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Antônio Delfim Netto

Importação de pneus e ciência

Há muitos anos o esporte nacional de alguns economistas, que pretendem ser portadores do verdadeiro conhecimento "científico", é o exercício da crítica à política de substituição de importações. É certo que foram cometidos alguns exageros, principalmente quando o ritmo de expansão das exportações não correspondia à necessária capacidade de importar do país para sustentar suas robustas taxas de crescimento. O resíduo dessa política, entretanto, é o sofisticado sistema produtivo que construímos e que sobreviveu. Ele revela uma verdade pouco visível nos modelos teóricos, mas absolutamente evidente na história econômica mundial: vantagens comparativas podem ser criadas. Aliás, a história econômica é, numa larga medida, um processo de cópia e absorção, por parte de alguns países, de técnicas e processos produtivos criados em outros.

O trágico é que esses mesmos economistas defendem, hoje, a política de "substituição da produção interna pela importação", sem considerar em que condições ela é feita. Não interessa se o nosso câmbio está "super" valorizado pela cavalar taxa de juro real interna! Não interessa se os países exportadores utilizam taxa de câmbio desvalorizada e práticas desonestas de comércio, ilidindo os dispositivos impostos pelo ninho de burocratas bem pagos da OMC para defender o "livre comércio". O problema é que o livre comércio exige, dos dois lados, cavalheiros de alta moralidade. Mas, como disse Burke, "o tempo do velho e nobre cavalheirismo terminou. Hoje os tempos são dos sofistas, economistas e calculadores".

O mais recente exemplo de como essa ingenuidade acadêmica favorece o desemprego nacional é o escandaloso aumento (250%) da importação de pneumáticos chineses. Aqui não cabe discussão. Como no velho caso dos cadeados que ficou famoso (eram produzidos por prisioneiros políticos sem salários), o preço do pneu chega aqui pelo valor da sua matéria-prima (que tem preços internacionais). E o Brasil garante que a China é uma "economia de mercado".

Perdemos emprego não por efeito tecnológico, que exigiria o aperfeiçoamento do nosso parque produtivo (que está no "estado da arte"), mas porque os preços chineses são "políticos" e a nossa taxa de câmbio é "super" valorizada pela oportunística política monetária e a deles "super" desvalorizada. Não será difícil encontrar algum economista que afirmará, pressurosamente, em defesa da sua "ciência", que isso, em compensação, facilitará o aumento do consumo interno de pneus e da exportação de nossos automóveis... Ah! ciência lúgubre.

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