Parece que existem duas realidades no discurso da presidente Dilma Rousseff. Uma é a que indica a necessidade de um ajuste na economia. Um ajuste duro a ponto de se fazer uma microrreforma nos benefícios trabalhistas. A outra é a conquista do crescimento com inclusão social que foi extensamente frisada durante a campanha eleitoral. Uma exclui necessariamente a outra. Fingir não ver a incongruência do discurso é um belo exercício do cinismo.
Durante a semana, o governo lançou uma medida concreta o bastante para se acreditar que a realidade do ajuste é a que vale. A lógica por trás da decisão é a mesma que aparecia nas entrevistas do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, que falava como indicado à Fazenda por Aécio Neves. Ele dizia que era possível fazer um ajuste fiscal rápido baseado em microrreformas e cortes seletivos de gastos. O caminho adotado pela nova equipe econômica foi exatamente esse.
As novas regras para a pensão por morte mostram que o país tem onde cortar. O Brasil tinha uma das regras mais frouxas para a concessão do benefício no mundo, com renda integral vitalícia independentemente do tempo de contribuição e da idade do beneficiado. O abono salarial é outra extravagância do país. Poderia ter sido riscado do mapa, mas o governo preferiu apenas deixar sua concessão mais difícil pode parecer uma opinião radical, mas é duro explicar para o contribuinte por que ele paga impostos para entregar um salário a mais para quem teve emprego formal em um determinado período.
O governo ainda vai ter de dizer de onde vai tirar mais alguns bilhões do gasto público em 2015. Uma vítima óbvia é o investimento, que deve sofrer uma freada, pelo menos no primeiro semestre do ano. A alternativa para mitigar esse corte é acelerar as concessões e fazer com que o investimento privado cresça mais rápido neste ano. Há dezenas de projetos parados em portos, ferrovias, aeroportos e rodovias que precisam ser licitados.
O problema vai ser equilibrar isso com a crise na Petrobras. Ela tende a rever projetos e fazer menos do que o previsto em 2015. Seu peso é grande o suficiente para se tornar um peso a mais para segurar o crescimento econômico neste ano.
Educação
O novo lema do governo, Brasil: Pátria Educadora, poderia ser um bom sinal de que o governo vai priorizar a educação. Só que o discurso ficou vazio (e foi acompanhado pelo endurecimento das regras no Fies, mais um sinal de que os cortes nos gastos são para valer, não importa a área afetada). Se em economia a meta é levar o superávit primário para cima dos 2% do PIB e a inflação para o centro da meta, qual a meta para a educação?
Vejamos o que a presidente disse na campanha: construir creches (proposta requentada porque as obras atrasaram), universalizar a educação infantil (meta estipulada há tempos, é para o ano que vem e dificilmente será cumprida), mais vagas no Ciência Sem Fronteiras, mais vagas no Pronatec (que tem vários vácuos de transparência e qualidade), e valorização dos professores (assim, vago).
É pouco para uma revolução na educação. Quase não se fala em meritocracia, reformulação da formação dos professores, adoção de métodos de ensino etc. Quando o Brasil vai sair das últimas posições do Pisa, o teste internacional sobre educação feito pela OCDE? O governo vai cumprir o Plano Nacional de Educação? Ele tem 20 metas, todas muito difíceis de colocar em prática. Manter a economia nos trilhos era tarefa bem mais fácil.
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