O bloqueio do aplicativo WhatsApp durou menos do que o previsto nesta quinta-feira (17), mas o caso alertou para a necessidade de regulamentação do Marco Civil da Internet. A lei serviu de base para o pedido de suspensão do app, mas traz, ao mesmo tempo, artigos que impediriam a ação das operadoras de telefonia contra o serviço.
O bloqueio por 48 horas, a partir da zero hora de quinta, foi determinado pela juíza Sandra Regina Nostre Marques, da 1.ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo. O aplicativo não teria atendido a duas ordens judiciais envolvendo a quebra de sigilo de dados para uma investigação policial, em julho e agosto.
Opinião: Bloqueio fere direito do usuário
Leia o artigo de Mariana Cunha e Melo, mestre em Direito pela New York Uninversity, advogada no BFBM & Associados, professora no UniCEUB.
Leia a matéria completaDoze horas depois do início da proibição, o desembargador Xavier de Souza, da 11.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, suspendeu a medida. O principal argumento foi o mesmo dos especialistas: em vez de atingir diretamente a empresa, o bloqueio afetou milhões de usuários, sendo abusivo.
Para o analista de segurança da informação e advogado especializado em Direito Tecnológico e das Telecomunicações José Antonio Milagre , a redação do Marco Civil é “nebulosa” para episódios como o do WhatsApp – até porque a proibição baseada no marco legal acabou não sendo dirigida ao aplicativo, mas sim às operadoras, que não têm relação com o processo judicial.
A participação das teles, neste caso, põe em xeque duas outras normas do Marco Civil: a neutralidade da internet (que prevê que não deve haver distinção no acesso a conteúdos, por parte das empresas que fornecem a conexão) e a proibição dos provedores de acesso registrarem e conhecerem previamente o que os clientes acessam na rede (condição que precisa ser descumprida para as empresas bloquearem um app específico).
Além disso, ao mesmo tempo em que prevê a possibilidade de suspensão temporária de um serviço, o Marco Civil não deixa claro se tal medida poderia ser solicitada pelo Judiciário ou só pelo órgão regulatório (como a Anatel). “Multar já seria uma medida bastante enérgica. Esse excesso de força foi preocupante porque abre um precedente para atingir outros serviços de internet e aplicativos”, destaca o advogado especialista em Direito Eletrônico Hélio Ferreira Moraes.
A decisão que liberou o WhatsApp foi resultado de um recurso da Oi. A empresa afirmou que decidiu recorrer para “preservar os interesses de seus consumidores”.
Suspensão do acesso ao app é ilegal, avalia Proteste
O Sinditelebrasil (sindicato que representa as empresas de telefonia) afirmou ainda na quarta-feira (16) à noite que seguiria a decisão da 1ª Vara Criminal de São Bernardo do Campo, apesar das empresas não serem autoras nem fazerem parte da ação que resultou na ordem judicial.
A única empresa contestar oficialmente a decisão foi a Oi – o habeas corpus impetrado pela operadora acabou resultando na decisão do desembargador que liberou o acesso ao WhatsApp. A empresa afirmou que decidiu recorrer contra a decisão para “preservar os interesses de seus consumidores”.
Para a associação de consumidores Proteste, a decisão judicial que bloqueou o aplicativo desobedeceu o ponto do Marco Civil que fala que os provedores de conexão não podem responder por atos praticados por terceiros. “Não questionamos o que motivou a decisão da Justiça, mas, do ponto de vista do consumidor, é uma ação ilegal, que não penaliza simplesmente a empresa, mas pune milhões de usuários”, afirma a supervisora institucional da Proteste, Sonia Amaro.
Para a entidade, em vez de afetar os usuários do aplicativo, a decisão judicial poderia responsabilizar os representantes do Facebook, empresa dona do WhatsApp e que mantém um escritório no Brasil.
Notícia ganha destaque na imprensa internacional e gera reação de Zuckerberg
O bloqueio – e posterior liberação – do WhatsApp repercutiu nesta quinta-feira (17) não só entre os usuários do aplicativo, mas também na imprensa internacional. Sites como o TechCrunch e jornais como o New York Times, Financial Times e Wall Street Journal deram destaque ao caso.
Uma das reações mais veementes surgiu do próprio “dono” do WhatsApp. Em postagem no Facebook logo no início da manhã, o fundador da rede social, Mark Zuckerberg, se disse “chocado” com a ação da juíza que determinou o bloqueio do app. “Este é um dia triste para o Brasil”, escreveu. Mais tarde, após o anúncio de que o acesso ao WhatsApp havia sido liberado, ele voltou a se pronunciar em seu perfil no Facebook. “Suas vozes foram ouvidas e o bloqueio foi suspenso. Obrigado à nossa comunidade pela ajuda para resolver isso”, escreveu Zuckerberg.
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