A alta nos preços da gasolina e do diesel no mercado interno trouxe um respiro à indústria do etanol, mas a crise do setor está longe de terminar. Apesar do consumo recorde do biocombustível em 2015 – 17 bilhões de litros –, o setor amarga os efeitos da falta de planejamento e de cinco anos de intervenção do governo nos preços da gasolina. A queda das cotações do petróleo também voltou a assombrar a indústria sucroenergética. Resultado: em pouco mais de uma década, o setor de etanol foi do céu ao inferno. Agora, tenta sair do buraco.

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A promessa de tornar o Brasil líder na produção mundial de energia limpa, tendo o etanol como carro-chefe, levou a um ciclo de investimentos no setor entre 2003 e 2008, impulsionado, no mercado interno, pela introdução dos carros flex. Mas o auge do etanol não resistiu à crise mundial, e a promessa não se concretizou. Para piorar, o governo passou a segurar os reajustes da gasolina a partir de 2010 para controlar o avanço da inflação, minando a competitividade do etanol e levando o setor a maior crise dos últimos 30 anos, na avaliação de analistas.

Com alto custo de produção e preço baixo na bomba, as dívidas se acumularam e enfraqueceram o caixa das empresas. Descapitalizadas, dezenas de usinas fecharam ou pediram recuperação judicial nos últimos anos. De acordo com balando da RPA Consultoria, das 355 usinas em operação no país, 85 estão em recuperação, sendo que 11 delas decretaram falência. No Paraná, das 30 usinas, cinco fecharam as portas desde 2006.

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Para voltar a pensar em novos investimentos, o setor precisa pagar as contas, cuja fatia considerável está em dólar. “A questão cambial impacta profundamente os custos de produção e a dívida do setor. A indústria sucroenergética do Paraná, por exemplo, tem cerca de 70% da sua dívida atrelada a questão cambial”, afirma Miguel Rubens Tranin, presidente da Associação de Produtores de Bioenergia do Paraná (Alcopar). Até o final do ano passado, os custos de produção giravam ao redor de R$ 1,40 por litro. Este ano, devem saltar para R$ 1,60, R$ 1,70 em função da variação do câmbio.

Respiro insuficiente

O nível de preço que as usinas vêm vendendo tanto o açúcar quanto o etanol melhorou. Além disso, o aumento da gasolina, com a reintrodução da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide); a elevação do etanol anidro na gasolina para 27,5%; e o diferencial de ICMS cobrado entre a gasolina e o etanol em alguns estados como Minas Gerais, por exemplo, deram novo fôlego ao combustível verde, mas a situação de boa parte das usinas ainda é muito crítica. O setor deve levar pelo menos de dois a três anos para voltar a investir, avalia o analista de Mercado de Açúcar e Etanol da INTL FCStone, João Paulo Botelho. “O grande problema hoje é o nível de endividamento do setor”, destaca.

A solução, para Tranin, passa pela sensibilidade do governo aos problemas do setor. “É preciso que o governo disponibilize recursos e promova a rolagem da dívida. Não se trata do não pagamento, mas de uma carência maior para poder pagar mais adiante, com uma condição financeira melhor”, afirma. Tranin reconhece, entretanto, que este não é exatamente o melhor momento para contar com a ajuda do governo. “O pior dos ambientes é a incerteza, para qualquer setor”, diz.

Embora a agenda ambiental jogue a favor, o horizonte para o biocombustível ainda é bastante incerto. No médio e longo prazo, o avanço dos carros elétricos com preços baixos acrescenta mais uma preocupação à lista de desafios do setor. “Ainda existe a possibilidade de o etanol vir a representar uma fatia maior na matriz energética brasileira, considerando a previsão de aumento do consumo energético e o gap de demanda não suprida pelos combustíveis fósseis. Mas aquele otimismo de uma década atrás definitivamente não existe mais”, afirma Botelho.