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Conjuntura

Bom hoje, péssimo no futuro

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Quando a situação econômica aperta, o governo sabe que pode contar com os brasileiros. Os dados do Produto Interno Bruto (PIB), divulgados no fim de agosto, confirmam: não fosse pelo consumo das famílias – uma conta que engloba os gastos das pessoas físicas –, a economia do país não teria crescido.

Segundo o Instituto Bra­­sileiro de Geografia e Esta­tística (IBGE), esse consumo subiu 2,4% no período entre abril e junho e compensou, com sobras, perdas ocorridas em outras áreas. Por trás desse crescimento está um mecanismo de incentivos cujo gatilho foi acionado em maio, e que inclui redução de impostos para setores selecionados (eletrodomésticos, automóveis e material de construção) e redução de encargos para financiamentos. Embora tenha salvado o país de uma possível recessão, o estímulo ao consumo não é unanimidade entre os economistas. Há entre eles o temor de que o uso contínuo desse remédio traga novas ameaças à saúde do paciente Brasil.

Ninguém nega que as medidas eram necessárias, dado o ambiente de crise que se instalou com o calote da dívida da Grécia e a fraqueza geral das economias do hemisfério Norte. A questão está na falta de estímulo à poupança, que é vista como a reserva de recursos que vai financiar o crescimento nos próximos anos. "Os grandes condutores do desenvolvimento devem ser o investimento e a exportação. E não se faz isso sem poupança", resume o professor Lucas Dezordi, coordenador do curso de Economia da Universidade Positivo.

A variável-chave, então é a taxa de poupança (que, simplificando, equivale ao porcentual do PIB que o Brasil produz, mas não gasta). A do Brasil está na casa dos 17% – um terço da taxa da China e pouco mais da metade da registrada no Chile, por exemplo. "Nosso problema de crescimento está relacionado à nossa baixa taxa de poupança que, ao contrário de outros países, não acompanha o crescimento", escreveu o economista Mansueto de Almeida, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em um artigo recente sobre o assunto. Ou seja: o país gera mais riqueza, mas ela é direcionada ao consumo e não ao investimento.

Nos últimos anos, o governo tomou algumas medidas que favorecem a poupança: regulamentou novas formas de investimento, como, por exemplo, os Certificados de Recebíveis Imobiliários; reduziu os limites para aplicação no Tesouro Direto; e emitiu títulos por meio da BNDESPar, braço do banco estatal BNDES para participação em empresas privadas, entre outras medidas.

"Todo formato de título ou aplicação financeira que seja interessante para o investidor é uma forma de estimular a poupança", define Fábio Araújo, professor da PUCPR e sócio do escritório de consultoria Brain Bureau de Inteligência Corporativa. Faltou, entretanto, uma política pública, programada e planejada para incentivar o cidadão a guardar dinheiro. Por outro lado, empresas interessadas em vender investem fortunas em publicidade e, nos últimos tempos, têm contado com o apoio do governo para reduzir os preços. Assim a concorrência pelos reais das famílias brasileiras se torna desigual.

Para Lucas Dezordi, da Universidade Positivo, alguns indicadores demonstram a falta de fôlego de setores da economia nacional, provocada pela ausência de poupança. É o caso da indústria de transformação, que vem perdendo importância no PIB. "É um setor que precisa de investimento para se manter atualizado e competitivo", diz. "E a cada medida que libera o crédito, o governo dá mais um passo na direção de destruir uma estratégia de longo prazo."

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