das Big Techs ser relativamente novo, o especialista Arthur Igreja reforça que movimentos como esse já foram tratados pela sociedade em diversos momentos anteriores.

"O mesmo aconteceu no mercado de telefonia, aconteceu com a Microsoft nos anos 1990, com os computadores que só vinham com o Windows. Na verdade isso é cíclico. Quando vem uma tecnologia nova, ela avança, avança, até que encontrar esses paradoxos e o mundo para para debater os limites. Acho que é muito natural o que a gente está passando", conclui.

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