Mudanças foram introduzidas no regime de proteção dos bens do casal pelo Código Civil de 2012. Uma delas é outorga uxória ou marital exigida para fiança, por exemplo. O que isso significa? Necessidade de autorização do cônjuge para atos civis do parceiro que tenham implicações significativas no patrimônio do casal.
Acerca do tema observamos posicionamentos do Superior Tribunal de Justiça diversos. Nos casos de fiança dada a locatário por um dos cônjuges sem a anuência do outro, gera nulidade plena da garantia. Isto é o que retrata a Súmula 332 de 2008: "a fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia." Este entendimento ficou fortalecido com o julgamento do Recurso Especial nº 1165837 em 2011.
A novidade é que o STJ vem discutindo a má-fé na garantia viciada que pode então relativizar a nulidade (deixar de ser aplicada a súmula a rigor). No caso citado o fiador havia se declarado divorciado, quando na verdade era casado. Ao agir de má-fé a simples anulação por inteiro da fiança beneficiaria o garantidor, partindo deste pressuposto, o juiz de primeira instância manteve a execução. Porém no recurso a Quinta Turma do STJ, por maioria, decidiu de forma contrária, aplicando integralmente a súmula, pois entendiam que sem a outorga a fiança prestada pelo cônjuge não tinha eficácia jurídica, mesmo decorrente de ato ilicito.
Entretanto, a Sexta Turma do STJ, já relativizou a nulidade da fiança em caso idêntico ao citado, recurso especial nº 1095441. Neste caso o fiador declarou-se separado, mas vivia em união estável. Sua companheira, na execução da garantia do aluguel, alegou a nulidade da fiança porque não contava sua anuência. O ministro OG Fernandes afirmou que não seria possível aplicar a súmula porque iria beneficiar o fiador que agiu com falta da verdade.
Em qualquer dos casos o que vemos é que o STJ entende que somente o cônjuge que não deu a outorga pode alegar a nulidade da fiança.
Cabe ainda ressaltar outro posicionamento da Superior Corte nos casos em que em instâncias primárias interpretaram que o contrato não trata de garantia, mas de obrigação solidária assumida pelo cônjuge, não há o que se falar de anuência.
O ministro Napoleão Nunes Maia Filho relator de um dos casos, citou Silvio Venosa para esclarecer que consentimento marital não se confunde com fiança conjunta: "O cônjuge pode autorizar a fiança. Preenche-se desse modo a existência legal, mas não há fiança de ambos: um cônjuge afiança e o outro simplesmente autoriza, não se convertendo em fiador". Afirma o doutrinador que: "Os cônjuges podem, por outro lado, afiançar conjuntamente. Assim fazendo, ambos colocam-se como fiadores. Quando apenas um dos cônjuges é fiador, unicamente seus bens dentro do regime respectivo podem ser constrangidos. Desse modo, sendo apenas fiador o marido, com mero assentimento da mulher, os bens reservados desta, por exemplo, bem como os incomunicáveis, não podem ser atingidos pela fiança". Veja-se então que o cônjuge que apenas assina o contrato como testemunha não dá outorga conjugal de fiança, como entendeu a ministra Nancy Andrighi.
Por fim, foi definido pelo STJ através do julgamento do Recurso Especial nº 1163074 qual o regime de bens que dispensa a outorga. Em votação unânime a Terceira Turma entendeu que apenas no regime consensual de separação pode haver dispensa de outorga. No voto do relator ministro Massami Uyeda: "a separação de bens, na medida em que faz de cada consorte o senhor absoluto de destino de seu patrimônio, implica de igual maneira a prévia autorização dada reciprocramente entre os cônjuges, para que cada qual disponha de seus bens como melhor lhes convir."
O ministro, explicou ainda que "o mesmo não ocorre quando o estatuto patrimonial do casamento é o da separação obrigatória de bens. Nestas hipóteses, a ausência de comunicação patrimonial não decorre de vontade dos nubentes, ao revés de imposição legal".
(Colaboração: Carolina Chaves Hauer, G. A. Hauer Advogados Associados - geroldo@gahauer.com.br)