O Brasil pode crescer mais que a China neste ano, algo que não ocorre desde 1980. A possibilidade foi mencionada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, em participação no Flow Podcast na semana passada. “Vai ser a primeira vez em 42 anos que o Brasil vai crescer mais do que a China”, disse.
"É possível que isso ocorra", concorda o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira. "As expectativas para a economia chinesa estão diminuindo, enquanto para a economia brasileira estão com tendência de alta.”
Novas sinalizações para essa possibilidade serão dadas durante a próxima reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI), que acontece ainda neste mês, quando forem divulgadas projeções para o crescimento da economia mundial.
Outras instituições já têm revisado estimativas e aproximado o crescimento esperado para Brasil e China.
O Banco Mundial rebaixou, no início de setembro, sua projeção para o crescimento chinês em 2022 de 5% para 2,8%. E, nesta semana, elevou para 2,5% sua estimativa para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) também espera crescimento de 2,5% para o Brasil, mas é um pouco mais otimista em relação à China, para quem prevê alta de 3,2% no PIB neste ano.
Aqui no Brasil, o ponto médio das expectativas de bancos e corretoras para o PIB nacional em 2022 sobe há 14 semanas e chegou a 2,7% no mais recente relatório Focus, do Banco Central. E a tendência é de alta: se consideradas apenas as projeções feitas nos cinco dias anteriores à pesquisa, a mediana é de 2,75%. Tanto o Ministério da Economia quanto o Banco Central projetam crescimento econômico de 2,7% neste ano.
A situação na China
As expectativas para a economia chinesa vêm caindo devido à forte desaceleração da atividade, decorrendo de regras rígidas de contenção da Covid-19 que limitaram a produção industrial, as vendas domésticas e o comércio internacional. Um dos exemplos mais claros dessa situação foram os lockdowns registrados no primeiro semestre nas regiões de Xangai e Shenzhen (Leste da China), dois dos principais polos econômicos do país.
Economistas do banco francês BNP Paribas apontam que a recuperação na atividade econômica chinesa desde o fim dos lockdowns impostos em Xangai na primavera (do Hemisfério Norte) tem sido muito gradual. Houve um pico em agosto, apoiado pelo investimento público e por medidas tributárias, mas é provável que tenha perdido força em setembro.
“À medida que as exportações começam a sofrer pela demanda mundial mais fraca, a continuidade da estratégia de Covid zero e a grave crise do setor imobiliário seguem pesado muito sobre a confiança, o consumo privado e o investimento. Uma flexibilização da política sanitária e ações mais amplas para apoiar o mercado imobiliário parecem ser as únicas medidas capazes de tirar a economia chinesa de seu atual pessimismo”, cita, em relatório, a economista Christine Peltier.
Segundo o Itaú, a moderação da atividade levou a uma resposta das autoridades chinesas, que vêm reduzindo as taxas referenciais de juros. Uma das mais importantes, a preferencial de um ano está em 3,65%.
“Esperamos expansão mais forte no segundo semestre do que no primeiro semestre, mas o setor imobiliário representa um risco significativo de desapontar as estimativas. O setor não respondeu aos estímulos como nos ciclos anteriores”, citam, em relatório, os economistas do Itaú.
Segundo relatório do Bradesco divulgado no início de setembro, a atividade econômica brasileira mostrou resiliência no terceiro trimestre, apesar da perda de tração: “Além dos próprios indicadores de atividade e de mercado de trabalho, os sinais aparecem nas contas públicas, nas contas externas e nos núcleos de inflação”.
A realidade brasileira
O Brasil vem de um forte crescimento no primeiro semestre. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sinalizaram uma expansão de 2,5% sobre o mesmo período de 2021. E as expectativas de mercado sinalizam para uma expansão de 2,7% no PIB deste ano, de acordo com levantamento feito pelo Banco Central junto a bancos, corretoras e consultorias.
Segundo economistas do Itaú, a atividade econômica seguiu dando sinais de resiliência, com avanço em setembro dos índices de confiança, à exceção da indústria, e forte desempenho do mercado de trabalho em agosto. Mas um indicador próprio do Itaú indica leve recuperação econômica em setembro, após contração no período anterior.
O cenário em 1980
As economias brasileira e chinesa eram completamente diferentes na última vez em que o Brasil cresceu mais que a China, em 1980, quando as taxas de expansão do PIB foram de 9,2% e 7,8%, respectivamente.
O país asiático – então sétima maior economia do mundo, segundo o FMI – começava, sob Deng Xiaoping, a empreender as primeiras reformas que a tornariam a segunda potência econômica do planeta.
O Brasil, 16.ª maior economia global na ocasião, concluía um ciclo de forte crescimento, iniciado em 1967, e começava a dar os primeiros passos em direção a uma década marcada por moratória da dívida externa, hiperinflação e sucessivos planos econômicos para tentar estabilizar os preços, o que só seria concretizado em 1994, com o Plano Real.
Confira no gráfico abaixo, do Banco Mundial, as taxas de variação anual do PIB de Brasil e China desde 1960:
Tendências para 2023
Segundo o Santander, as incertezas para o próximo ano estão se avolumando. Além da alta nos juros nas economias avançadas e emergentes, há o choque energético sobre a Europa, a seca no Hemisfério Norte e os efeitos das sanções econômicas e comerciais para a Rússia. “Há alta probabilidade de uma desaceleração global sincronizada, o que não se vê desde a crise de 2008/09”, diz relatório do banco.
A OCDE projeta que a China será a única grande economia global que terá crescimento maior em 2023 do que em 2022. E indica que o país asiático voltará a crescer mais que o Brasil: a estimativa é de uma expansão de 4,7% no PIB chinês e de 0,8% no brasileiro.
Para o Brasil, as expectativas são de uma forte desaceleração da atividade econômica. O ponto médio (mediana) das projeções no relatório Focus indicam para um crescimento de 0,5% no PIB.
“Haverá um novo mandato presidencial, que se inicia com atividade sem impulsos dinâmicos e pressões fiscais levando o setor público de um superávit primário de 1,0% do PIB para um déficit de 1,4% do PIB, conforme nossas estimativas. Será necessário restabelecer um marco fiscal que ancore expectativas na evolução sustentada da dívida pública”, dizem economistas do Santander.
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