O imóvel que serve de moradia, de lar, de uso da família, é secularmente protegido pelo direito de impenhorabilidade. E o Superior Tribunal de Justiça mais uma vez referendou essa intangibilidade.
Tua casa será uma rocha, virão os ventos, o mar, as tempestades, mas se tiveres fé ela suportará a tudo (ensinamento bíblico). Assim, no direito, desde os mais afastados tempos, antes mesmo dos romanos. A casa é o reino sagrado da família. A casa é intangível, defendida como deve ser o abrigo, o teto, o ambiente contra tudo e contra todos, até mesmo contra intempéries. A casa não pode ser objeto de garantia forçada, de investidas de aventureiros.
Terroristas processuais, sejam civis, trabalhistas ou fazendários, estão em toda parte. Malgrado a situação do chefe da casa em determinado momento da vida se achar em dificuldades perante credores, ainda assim, a propriedade em que se instalou o lar, deve ser considerado fortaleza. E sem nenhuma torpeza ou até por cima de uma, o bem de família é por sua própria definição e natureza jurídica uma coisa física que não pertence apenas ao chefe, à chefe, aos descendentes que nela habitam, mas a todos em conjunto, integrando-a às suas vidas, necessária, importante, tão imprescindível quanto o pão de cada dia, como o ar que se respira para viver e manter-se vivo.
A casa é inexpugnável. Um credor não pode sequer tocar num tijolo da habitação por causa de seu crédito. O sacrário da família é intocável. A proteção físico-jurídica é corolário da proteção individual e social da Constituição, Art. 5.º, XI: a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar...(etc ).
Neste novembro que antecede o auspicioso tempo de Natal, cristãos e não cristãos brasileiros devem se rejubilar com a palavra de reiteração da justiça, proferida pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça STJ que, examinando um recurso, confirmou que o imóvel que serve de residência para a família do proprietário, bem de família que é, não pode ser penhorado por motivo de cobrança de dívida. Julgando o caso, o ministro relator, Massami Uyeda, verberou que o disposto na Lei 8.009/90 é norma de ordem pública e de cunho social que assegura as condições dignas de moradia. E prosseguiu em seu veredictum assinalando que, mesmo valioso, de alto padrão, luxuoso, de considerável metragem tal fato não lhe retira a condição de servir para habitação de família e, pois, sob proteção jurídica estribada na legislação específica. Anteriormente ao diploma citado, houve um projeto de lei que pretendia estabelecer valor para imóvel ser considerado bem de família, projeto esse, rejeitado pelo próprio Legislativo.
Todo o mais que de patrimônio exista, não integra a ilha de isenção, de privacidade, de proteção legal. E neste ponto o mesmo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento segundo o qual a penhora "on-line" de disponibilidades em conta corrente bancária é permitida, para garantir o Fisco em execução de dívida tributária. Note-se que esse bloqueio pode acontecer mesmo antes do devedor ser citado para se defender da investida fazendária.
É preciso cautela ao analisar a decisão do STF assim prolatada e por unanimidade de sua 1.ª Seção com força de decisão de "recursos repetitivos", pois não pode se tratar de abrir um leque para toda e qualquer cobrança judicial de tributos, visto que o caso em julgamento tratou de suposta dívida decorrente de "fraude". Evidente que a fraude é exceção, enquanto regra é a dívida que, ou se presta à discussão de fundamentos de fato e de direito, ou se presta a ser parcelada de conformidade com os diplomas regentes da espécie tributária e da esfera de competência federal, estadual, municipal. Primeiro bloquear para no final inocentar? A Carta Magna inverte destacando que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça ao direito (Art.5º. XXXV), ou seja, o princípio do direito de defesa.
Não tenhamos dúvida que os exageros serão contidos e remediados pelo próprio STJ muito brevemente. O executado não pode deixar de ter seu prazo de cinco dias, para ele próprio oferecer garantias à execução.
GEROLDO AUGUSTO HAUER, sócio-fundador de G.A.Hauer & Advogados Associados