Termelétricas geram menos que o esperado
O fato de os lagos estarem quase secos e as termelétricas operando exaustivamente é uma ameaça importante do ponto de vista técnico. No cenário atual, embora sigam funcionando, várias hidrelétricas já não dispõem de queda dágua suficiente para atingir a potência máxima, que é crucial em momentos de pico de consumo.
As termelétricas, consideradas o "backup" do sistema, também preocupam. Elas foram projetadas para funcionar esporadicamente, mas têm operado perto da capacidade máxima há quase dois anos. Paradas para manutenção têm sido deixadas de lado em algumas centrais, o que aumenta o risco de quebras.
Sinais de problemas não faltam. Na última segunda-feira, o ONS informou que as termelétricas ligadas ao Sistema Interligado Nacional (SIN) geraram 15.547 MW médios, 6% abaixo do programado para o dia. De 87 usinas, 29 produziram menos. Entre elas, 12 frustraram expectativas por "menor rendimento das unidades geradoras", 11 por "indisponibilidade" de alguma turbina, duas "para evitar desligamentos forçados de unidades geradoras" e uma por vazamento em uma válvula.
Além disso, várias usinas estão parcial ou totalmente indisponíveis. Segundo o ONS, a capacidade instalada das termelétricas ligadas ao SIN é de 22.112 MW, mas 4.719 MW (21%) não têm como ser acionados por causa de manutenção ou "restrições operativas".
"Mutirão"
Para o economista Adilson de Oliveira, da UFRJ, como o governo não pretende estimular a redução voluntária do consumo oferecendo descontos, por exemplo , terá de fazer uma espécie de mutirão para colocar em funcionamento ao menos parte desse volume indisponível. "A situação só vai melhorar se chover para valer. Dependemos de algo que não controlamos. É como se tivéssemos recuado para o século 17."
Sul maravilha
Tem chovido bem no Sul do país e assim deve continuar. O ONS considera que em outubro vai chover 88% mais que a média histórica da região. Com isso, os reservatórios de hidrelétricas, que na segunda-feira ocupavam quase 88,4% da capacidade, devem chegar a 97,1% até o fim do mês, segundo os modelos do ONS. O problema é que a região detém apenas 7% da capacidade nacional de armazenamento.
O setor elétrico e os consumidores devem se preparar para fortes emoções no próximo verão. Não será fácil garantir o abastecimento durante os picos de consumo em meio a um cenário de reservatórios esvaziados e termelétricas funcionando no limite.
INFOGRÁFICO: Veja a situação dos reservatórios de água no Sudeste
Alguns analistas vislumbram a possibilidade de "miniapagões" em regiões localizadas caso não chova bastante nos próximos meses e os termômetros alcancem temperaturas tão altas quanto às do início deste ano. Na tarde de 5 de fevereiro, por exemplo, a demanda nacional atingiu o recorde de 85,7 mil megawatts (MW), cerca de 20% acima do consumo máximo observado nos últimos dias um consumo que só tem sido atendido a muito custo, para os equipamentos das centrais elétricas e para o bolso do consumidor.
Como a energia térmica é muito cara, a despesa para assegurar o suprimento tende a continuar elevada, aumentando as chances de escalada nas tarifas não só em 2015, mas também em 2016 ainda mais porque, sem o calendário eleitoral, os governantes ficam mais à vontade para liberar aumentos.
"Temos problemas energéticos e financeiros. Com os reservatórios tão baixos, cresce o risco de o sistema não conseguir atender à demanda. E, nos próximos anos, o consumidor terá de pagar não só o acionamento das térmicas, mas também os aportes feitos pelo Tesouro e os empréstimos do mercado financeiro às distribuidoras", diz Erik Eduardo Rego, diretor da consultoria Excelência Energética.
Lagos minguando
Os reservatórios das hidrelétricas do maior subsistema do país o Sudeste/Centro-Oeste, onde está 70% da capacidade de armazenamento do país estão no menor patamar dos últimos 13 anos e não há indícios de grandes melhoras antes da estação mais quente. Segundo o meteorologista Alexandre Nascimento, do Climatempo, esta primavera deve ter chuvas "um pouco acima da média" em parte das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Ou seja, não são esperados volumes torrenciais, capazes de elevar os lagos a níveis confortáveis.
O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) prevê que em outubro deve chover 23% menos que a média histórica no Sudeste/Centro-Oeste, reduzindo os reservatórios para 21% da capacidade máxima até o fim do mês na segunda-feira passada, eles estavam em 24,6%. Para novembro, a previsão é de nova queda, para 19,8%.
"Se não forem tomadas medidas imediatas para a reversão dessa tendência, a começar por incentivos à redução do consumo, chegaremos ao verão em níveis preocupantes. E não será possível atender a picos de consumo similares aos do verão passado", diz Adilson de Oliveira, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Segundo Mário Lima, diretor executivo de consultoria em sustentabilidade da EY, a situação só não é pior por causa do baixo crescimento econômico. De janeiro a agosto, a indústria consumiu 2,8% menos energia que no mesmo período de 2013. "Existe a questão climática, mas no fundo o que está por trás da crise no setor elétrico é a falta de planejamento e investimento", diz.
Estimativa
Conta a ser paga pelos brasileiros até 2018 chega a R$ 50 bilhões
Os brasileiros terão de pagar, nos próximos quatro anos, uma conta que deve chegar a R$ 50 bilhões. Esse é o valor do passivo que, pela estimativa da Excelência Energética, o setor elétrico terá acumulado até o fim deste ano apenas com os aportes que recebeu ou vai receber do Tesouro Nacional, além dos empréstimos tomados no mercado financeiro.
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