O Brasil não é conhecido somente como o país do samba e do futebol, é também campeão nos altos preços dos automóveis em relação a países como Estados Unidos, México, Argentina e outros da União Europeia. Os números comprovam que o país lidera nesse quesito. Uma picape Toyota Hilux 4X2 cabine dupla, que custa R$ 73.766 no Brasil, é vendida por 88.100 pesos para os "hermanos argentinos", o equivalente a R$ 59.979. Mais luxuoso, o importado Ford Edge é ofertado no mercado brasileiro por R$ 149.700, mas no México é vendido por menos da metade do preço: 364.000 pesos, ou seja, R$ 59.282. O contraste seria ainda maior ao considerar Estados Unidos ou Europa.
O motivo para tamanha diferença de preços - e que mais gera discussões entre montadoras e governo - é a carga tributária. No Brasil, Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI), Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviço (ICMS), Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) representam, em média, 30,4% do valor que chega ao consumidor brasileiro.
"Este mesmo valor para outros países é bem menor. Na Espanha, por exemplo, representa 13,8%; na Itália, 16,7% e nos Estados Unidos, 6,1%", afirma a vice-presidente da Booz & Company, Letícia Costa. Já os veículos importados de países sem acordo automotivo com o Brasil sofrem com a cobrança da alíquota de 35% sobre o valor do produto.
Entretanto, os impostos não são os únicos vilões. Também vão de "bagagem" outros fatores que exercem forte pressão sobre os preços dos carros. Um deles é o chamado custo Brasil, que abrange desde o valor da mão-de-obra até o desembaraço alfandegário, no caso da importação de produtos e peças. Nesse aspecto, destacam-se os gastos com logística, já que o país tem grande extensão e depende, basicamente, de rodovias e portos para transporte. As rodovias, em especial, deixam a desejar em qualidade, ao comparar, por exemplo, com a infraestrutura norte-americana.
A escala de produção é outro fator que influencia os preços, já que quanto maior o volume fabricado, menores são os gastos. Ao comparar com Estados Unidos, China, Japão e Alemanha, a produção da indústria automobilística nacional é bem menor, com capacidade para 3,5 milhões de unidades por ano. Para ter idéia, somente em 2007, os Estados Unidos produziram 10,780 milhões de veículos.
De acordo com Letícia Costa, existe ainda a "taxa de conforto". "Em muitos casos, os fabricantes nacionais, nesta e em outras indústrias, preferem pagar um preço ligeiramente maior por insumos e materiais para evitar problemas com suas cadeias de suprimentos, como greves na polícia federal e problemas com portos", acrescenta.
Explosão da demanda
Fora custos e impostos mais elevados que em muitos mercados, há também a ação da famosa lei da oferta e da procura: quando a demanda supera a oferta os preços sobem e vice-versa. E foi a explosão da demanda do mercado brasileiro que mais influenciou os preços dos produtos até setembro de 2008.
A farta oferta de crédito levou muitos consumidores às lojas. Com a produção no limite, autopeças, montadoras e concessionários puderam negociar com margem de lucro maior, já que chegou a faltar carro no mercado. Assim, os preços subiram e quem deixou para comprar o carro entre novembro e dezembro, quando a crise abalou o comportamento do mercado e o governo reduziu a cobrança de IPI, fez um melhor negócio.
Agora, o jogo mudou. Com as vendas de carros em queda, nenhuma montadora se arriscou, até agora, alterar a tabela de preços. "Não existe previsão de aumento de preços, mesmo porque os efeitos de redução de preço de commmodities e a desvalorização cambial ainda não estão claros", observa Letícia Costa.
Defasagem tecnológica
A diferença de preços é ainda mais acentuada pela defasagem tecnológica. Na Europa, a General Motors vende o Corsa de duas gerações mais novas do que o modelo vendido no Brasil, com acessórios de segurança de série como ABS, controle eletrônico de velocidade, controle de tração, controle de estabilidade, correção automática altura faróis, airbag de duas fases para motorista e passageiro, antifurto eletrônico, luzes do freio adaptativa (piscam em caso de freada de emergência), direção elétrica, vidros elétricos etc. E o preço de um Corsa na Itália é de 12.401 euros, equivalente a R$ 38.690.
A versão mais completa do modelos no Brasil é a 1.8 Super Sport, com valor a partir de R$ 43.546. Entre os itens de série do modelo estão direção hidráulica, sistema de alarme anti-furto, luz de neblina acoplada à lanterna traseira , pedais desarmáveis em caso de colisão, ar-condicionado, vidros e travas elétricos.
O mesmo é observado com produtos de outras montadoras. O Fiat Punto com airbags, antifurto eletrônico, ABS, controle de tração, controle de estabilidade etc., sai por 11.901 euros, ou seja, R$ 37.130. No mercado brasileiro, a versão de entrada do Punto 1.4 custa R$ 38.368.
Já o Ford Fiesta, uma geração mais novo, custa 11.151 euros, o equivalente a R$ 34.790 e vem com ABS, airbags dianteiros, laterais e para as pernas do motorista, antifurto eletrônico, direção elétrica, dispositivo para prevenir incêndio, entre outros itens. A versão mais completa do Fiesta no Brasil - com motor 1.6, direção hidráulica, airbag, freios ABS, entre outros itens - sai por R$ 45.685.
"O problema na verdade é que o crescimento do mercado interno e outros fatores, como a volatilidade do câmbio e os aspectos 'normativos e políticos', acabaram afastando de novo o Brasil dos mercados do exterior", explica o consultor de mercado e sócio da Creating Value Consultoria, Corrado Capellano.
"Hoje em dia são pouquíssimas as plataformas globais que produzimos. Os nossos produtos não são mais os que eram em 2001 ou 2002, quando podíamos exportar para Europa ou Estados Unidos e competíamos com as fábricas do Leste Europeu e do México", ressalta Capellano.
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