O Brasil vive um momento feliz com o retumbante sucesso (não sei porque "bombando" soa muito melhor) na produção de combustíveis renováveis, o etanol e o biodiesel. Há quase um século, alguns românticos e teimosos brasileiros vêm aplicando suas inteligências e seus cabedais na esperança que o álcool acabaria um dia sendo o combustível líquido renovável e menos poluente que substituiria o petróleo. Esta saga precisa um dia ser contada. Ela mostrará como o espírito "animal" e o nacionalismo daqueles empresários foram sistematicamente frustrados pelas hesitantes políticas governamentais.
Hoje a situação é outra. Assistimos, finalmente, à realização de sonho da auto-suficiência na produção de petróleo, uma mudança estrutural definitiva na nossa dependência externa. Agora, dois novos fatores se impõem: 1.º) a enorme e justificada preocupação mundial com as mudanças climáticas produzidas pela emissão de CO2 pela atividade humana e 2.º) a elevação dos preços relativos do petróleo que, esta vez, parece vai ficar conosco.
Um bom combustível renovável para o setor de transportes tem que possuir boa combustão, não absorver água e ser passível de eficiente distribuição e estocagem. É razoavelmente seguro que a biomassa será a origem desse combustível no futuro mas há, ainda, muita dúvida sobre qual será a matéria-prima mais adequada, o método de produção mais eficiente e se a conversão será produzida por processo biológico como o etanol ou termoquímico como o biodiesel.
Certamente o Brasil está no "estado da arte" na produção do etanol, mas este tem menor densidade energética, maior volatilidade e não é hidrófobo como deve ser o substituto renovável do petróleo. De qualquer forma, uma coisa é certa: temos enormes e boas perspectivas pela frente, mas estamos metidos numa corrida tecnológica que vai exigir recursos e empenho, não só do setor privado, mas principalmente do governo. É preciso multiplicar o esforço no financiamento da pesquisa privada e no suporte à Embrapa e ao Instituto Militar de Engenharia (IME), que há muitos anos dedicam-se a desenvolver a produção de combustível através da biomassa.
Há uma revolução na pesquisa em todos os países. Agora mesmo o US Department of Energy doou a três centros de pesquisa 500 milhões de dólares para um programa de cinco anos (100 milhões de dólares por ano) para resolver o "famoso e difícil problema de extrair etanol da biomassa". Temos que nos cuidar, se quisermos continuar na ponta onde estamos quase por acidente.
Antonio Delfim Netto é economista.
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