Desaceleração
Mercado deve esboçar reação em 2015, afirmam especialistas
A perda de mercado não é exclusividade dos modelos de entrada. A venda total de automóveis no Brasil ao longo dos últimos 12 meses encolheu 13,9%. Especialistas de mercado e fabricantes, no entanto, acreditam que 2015 deve apresentar uma reação para o mercado de um modo geral.
Para o economista especialista em indústria automotiva da USP, Rafael Venturelli, 2014 tem sido um ano atípico. "Não vamos voltar aos patamares de crescimento de anos atrás, mas a falta de confiança de 2014 e a falta de crédito esfriaram o mercado. A expectativa é de recuperação, ao menos parcial, para o ano que vem", explica.
Na mesma linha, René Martinez, sócio para indústria automobilística da EY, afirma que em 2015 as indústrias devem recuperar parte do seu potencial produtivo. "Somente com isso, já haveria uma boa recuperação", explica.
"A indústria está investindo muito e o mercado brasileiro é gigante, com um índice de motorização ainda médio. As coisas devem se normalizar no futuro, a médio prazo", completa Marcelo Cioffi, especialista de indústria automotiva da PwC. Entre 2012 e 2018, as fabricantes de automóveis contam com mais de R$ 75 bilhões de investimentos em parques fabris e linhas de montagem.
Na semana passada, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) também declarou que considera a crise "pontual". Segundo o presidente da entidade, Luiz Moan, em comunicado, "ninguém investe essa montanha de recursos sem saber que o futuro é promissor".
Populares
Mesmo com a mudança de perfil, os carros populares também podem ter uma recuperação de mercado. Segundo o consultor da PwC, o que deve acontecer é uma mudança nas características dos automóveis. "Existe uma multidão de brasileiros sem carro e eles são um enorme mercado potencial de carros populares. Ao mesmo tempo, eles devem apresentar mais inovações para atrair este público", completa.
Opinião
Pé de bode nunca mais
Renyere Trovão, editor do caderno Automóveis, Motos & Cia
No tempo em que apenas quatro grandes marcas de automóveis dominavam o mercado nacional, direção hidráulica, ar-condicionado e trava elétrica eram artigos de luxo. Confortos caros que passavam longe dos ditos "carros populares". Hoje, são itens quase indispensáveis desde os modelos mais acessíveis. Novas marcas ganharam as ruas brasileiras nas últimas décadas, com seus projetos modernos e mais equipados, forçando o mercado vigente a se atualizar.
A disputa pela atenção e pela preferência do cliente começou a ir além do melhor preço, do prazo esticado com juro baixo ou da entrada zero. O maior poder aquisitivo deixou o comprador mais seletivo. Primeiro, ele define o que gosta, depois o que pode comprar. Atributos que antes não tinham vez, como aparatos tecnológicos, motores mais fortes e até o tempo de garantia, agora engrossam a lista de exigência.
Custo-benefício
Isso fez boa parte das montadoras ofertar um produto com a melhor relação custo-benefício. Aos poucos a expressão pé de bode, que identifica o modelo básico, vai caindo em desuso. Dá pra dizer o mesmo do termo "carro popular". O VW Gol zero quilômetro, símbolo durante anos deste segmento, não sai por menos de R$ 33 mil. Definitivamente, não é popular. A obrigatoriedade de airbags e freios ABS desde o início do ano carimbou de vez essa nova percepção de compra.
Os modelos básicos, com motorização 1.0, continuam sustentando o maior volume de vendas de novos no país. Mas eles já veem no retrovisor a aproximação rápida dos hatches e sedãs compactos, que têm algo a mais a oferecer. Porém, para não abrir mão deste filão, onde ainda é possível manter os preços abaixo ou pelo menos na faixa dos R$ 30 mil, a indústria automotiva tratou de lançar o bloco 1.0 com três cilindros, mais econômico e forte que a opção com quatro cilindros, além de ser um projeto em sintonia com a modernidade vista na Europa e nos Estados Unidos.
Aquele típico carro popular, com motor 1.0, sem qualquer item adicional e que sai de fábrica "pelado", está cada vez mais impopular. No final dos anos 1990, eles representavam mais da metade das vendas de automóveis novos no Brasil, mas nos últimos anos a adesão do público consumidor a estes carros de entrada vem caindo. Hoje, a categoria sequer lidera as vendas.
INFOGRÁFICO: Veja a média de preço do carro popular no Brasil
De acordo com dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), os modelos populares representam quase 26% dos carros zero quilômetro vendidos em julho, proporção menor que os modelos hatch pequenos, que chegaram a 27% das vendas totais.
O fenômeno é fruto de um movimento de alguns anos. Com o crescimento expressivo da classe C, o acesso facilitado ao crédito e a chegada de concorrentes importados a preços baixos, o brasileiro passou a ter condições de adquirir modelos de diferentes categorias. "O carro popular nunca foi o sonho de consumo do brasileiro. Era apenas o modelo que ele conseguia pagar", explica o sócio da PwC e líder da consultoria para a indústria automotiva, Marcelo Cioffi.
De acordo com o especialista, os dados revelam um amadurecimento do mercado consumidor brasileiro. "No primeiro momento, o comprador adquire um carro popular, mas na segunda compra ele já parte para um modelo com opcionais ou de maior potência. É natural", completa.
Paralelamente a isso, o preço dos populares deixou de ser muito mais baixo que o valor dos carros mais equipados. A entrada em vigor da lei que obriga que alguns itens passem a ser de série para todos os modelos (como airbag e freios ABS), além do aumento dos custos de produção, fez com que os modelos superbaratos deixassem de existir.
Concorrência
Ao mesmo tempo, a concorrência dos importados, em especial os chineses, freou a evolução de preços de outras categorias. "Os preços ficaram muito parelhos. O comprador prefere um financiamento a R$ 300 de um carro mais elaborado ao invés de pagar R$ 250 por mês em um carro popular", explica o sócio para a indústria automobilística da EY, René Martinez.
Com isso a indústria também reposicionou alguns de seus modelos. O Ford Ka, por exemplo, já foi sinônimo de carro popular e barato, mas a partir do modelo 2015, o seu preço de partida é R$ 35 mil. O consumidor também não terá mais opção de comprar um carro sem a maioria dos itens opcionais: direção elétrica, ar-condicionado, vidros dianteiros e travas elétricas passam a ser de série.
O Gol, outro modelo que já foi referência para a categoria, também muda de cara. Com a chegada do Up!, o modelo parte para um perfil mais parecido com o Golf. "As indústrias têm que acompanhar o mercado e se aproveitam de marcas consagradas para se reposicionar e conquistar novos mercados", explica o economista especialista em indústria automotiva da USP, Rafael Venturelli.
"Carro mil" perde na comparação com seminovo
A desaceleração da indústria automotiva acometeu especialmente os veículos novos e impulsionou a venda de carros usados. Nesta conta, os modelos populares são os mais impactados. Com valores muito próximos e vantagens bastante distintas, o consumidor tem procurado os seminovos quando compara as opções de entrada.
Exemplo disso é que o segmento ainda é líder nas vendas de usados. Em junho, os cinco carros mais vendidos, por exemplo, tinham motor 1.0. No trimestre, as vendas fecharam em alta, diante da queda do restante do mercado.
A avaliação do presidente da Federação Nacional das Associações dos Revendedores de Veículos Automotores (Fenauto), Ilídio dos Santos, é de que os carros zero estão muito caros, em especial os mais simples. "Depois de uma pesquisa breve, o comprador desiste do carro zero quilômetro e escolhe um seminovo, que conta com garantia da loja e, as vezes, da fábrica também", afirma.
O aumento gradativo do IPI também será fundamental para os revendedores recuperarem o mercado perdido em 2013 ano em que o setor enfrentou maiores dificuldades.
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