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O governo federal pretende posicionar o Brasil como produtor mundial de lítio ao retirar limitações impostas desde 1997 ao comércio exterior do minério. Em decreto assinado no mês passado, o presidente Jair Bolsonaro revogou medidas anteriores que por 25 anos mantiveram a obrigatoriedade de autorização prévia da Comissão Nacional de Energia Nuclear para a realização de exportações do material.
Então considerado "de interesse para a energia nuclear" (conforme texto do decreto dos anos 1990), o lítio ganhou novos usos com o passar das décadas e hoje é estratégico para a transição energética, com destaque para sua ampla utilização na fabricação de baterias para carros elétricos.
O desenvolvimento do segmento é acelerado e a perspectiva é de que a dinamização do mercado brasileiro de lítio melhore as condições de competitividade para garantir ao país boa fatia dessa cadeia.
Dados da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) apontam que 2021 foi de recorde nas vendas de carros elétricos, que chegaram a 6,6 milhões de unidades – o dobro do ano anterior. Além do paralelo já consolidado, as vendas globais continuam subindo fortemente em 2022, "com 2 milhões [de veículos elétricos] vendidos no primeiro trimestre, um aumento de 75% em relação ao mesmo período de 2021", frisa a IEA.
O avanço dos elétricos se dá globalmente, ao sabor de incentivos a tecnologias limpas e restrições esperadas para os próximos anos, como o banimento da venda de novos carros a combustão na Europa a partir de 2035.
Ao ganhar mais espaço, a indústria automotiva dos eletrificados puxa também a busca pelos minérios utilizados na fabricação das baterias. Números da consultoria S&P Global indicam que a demanda pelo lítio deve atingir 2 milhões de toneladas até 2030; até 2040 a demanda deve crescer mais de 40 vezes, projeta a IEA, um prato cheio para os produtores.
Para o Ministério de Minas e Energia (MME), o decreto pode viabilizar mais de R$ 15 bilhões em investimentos até 2030, concentrados no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, uma das regiões mais pobres do país. É lá que fica a maior parte das reservas conhecidas no país.
É esperada ainda geração de sete mil empregos diretos apenas na mineração e mais de 84 mil postos de trabalho diretos e indiretos ao longo das cadeias produtivas do lítio. Pelos cálculos da pasta, os pagamentos de salários devem somar R$ 440 milhões por ano e a arrecadação anual de royalties deve passar de R$ 100 milhões, distribuídos, na maior parte, aos municípios produtores.
Para a pasta, o fim das restrições à exportação do lítio brasileiro promove abertura que pode "posicionar o Brasil de forma competitiva na cadeia global e atrair investimentos para pesquisa e produção mineral", além de fazer avançar nossa capacidade produtiva em processamento e produção de componentes e baterias.
"A medida também representa um passo fundamental para ampliar o olhar da indústria automotiva e atrair investimentos para a produção de veículos elétricos no Brasil", diz comunicado do MME.
Qual o tamanho das reservas e a produção de lítio no Brasil
Comparativamente aos "vizinhos" de América Latina, as reservas brasileiras conhecidas – de aproximadamente 500 mil toneladas – são enxutas. O continente concentra a maior parte das reservas mundiais do mineral, com destaque para Bolívia, Argentina e Chile (com 21 milhões, 19,3 milhões e 9,6 milhões de toneladas de lítio, respectivamente).
Devido à exploração contínua do minério, entretanto, os recursos identificados vem crescendo em todo o mundo, o que pode levar a novas descobertas. Em 2021, havia 86 milhões de tonelada de lítio conhecidas globalmente, conforme o Serviço Geológico dos Estados Unidos.
Ainda conforme dados do órgão norte-americano, a produção brasileira em 2019 foi de 2,4 mil toneladas. Em comparação, a Austrália, maior produtor, extraiu 45 mil toneladas no mesmo ano.