A tão invejada classe média da Europa maior que a dos EUA e a do Brasil está encolhendo. Estudos mostram a redução ao longo das últimas décadas. Mas, agora, em meio à maior crise econômica do continente desde o pós-guerra, o ritmo é mais rápido, sobretudo nos países mais afetados, alertam especialistas. Já em 2010, um ano antes de a situação se tornar mais grave, três milhões de gregos (28% da população) estavam à beira da pobreza, segundo a Eurostat, a agência de estatística da União Europeia (UE).
Mario Pezzini, diretor do Centro de Desenvolvimento da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne 30 países industrializados, constata: "A crise está levando os governos a cortes orçamentários drásticos para enfrentar o problema da dívida. Isso leva à redução de proteção social e de serviços, que são instrumentos que permitem a manutenção da classe média".
A classe média europeia, segundo ele, já vinha sendo afetada antes da crise por fenômenos estruturais. Um deles é o deslocamento do centro de gravidade da economia mundial para a Ásia e os países emergentes. Em 2030, nas projeções da OCDE, a Ásia vai abrigar 66% da classe média do mundo em termos de população, e 59% no que se refere a consumo um salto se comparado com 28% e 23% em 2009, respectivamente. "Isso tem consequências sobre a classe média mundial, inclusive europeia", diz Pezzini.
Quanto mais competitivas se tornam as empresas nos países emergentes, explica o economista, mais elas absorvem classes médias nos seus países o que obriga a classe média trabalhadora na Europa a inovar, sob o risco de perder emprego para os rivais. É o que está acontecendo. Má distribuição de impostos e cortes nos serviços sociais por causa das políticas de austeridade também estão contribuindo para a redução da classe média.
Outro fenômeno que explica a redução e antecede a crise é o aumento das desigualdades nos países ricos. Nos 30 países da OCDE, que inclui EUA e Japão, a renda média dos 10% mais ricos passou a ser nove vezes maior que a dos 10% mais pobres. Há 20 anos, a diferença era de sete: "Isso significa que as sociedades estão ficando cada vez mais polarizadas e que o espaço das classes médias está se reduzindo".
A crise é um problema a mais. Análise do Centro de Pesquisa para o Estudo e Observação das Condições de Vida (Crédoc), em Paris, mostra que de 1981 a 2009 as classes médias já vinham diminuindo em relação ao total da população, até nos países escandinavos. Em Luxemburgo, caiu de 61,3% para 56,9%; na Alemanha, de 60,3% para 53%; e na Bélgica, de 64,7% para 55,1%.
Neste período, poucos conseguiram evitar a redução e países hoje no fundo do poço, como Irlanda e Grécia, chegaram a aumentar suas classes médias. Uma situação que mudou com a crise, como constatou na pele Argyros Alexandros. Em 2008, ele tinha duas butiques em Atenas só com roupa importada da Itália. Tinha também duas casas, um casamento e dois carros de classe média alta: um Audi e um Alfa Romeo. Hoje, aos 74 anos, é um novo pobre de Atenas: não tem mais as lojas, os carros ou o casamento. Vive com 500 por mês e enfrenta fila para receber a sopa grátis de uma instituição de caridade. Da boa vida de classe média alta, só restam recordações: "A cada dois anos eu mudava de carro. E ia para a Milão duas vezes por mês. Não contava dinheiro".