O Brasil está andando na contramão das principais economias latino-americanas quando o assunto é política monetária. Países como Chile, Colômbia e México seguem uma tendência de redução nas taxas de juros. O Brasil, em sentido oposto, intensifica o aperto, buscando conter a inflação elevada e alinhar as expectativas de alta nos preços ao centro da meta, que é de 3% ano.
O ciclo de alta dos juros brasileiros é agressivo. Dois componentes relevantes nesse cenário são a economia sobreaquecida e o descontrole nas contas públicas por parte do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A taxa Selic foi elevada em setembro para 10,75% ao ano, e novas altas são esperadas. Para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 5 e 6 de novembro, o mercado financeiro projeta uma chance de 81,5% de elevação de 0,5 ponto percentual, conforme opções negociadas na B3.
No restante das principais economias da América Latina, a XP Investimentos aponta que o cenário de queda nas taxas de juros decorre de três fatores principais:
- atividade econômica crescendo de forma mais moderada;
- inflação em queda gradual; e
- Maior influência do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) sobre as decisões monetárias desses países.
Crescimento mais tímido facilita trabalho em outros países
O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta um crescimento moderado para a América Latina nos próximos anos, refletindo um período de desempenho econômico mais fraco na região. Depois de o PIB regional crescer 2,2% no ano passado, a expectativa é de uma alta de 2,1% em 2024 e de 2,5% em 2025.
Países como México e Colômbia ilustram essa ritmo mais tímido. Para o México, espera-se que o PIB cresça apenas 1,5% neste ano, com uma previsão de 1,3% para 2025. No país, a incerteza econômica e preocupações fiscais sob o governo de Claudia Sheinbaum, empossada em 1.º de outubro, podem inibir investimentos e reduzir o crescimento.
Uma outra preocupação refere-se aos fortes vínculos do México com a economia dos Estados Unidos, seu principal parceiro comercial. Uma desaceleração mais forte da economia americana pode afetar as exportações do país latino e reduzir o crescimento.
Na Colômbia, a previsão de crescimento para 2024 é de 1,6%. E para o próximo ano, 2,5%. A necessidade de ajustes fiscais no país, com cortes significativos de gastos, e as expectativas de arrecadação subestimadas, elevam a preocupação sobre a sustentabilidade das finanças públicas e os investimentos. Recentemente, tensões políticas e greves, como a dos caminhoneiros, agravaram o ambiente de incerteza no governo de Gustavo Petro.
No Chile, o crescimento econômico projeta-se mais acelerado, com previsões de 2,3% para 2024 e 2% para 2025. Estímulos econômicos, aumento do consumo e uma melhora na confiança do consumidor impulsionam essa recuperação, que torna o país atrativo para investidores em setores como mineração, energia renovável e tecnologia.
Redução da inflação reforça a queda dos juros na América Latina
A inflação, em tendência de queda na América Latina, também favorece a redução nas taxas de juros. O processo é desafiador, avalia a XP Investimentos.
A inflação de serviços, que permanece elevada, e as expectativas de inflação próximas ao limite superior das metas dos bancos centrais são os principais desafios.
Segundo avaliação da corretora, a inflação persistentemente acima da meta exigiria a manutenção das taxas de juros em níveis altos por mais tempo. No entanto, a gradual melhora das condições econômicas nos últimos 12 meses permite uma redução gradual no rigor da política monetária.
No México, a inflação de serviços permanece elevada e a desinflação de preços de alimentos perdeu força. A situação dos serviços também preocupa na Colômbia.
No Chile, os preços voláteis voltaram a subir. Mas a expectativa é de que a redução gradual nas taxas de juros continue, impulsionada pela melhora nas condições econômicas dos últimos meses.
Redução de juros nos EUA pode dar mais impulso a decisões na América Latina
Outro fator que pode impulsionar as economias latino-americanas é a possível redução de juros pelo Fed. A próxima reunião está programada para os dias 6 e 7, logo após as eleições presidenciais nos Estados Unidos.
Segundo William Castro, estrategista-chefe da corretora Avenue, os dados mais recentes dos Estados Unidos indicam uma desaceleração gradual da inflação, com manutenção de uma atividade econômica sólida. "A ideia de um cenário recessivo nos Estados Unidos se afasta cada vez mais do horizonte", afirma Castro.
Lucas Faria, analista de economia da Genial Investimentos, destaca que o cenário americano favorece a continuidade do ciclo de afrouxamento monetário, embora em um ritmo mais lento e com reuniões não sequenciais do Fed.
Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike, acrescenta que a continuidade da queda dos juros nos EUA pode ter efeitos positivos sobre economias emergentes, aliviando as pressões.
Com dados de desaceleração econômica e inflação controladas, o Fed tende a reduzir os juros, o que pode atrair mais investimentos para a América Latina e estimular o crescimento. Essa política também pode levar a uma desvalorização do dólar, o que aumenta a competitividade das exportações latino-americanas, mas pode elevar a inflação.
Cenário global reforça tendência de flexibilização monetária
A tendência de queda nos juros não se limita à América Latina. Canadá, Austrália e Nova Zelândia também têm margem para flexibilizar suas políticas monetárias, e a expectativa da XP é de que os bancos centrais desses países reduzam as taxas nas próximas reuniões, acompanhando a tendência global.
Na Europa, o Banco Central Europeu (BCE) já iniciou cortes nas taxas de juros e deve prosseguir, especialmente se os indicadores de inflação continuarem enfraquecidos. No Reino Unido, o Banco da Inglaterra (BoE) também considera novas reduções, mas isso dependerá dos próximos dados econômicos. Até o momento, há espaço para mais cortes.
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