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Entrevista

“Brasil é emergente em pior situação”, diz economista que era do FMI

 | Divulgação/FMI
(Foto: Divulgação/FMI)

Kenneth Rogoff, ex-economista-chefe do FMI e um dos mais respeitados economistas da cena global, não vê sinais de que o mundo esteja entrando numa fase recessiva, apesar do nervosismo dos mercados. Para ele, há uma abrupta desaceleração dos mercados emergentes, mas Estados Unidos e Europa seguem em recuperação, e a queda do preço do petróleo é positiva para o crescimento global.

O Brasil, porém, é o emergente em pior situação, junto com a Rússia, para Rogoff. O problema, segundo ele, é que o País tratou a queda das commodities como problema temporário, tentando reacelerar a economia com expansionismo fiscal.

Questionado sobre a onda de pessimismo sobre a economia global, ele respondeu que o que está sendo visto é uma “desaceleração” dos mercados emergentes, não uma ameaça de recessão global. “Os problemas nos emergentes atrapalham todo mundo, mas no momento não é fácil de entender como causariam recessões nos Estados Unidos e na Europa. Os sinais são de que o crescimento na Europa é sólido, as pessoas ainda estão revisando para cima suas estimativas”, disse Rogoff. “O FMI não revisou para baixo o crescimento da Europa e diminuiu muito pouquinho o dos Estados Unidos. O crescimento do emprego é forte, a confiança do consumidor é forte. O preço mais baixo da energia é bom para os países avançados.”

Para Rogoff, os emergentes vivem um “outro problema”, de desaceleração aguda. “Quando se crescia a 6%, e agora se cresce a 3%, não é agradável. A Ásia claramente está sofrendo e a China está no centro disso. Os mercados emergentes que estão em problemas mais graves são, infelizmente, o Brasil e a Rússia”, comentou. “É claro que a causa principal é a queda das commodities, mas no Brasil houve muitos erros de política econômica - no nível microeconômico, mas também o (erro) de tratar a queda das commodities como temporária. O Brasil fez uma grande expansão fiscal para contrabalançar a queda das commodities, que julgou temporária, mas que acabou se revelando permanente.”

Questionado se haveria alguma luz no fim de túnel do Brasil, ele ressaltou que não está tão informado assim sobre o Brasil. “Mas não é o que ouço ainda dos meus amigos brasileiros ou o que leio nos jornais. Ainda não vejo nenhuma estabilização.”

De acordo com ele, a receita para o Brasil sair da atual crise seria desfazer grande parte das políticas dos últimos anos. “Foram distribuídos todos os tipos de subsídios, por toda a parte, a política macroeconômica foi muito expansionista. E há também a lista habitual de reformas estruturais.”

Sobre a mudança no Ministério da Fazenda, ele disse que acompanhou o processo. “Não tenho muita certeza, mas parece sinalizar uma falta de apoio para a restrição fiscal, e é difícil imaginar como o Brasil pode se sair da atual situação sem restrição fiscal.”

Quanto à China, ele afirmou que é muito difícil ter uma desaceleração gradual controlada. “Os chineses gostam de controlar tudo, o mercado acionário, a taxa de câmbio e certamente manipulam números. Eu suponho que a desaceleração é maior que os números divulgados. O setor industrial, que representa metade da economia chinesa, está com crescimento quase nulo”, destacou. “O setor de serviços cresce a uma taxa saudável, mas é só metade da economia. De maneira geral, eles desaceleraram bastante. Eu acho que se eles crescerem 4% ou 5%, já está bom, absolutamente razoável se eles estão fazendo uma transição. Mas o risco é que o governo não ache esse ritmo politicamente sustentável, e comece a fazer erros de política econômica.”

Perguntado se houve erros, Rogoff respondeu que a única coisa que os chineses fizeram completamente errado até agora foi no mercado acionário. “Você não pode tentar manipular as bolsas. Também não se pode manipular a taxa de câmbio sem controle de capital. Mas o comércio internacional chinês é tão grande que os controles de capital se tornaram porosos, pois as empresas chinesas conseguem muito facilmente movimentar dinheiro para dentro e para fora do país.”

Quanto à queda do petróleo, ele disse que o movimento não pode ser ruim para a economia global. “Até o ponto em que a queda é causada pela oferta - o que explica pelo menos metade, talvez três quartos do fenômeno -, é muito difícil contar uma história de por que isso é um desastre para a economia global”, opinou. “Se, de repente, o Brasil descobre que pode facilmente tirar o petróleo offshore, que tem dez vezes mais do que se pensava, isso não é ruim para a economia global. É bom para o Brasil e é ainda melhor para o mundo. Preço baixo de petróleo é bom para a China, para a Índia, para Europa, para o Japão e até talvez para os Estados Unidos”, avaliou.

Sobre uma das teses de que a queda do petróleo está afetando os investimentos no setor de petróleo e gás de xisto, e que isso afeta a economia americana, Rogoff afirmou que este é um setor “dinâmico”, mas ponderou que os EUA são muito grandes. “Eles já desaceleraram o investimento (em xisto) há algum tempo. No pico, chegou a representar 10% do investimento em capital fixo, agora é 5%. Não é um fator suficiente para ter todo este efeito na economia.”

Questionado sobre como se explica a tendência de queda dos mercados mundial, Rogoff respondeu que não poderia explicar destacou que essa era a coisa mais importante a dizer. “Não há dúvida de que o fator principal foi a perda de confiança nos gestores da economia chinesa, e a constatação de que os bancos centrais não podem fazer muito para resgatar os mercados. Mas eu acho que os bancos centrais não fariam, mesmo que pudessem. Eles olham para o mercado acionário com nervosismo, mas se eles não veem problemas nos números de desemprego, PIB e inflação, o Fed vai continuar a subir a taxa básica de juros” disse.

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