Conjuntura econômica está comprometendo a renda das famílias.| Foto: Bigstock

Encurralado pelo avanço da inflação, o aumento de impostos, o crescimento das dívidas e, em muitos casos, a perda do emprego, o brasileiro teve de quebrar o cofrinho. Em 2014, as famílias já estavam poupando menos que em anos anteriores. Neste ano, passaram a sacar dinheiro de suas aplicações para dar conta de um orçamento que ficou bem mais apertado.

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INFOGRÁFICO: entenda os fatores que têm afetado o desempenho da poupança e de outras aplicações

No primeiro semestre, os brasileiros resgataram quase R$ 23 bilhões de algumas das principais aplicações financeiras voltadas a pessoas físicas, já descontados os depósitos. No mesmo período do ano passado, esses mesmos instrumentos haviam registrado captação líquida – isto é, mais depósitos que retiradas – de aproximadamente R$ 19 bilhões.

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Os números, levantados pela Gazeta do Povo, refletem a captação líquida ou variação de estoque de sete tipos de investimento: caderneta de poupança, CDB, fundos de investimento (para pessoas físicas), Tesouro Direto, LCIs, LCAs e bolsa de valores (aplicações de pessoas físicas). A informações são relativas ao primeiro semestre, à exceção dos fundos e do Tesouro Direto, cujos dados são de janeiro a maio.

Os saques se concentram em duas aplicações, a caderneta de poupança e o CDB, as mais populares entre quem tem conta em banco. Em apenas seis meses, elas perderam pouco mais de R$ 70 bilhões em recursos, bem mais que os R$ 47 bilhões que entraram nas demais aplicações.

Fuga da bolsa

Embora o estoque de aplicações na BM&FBovespa tenha aumentado no primeiro semestre, há menos pessoas físicas investindo na bolsa. No fim de 2013, elas eram 589 mil. Um ano depois, o contingente havia baixado a 564 mil, o menor desde 2009. O movimento de fuga continuou neste ano: quase 6 mil pessoas deixaram o mercado acionário no primeiro semestre.

Poder aquisitivo

“Há três questões aí. Duas são estruturais: a absoluta falta de hábito de poupar do brasileiro e o desconhecimento dos produtos financeiros. A terceira é conjuntural, e tem a ver com a diminuição do poder aquisitivo por causa do aumento da inflação”, diz a especialista em finanças pessoais Ana Paula Mussi Cherobim, diretora do setor de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

“Mesmo para aquela pequena parcela da população que costuma poupar, as despesas gerais aumentaram muito. Telefone, energia, água, colégio dos filhos, estacionamento, combustível, tudo está bem mais caro”, observa.

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Para Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a maior parte da saída de recursos da poupança rumo a opções mais rentáveis – fundos, Tesouro Direto, letras de crédito e outras – ocorreu principalmente no ano passado.

“Essa sangria de quase R$ 40 bilhões da caderneta em 2015 tem mais a ver com a conjuntura econômica. Inflação alta, juros altos, impostos sendo elevados, tudo isso está comprometendo a renda das famílias”, diz. “Sobra menos para poupar, e em muitos casos as famílias precisam resgatar o que estava poupado.”

Ana Paula, da UFPR, vê poucas chances de que um grande volume de recursos tenha ido para ativos não financeiros, como imóveis. “Não acredito que haja essa migração. O mercado imobiliário está em retração”, diz.

CDB e caderneta perdem recursos para letras de crédito

Parte dos recursos que saíram da poupança e do CDB migraram para investimentos que ficaram mais rentáveis com o ciclo de alta da taxa básica de juros. Entre as opções que caíram no gosto dos investidores estão as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e do Agronegócio (LCAs), que, assim como a caderneta, são isentas de Imposto de Renda. Juntas, as duas letras de crédito captaram quase R$ 37 bilhões de janeiro a junho, mais de R$ 10 bilhões acima do resultado do primeiro semestre de 2014.

“Até pouco tempo atrás, poucos instrumentos praticamente monopolizavam os investimentos. Agora assistimos a uma saudável busca por diversificação”, diz Ricardo Magalhães, “expert” em relações e projetos estratégicos da Cetip, empresa que oferece serviços como registro e liquidação de ativos financeiros.

Magalhães comenta que LCIs e LCAs são interessantes tanto para os bancos quanto para os investidores. “A remuneração das letras em geral é inferior à do CDB, o que é bom para o banco. Mas, como elas são livres de Imposto de Renda, em termos líquidos o investidor ganha mais que com o CDB.”

Crise

Nem LCIs e LCAs estão imunes à crise, no entanto. Criados pelo governo para ampliar os recursos para financiamentos, esses títulos são garantidos por operações de crédito. Como a recessão e a alta dos juros diminuem o apetite por empréstimos, ficou mais difícil para o investidor encontrar essas letras nas “prateleiras” dos bancos.

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