Aborto
Principal debate do segundo turno começou na internet
Se os candidatos usaram mal as redes sociais, a discussão sobre o aborto, que vem pautando boa parte do segundo turno, pode ser considerada um "case" de sucesso. A campanha de Dilma Rousseff (PT) alega que o assunto foi "plantado" na internet pela candidatura de José Serra (PSDB), mas na verdade ele surgiu justamente nas redes sociais. O tema já vinha sendo discutido entre internautas pelo menos desde as eleições de 2006, mas fenômenos como o vídeo do pastor curitibano Paschoal Piragine Jr. (com milhões de acessos no YouTube) aumentaram tanto a adesão da população que os candidatos não tiveram como se esquivar do debate.
"Na questão do aborto, as redes tiveram papel fundamental. O assunto surgiu de modo espontâneo e funcionou como rastilho de pólvora. Essa é a finalidade das tecnologias, divulgar pontos de vista e fazer com que o maior número de pessoas participe da discussão", avalia Lenise Garcia, professora da Universidade de Brasília e presidente do movimento Brasil Sem Aborto. "A popularização da internet e a massificação das redes sociais são os responsáveis por disseminar o assunto. Os políticos não tinham ideia da força das novas tecnologias", afirma o blogueiro pernambucano Jorge Ferraz.
A blogueira Juliana Fragetti foi uma das primeiras pessoas a levar o tema aos candidatos, ao fazer uma pergunta sobre aborto em uma sabatina on-line com Dilma. "O tema não teria ganho essa força sem as novas tecnologias. As redes sociais permitiram que o assunto ultrapassasse a simples lista de contatos e ganhasse dimensões nacionais", destaca. (CGF)
Rádio e tevê exigiram aprendizado semelhante
A necessidade de conhecer melhor as redes sociais e aprofundar seu uso são etapas que também fizeram parte do crescimento do uso do rádio e da televisão em campanhas. O primeiro uso eleitoral do rádio, ainda que tímido, ocorreu em 1929, nas campanhas de Júlio Prestes e Getúlio Vargas. Até 1945, o uso ajudou a firmar o Estado Novo. O auge do rádio em campanhas ocorreu em 1955, na campanha de Juscelino Kubitschek. Neste mesmo ano, o Brasil tinha 477 emissoras e meio milhão de receptores de rádio, contra apenas 11 mil aparelhos de televisão.
A primeira vez que a televisão foi utilizada para propaganda eleitoral foi em 1960, na campanha presidencial de Jânio Quadros. Em 1974 ocorreu o primeiro uso pleno da televisão em campanhas, quando o PMDB mostrou as mazelas do país e sagrou-se vencedor na maioria dos estados, elegendo governadores e senadores. Dois anos mais tarde, o regime militar percebeu a força da televisão e regulamentou seu uso eleitoral com a Lei Falcão, que permitia apenas uma foto e um currículo lido por um locutor. Em 1989, as campanhas de Collor e Lula retomaram o uso pleno da televisão e, três anos depois, os efeitos especiais em campanhas eleitorais foram regulamentados. (CGF)
No dia 31 de outubro, quando ocorre o segundo turno para escolha de presidente da República (e de governador em alguns estados), chega ao fim o primeiro processo eleitoral no Brasil com uso pleno das mídias sociais. Milhares de candidatos puderam usar e abusar de Twitter, Orkut, YouTube, MySpace e Facebook, ferramentas que encantam e seduzem os brasileiros. Apesar da grande expectativa, o aproveitamento desse tipo de mídia no relacionamento candidato/eleitor não atingiu o resultado nem o público esperado, opinião unânime entre os especialistas em marketing político consultados pela Gazeta do Povo.
"Desde o começo, todos sabiam que essa eleição seria um grande laboratório para o uso das mídias sociais. O problema é que muitos candidatos, por desconhecimento, não souberam utilizar os veículos ou os usaram de forma equivocada", destaca Carlos Manhanelli, presidente da Associação Brasileira dos Consultores Políticos e professor de comunicação política e marketing eleitoral na Universidade de Salamanca, na Espanha.
Interação
Antes do início das campanhas eleitorais existia a expectativa de que a troca de informação por meio das novas tecnologias pudesse influenciar na decisão do voto. Não foi o que ocorreu muito por culpa dos próprios candidatos e suas equipes, que não souberam utilizar as ferramentas de maneira adequada. "As redes sociais não foram bem utilizadas pelas candidatos que não estavam prontos. Eles não interagiram com os eleitores, sanando suas dúvidas. Em vez disso, usaram as redes como canal de propaganda estática", analisa o gerente de contas da Arca Estúdio de Criação e palestrante de marketing político Elizeu Alves. A opinião é compartilhada pelo consultor de marketing e comunicação Evandro Barreto. "Como instrumento, as redes sociais não foram eficientes; serviram mais como arma tática do que estratégica. Faltou maturidade", disse.
A crítica dos especialistas reside justamente no modelo utilizado, em que as tecnologias foram apenas canais para fazer propaganda das propostas, deixando de lado a possibilidade de debate. A interação, segundo Alves, ocorreu apenas pelo lado dos eleitores. "O usuário está muito mais preparado que o candidato. Se uma pessoa segue um político no Twitter, é porque ela tem interesse em conhecer suas propostas. Quando ela fizer uma pergunta, é fundamental ter uma resposta, coisa que não ocorreu na maioria das vezes", afirma.
Na avaliação dos especialistas, o uso das redes sociais na eleição brasileira passou longe do "efeito Obama", quando a internet foi utilizada de forma decisiva para eleger o presidente americano. Para chegar a esse ponto no Brasil é preciso um período de maturação e o cumprimento de algumas etapas. "Essa eleição serviu para conhecer o uso das novas tecnologias. Os candidatos precisam se aprofundar. Eles têm dois anos até as próximas eleições para fazer um balanço, identificar o que deu certo e adquirir experiências. Precisam se familiarizar com as redes sociais, popularizá-las e despertar o interesse do eleitor", ressalta Manhanelli.
Pontos positivos
Apesar das críticas, algumas ações pontuais no uso das novas tecnologias na eleições tiveram resultado positivo. Na opinião de Manhanelli, os debates na internet são o principal destaque, pois conseguiram atrair a atenção da população e envolver os eleitores. "Os debates na internet funcionaram muito bem. Ocorreu a interação entre candidatos e eleitores de forma a sanar muitas dúvidas. Esse deveria ser o propósito de todas as redes sociais, uma via de mão dupla", afirma.
Para Barreto, a aprovação da Lei da Ficha Limpa também se deve muito à mobilização nas redes sociais. "Era visível que não existia o interesse em aprovar a lei. Com a mobilização pública que ocorreu, juntando mais de 1 milhão de assinaturas, não houve outra saída", conclui.
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Interatividade
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