O governo aprovou no ano passado um orçamento que previa uma correção de 5% na tabela do Imposto de Renda. A equipe econômica se faz de desentendida quando o assunto aparece. Esqueça, essa correção foi para o buraco em mais um orçamento feito para não ser cumprido.
O que acontece com a tabela do Imposto de Renda é um exemplo de como as contas continuam a ser feitas de qualquer jeito em Brasília. Seria justo se no ano passado o governo dissesse abertamente que não poderia corrigir a tabela porque precisaria aumentar a carga tributária para pagar suas contas. Mas ele prefere acenar com concessões mesmo quando não pode cumpri-las. Os números continuam sendo torturados.
Algo parecido aconteceu com a desoneração da folha. Seria mais justo se o governo no ano passado, na discussão do orçamento, dissesse que precisaria mudar a regra para 2017. As empresas então fariam suas próprias projeções levando em conta a nova tributação. Ninguém teria de refazer planos e contas no meio do ano.
Mas não é assim que a máquina pública pensa. Ela prefere trabalhar com uma estimativa de receita que precisa ser revista em mais de R$ 50 bilhões no fim do primeiro bimestre. O hábito de se contingenciar o orçamento e procurar trocados para fechar a conta se perpetuou mesmo com uma equipe econômica que diz trabalhar com números realistas.
Não é bem isso. O governo está comprometido com o cumprimento da meta fiscal e para isso está disposto a deixar de corrigir a tabela do IR e subir outros impostos. Do ponto de vista fiscal, a decisão certa é fazer tudo para que a meta seja cumprida. Do ponto de vista do contribuinte, esse processo precisa ser previsível. Os planos fiscais precisam ser de longo prazo, com previsão para o fim de benefícios, ajustes e assim por diante. Não é só o número final do déficit que precisa ser realista.
O fim das desonerações, frise-se, é uma decisão acertada e que uma hora terá de se estender a todos os setores. Há uma distorção cujos efeitos são duvidosos quando o governo escolhe tantos setores para um benefício fiscal desse tamanho. Isso contribui para o aumento do déficit público e faz com que setores mais eficientes subsidiem outros menos eficientes. Seria melhor um subsídio direto para indústrias nascentes, por exemplo, ou para indústrias em transição tecnológica. Com data de validade e medição de resultados caso a caso.
Um exemplo de que é possível reduzir distorções como essa de forma ordenada foi dado pela mesma equipe econômica. O Conselho Monetário Nacional decidiu mudar a forma de cálculo da taxa de longo prazo, usada nos empréstimos do BNDES. Ao longo dos próximos meses ela será recalculada para convergir com a taxa de um título público de cinco anos, que é aproximadamente a menor taxa de captação de dinheiro que existe no mercado.
Com isso, se retira um subsídio implícito na diferença entre as taxas de mercado e a taxa de longo prazo. Dessa forma, o mercado terá tempo para se adaptar, o custo para o BNDES vai cair e o mercado em geral poderá colher taxas menores. Não há como reclamar.