O que acontece com as camisas e chuteiras dos jogadores depois que são utilizadas numa partida? A startup carioca Football for a Cause (Futebol por uma causa) oferece uma resposta diferente para essa questão. Por meio de uma parceria com os clubes, a empresa reúne esses materiais e faz leilões virtuais em seu site. Metade do valor arrecadado vai para projetos sociais e educacionais; a outra metade serve para a sobrevivência da empresa.
Normalmente, os materiais esportivos não têm um destino específico depois do uso. Todos os clubes recebem dois conjuntos completos de uniformes para cada jogo, que são entregues para cada um dos jogadores. A partir daí, o atleta pode trocar a camisa com o adversário e aumentar sua coleção particular ou entregá-la para parentes e amigos, o destino mais comum. Nos clubes menores, as camisas são reaproveitadas de uma partida para outra.
Projeto premiado
A iniciativa foi uma das vencedoras do concurso de inovação "Acelera Startup", promovido pela Federação Paulista de Futebol (FPF) e pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) no final do mês de agosto. Mais de 100 startups do mercado brasileiro propuseram soluções em gestão esportiva e engajamento de torcedores. Os prêmios foram programas de consultoria, mentorias e treinamento, além de computadores portáteis. O primeiro parceiro oficial do projeto é o Santos. Vários jogadores como o lateral Jorge, o atacante Marinho e o zagueiro Gustavo Henrique já doaram as suas camisas e calçados. Uma chuteira usada pelo meia uruguaio Carlos Sánchez custa R$ 630; a camisa de treino de Gustavo Henrique sai por R$ 300. Nos leilões, o lance inicial por uma chuteira do goleiro Vanderlei é de R$ 450. A instituição beneficiada é a Casa Vó Benedita, ONG que abriga crianças e adolescentes na cidade de Santos. As crianças que chegam ao local são encaminhadas pelo juiz da Infância e da Juventude. Elas permanecem no abrigo até serem adotadas ou até que retornem ao lar de origem, seguindo determinação judicial. "No nosso caso, o valor vai contribuir com pequena manutenção para corrigir as infiltrações na creche noturna. Essa ajuda chegou em boa hora e será somada com a contribuição de outras pessoas", diz Elisabeth Rovai, diretora da instituição.
O projeto também tem parceiros pontuais. "A gente deve sempre querer ajudar o próximo. Muitas vezes, uma camisa é pouco para nós. Para outras pessoas, é um objeto valioso. Um passo desse pode ajudar muita gente", diz o meia Edgar Junio, emprestado pelo Bahia, parceiro pontual do projeto, ao Yokohama Marinos. Com recursos da iniciativa, o projeto Estante Mágica transformou em livros histórias escritas por 50 alunos de uma escola de adultos no Rio de Janeiro. A instituição Parceiros da Educação, parceira do Football For a Cause, já tinha interesse em desenvolver essa atividade dentro de uma escola, mas não possuía verba. Após uma ação de dois meses, foi realizada uma noite de autógrafos na qual os alunos receberam seus livros. O projeto foi financiado com a venda de três camisas utilizadas durante partidas de futebol e que foram doadas pelo Santos, Bahia e Flamengo.
"É importante a gente ajudar da melhor forma possível. A gente sabe que as camisas são muito valorizadas pelos torcedores. A gente também tenta demonstrar carinho fazendo essa doação", disse o meia Everton Ribeiro, do Flamengo. Com a ajuda do zagueiro Luciano Castán, que ofereceu sua camisa e short utilizados na partida contra o Estrasburgo quando atuava no futebol francês e hoje joga no CSA, foi possível financiar o término da construção de uma escola no interior do Malawi, um dos países mais pobres da África. Esse projeto é desenvolvido pela instituição DAPP (Development Aid from People to People). A ideia da iniciativa da Football for a cause surgiu na Espanha em um lance fortuito de um jogo do Barcelona. O empresário André Georges estava na arquibancada e prestou atenção quando o meia Andrés Iniesta, um dos maiores jogadores da história do clube catalão, bebeu água e jogou a garrafa ao lado do gramado. Imediatamente, dezenas de torcedores se aproximaram da grade e começaram a oferecer notas de 50 e 100 euros para que o policial recolhesse a garrafinha para eles. "Eles estavam oferecendo 50 ou 100 numa garrafa de plástico usada, sem água. Comecei a pensar quanto as pessoas pagariam pelos materiais usados", afirmou André Georges, um dos sócios da empresa. "Sempre tive muitas oportunidades na minha vida e quis retribuir essas oportunidades para outras pessoas por meio da educação", diz o empresário.