A operação de capitalização da Petrobras deverá trazer reflexos para o câmbio, na avaliação de analistas financeiros. Com a entrada de mais capital no país, o mercado poderá observar uma pressão para baixo, fazendo com que o real se valorize ainda mais diante do dólar. "Deveremos ver o fortalecimento do real com a chegada de investimentos de fora", diz o professor do Insper (ex-Ibmec), Otto Nogami.
A oferta de ações para capitalização da Petrobras está marcada para o dia 24 deste mês. Com a operação, a empresa pode arrecadar até R$ 130 bilhões no mercado, que vão contribuir para fechar uma conta de R$ 220 bilhões de investimentos estimados nos próximos cinco anos.
A tendência de apreciação do dólar deverá ser acentuada ao longo deste mês, segundo o economista da LCA Consultores Homero Guizzo. "Até o início de outubro, com a entrada de recursos no país, o movimento de valorização será mantido", disse.
No entanto, de acordo com o especialista, essa apreciação da divisa brasileira ocorreria de qualquer forma, ainda que não houvesse a capitalização da Petrobras. "Isso [valorização] aconteceria de qualquer forma. A capitalização apenas acelerou essa apreciação. Há fatores que fazem com que essa valorização exista bem antes da Petrobras anunciar que faria a capitalização. No Brasil, os juros reais são uns dos mais altos entre países emergentes, o retorno sobre o capital é elevado e o preço das exportações sobre as importações nunca esteve tão alto", comentou.
Para os analistas, essa valorização da moeda nacional pode ser prejudicial para o mercado. "Certamente haverá uma pressão para baixo do dólar, o que pode ser prejudicial para o mercado como um todo", disse o professor de Mercado Financeiro e de Economia da Trevisan Escola de Negócios, Alcides Domingues Leite Junior. Segundo o especialista, a volatilidade de dólares é negativa para, por exemplo, empresas que importam ou exportam, afetando, inclusive, seu planejamento.
Já para o consultor Miguel Daoud, da Global Financial Advisor, o impacto da capitalização não deverá ser tão significativo no câmbio, já que, conforme sua avaliação, a valorização do real se dá por especulação. Para Daoud, há a certeza, por parte dos investidores, de que o governo não permitirá a desvalorização do real.
"Boa parte da demanda interna é suprida pelas importações. Se o dólar sobe muito, e o real fica desvalorizado, os produtos ficam mais caros, mais escassos e surge a inflação, acabando com o modelo atual de crescimento do país", afirmou Daoud.
Diante do volume negociado no mercado futuro, a capitalização torna-se pequena, segundo o consultor. "Até hoje, na BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros), já foram negociados mais de US$ 2,2 trilhões no mercado futuro. Sendo assim, a entrada física da capitalização da Petrobras não representa nada perto desse volume", disse.
As perspectivas de impacto pouco significativo no câmbio também são compartilhadas pelo consultor financeiro Mauro Calil. Para o especialista, deverão ser observadas pressões positvas para o real e negativas para o dólar. "Mas não é isso [a capitalização] que vai afetar o fator macroeconômico 'câmbio'. É apenas um reflexo", afirmou.
O que diz o governo
Diante da valorização do real em relação ao dólar, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse na última quinta-feira (9) que o governo adotará as medidas necessárias para conter a alta excessiva da moeda nacional, sem adiantar, no entanto, quais serão essas providências.
"Vamos tomar as medidas necessárias para impedir uma valorização excessiva ou indevida do real", disse o ministro, durante palestra em Pernambuco. Para o ministro, o processo de capitalização da Petrobras, que atrai grande volume de investimento externo, poderá ser o maior responsável pela valorização do real. Na ocasião, ele comentou que o momento é de observação e que, com o fim da operação da Petrobras, o quadro poderá se alterar.
No ano, até dia 10 de setembro, o dólar acumula queda de 1,32%.
De acordo com o Banco Central, no acumulado do ano até 3 de setembro houve maior ingresso de divisas no Brasil do que retirada de recursos. Nesse período, a entrada líquida de dólares (acima das retiradas) somou US$ 3,07 bilhões. No mesmo período do ano passado, o ingresso de recursos foi maior: US$ 6,07 bilhões.
Na Bolsa de Valores
A capitalização da Petrobras terá impactos diferentes no valor dos papeis da empresa, na opinião dos especialistas consultados pelo G1. Enquanto uns acreditam que as ações deverão apresentar valorização, outros afirmam que a incipiência da exploração e do possível retorno do pré-sal poderá torná-las pouco atrativas.
No acumulado em 2010, até o dia 8 de setembro, a desvalorização das ações ordinárias da Petrobras (com direito a voto) era de 22%, enquanto a das preferenciais era de 22,5%, segundo levantamento da Consultoria Economática.
Para Carlos Daniel Coradi, da EFC Engenheiros Financeiros & Consultores, as ações da Petrobras são um bom investimento e acabarão sendo ainda mais com o pré-sal. "Há expectativa de valorização, não como há dois ou três anos, mas haverá valorização". A orientação do consultor é que o investidor respeite a regra de "comprar ações na baixa e vender na alta. "É preciso ter sangue frio", disse.
Mas a falta de previsibilidade para os próximos anos, quanto à eficiência da exploração dos recursos do pré-sal, poderá ser um entrave à valorização dos papeis da Petrobras. "Não se sabe se esse petróleo é fácil de se extrair, qual será o preço nos próximos dez anos. Eu, particularmente, como investidor, não compraria ações", disse Miguel Daoud.
Para Nogami, o papel tende a se valorizar, ainda que admita que o retorno de todos os investimentos no setor não seja garantido.
Para não ser surpreendido com a instabilidade das operações, a saída pode ser a diversificação da carteira do investidor. "Acho que o investidor tem de continuar apostando na Petrobras. No entanto, a orientação é que o investidor não tenha apenas uma empresa em sua carteira, mas várias", disse Milton Calil.
Como será a capitalização
O objetivo da operação da Petrobras é arrecadar dinheiro para financiar seu plano de exploração das reservas de petróleo descobertas na região do pré-sal. No seu plano de negócios de cinco anos, de 2010 a 2014, estão previstos gastos de US$ 224 bilhões.
Três perfis de pequeno investidor poderão participar da operação: quem já comprou no passado ações da estatal com o FGTS, os que já adquiriram ações com dinheiro próprio e quem ainda não é acionista.
O período de reserva da oferta prioritária e da oferta de varejo terá início em 13 de setembro.