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Antônio Delfim Netto

Emprego e câmbio

As discussões sobre a taxa cambial são sempre inconclusivas porque os economistas não dispõem de uma teoria para explicar o seu comportamento. Aliás, dispõem de muitas, que a explicam muito pouco e estão infectadas por visões ideológicas. Destas, não estão isentos nem os que se pensam portadores de uma verdadeira ciência livre de juízos de valor e, muito menos, os que reconhecem essa impossibilidade.

É comum, por exemplo, ouvir-se uma crítica ao excesso de protecionismo dado ao setor automobilístico com o argumento que seria melhor não tê-lo e importar carros mais baratos da Coréia, do Japão ou da China. A idéia subjacente é que os trabalhadores que hoje estão empregados na produção de veículos (nas montadoras e produtoras de autopeças), estariam hoje empregados em outras atividades com maior produtividade relativa e, portanto, com maior nível de renda e bem-estar. O argumento supõe duas hipóteses altamente improváveis: 1.ª) que sempre haverá pleno emprego (quem está produzindo carro estaria plantando café, cana ou algodão) por que a teoria das vantagens comparativas garante que haverá demanda externa e 2.ª) que os parceiros internacionais que aceitam também plenamente a mesma teoria, absorverão o que foi produzido. Logo, como ensinou ao jovem Cândido, o filósofo Pangloss, discípulo de Leibniz, no castelo de Thunder-ten-tronckh (quase um século antes que Ricardo descobrisse a lei das vantagens comparativas), todos viveriam felizes, no melhor dos mundos...

Uma outra confusão terrível trata da relação câmbio/salário. Primeiro, quem aceita a idéia que o sistema econômico é controlado por leis da natureza e que, portanto, o "mercado" deixado a si mesmo produzirá o melhor resultado possível, há de reconhecer que, neste, três "preços" tem de estar em conjunção astral adequada: o nível do salário real, o nível da taxa de câmbio real e o nível da taxa de juros real, que garantem o "pleno emprego" com equilíbrio interno e externo. Logo, só há uma relação câmbio/salário de equilíbrio e que não pode ser manipulada pela política econômica. É claro que, no processo de ajuste, a variação do câmbio (através do seu efeito sobre os preços) tem uma relação inversa com a variação dos salários reais, quando fora do equilíbrio. Mas devia ser ainda mais claro que o uso oportunístico da taxa cambial para reduzir os preços (e aumentar o salário real) é um expediente que tem pouco futuro para manter o "pleno emprego".

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