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Burlando o ganho de capital

Diz o provérbio português: tantas vezes vai o cântaro à fonte, que algum dia lá deixa a asa. É o que acaba de acontecer com um grupo de contribuintes paulistas suspeitos de, nos últimos anos, terem se beneficiado indevidamente de isenção sobre ganho de capital com a venda de imóveis. Esse imposto é calculado à alíquota de 15% sobre o resultado positivo (valor da venda menos valor do custo).

Como se sabe, entre as operações de alienação de bens contempladas com isenção do ganho de capital, a legislação prevê dispensa do tributo nos casos de venda de imóveis por valor igual a R$ 440 mil, em se tratando do único imóvel do contribuinte. O benefício fiscal condiciona-se ainda à comprovação de que o interessado não tenha realizado nos últimos cinco anos outra alienação de imóvel a qualquer título, tributada ou não.

Segundo a cartilha do Leão, caracterizam-se como alienação, entre outras operações, as realizadas por compra e venda, permuta, adjudicação, desapropriação, dação em pagamento, procuração em causa própria, promessa de compra e venda, cessão de direitos ou promessa de cessão de direitos e contratos afins.

Burla

Diante de indícios de reiteradas fraudes, a Delegacia Especial da Receita Federal de Pessoas Físicas em São Paulo lançou a Operação Nômade, deflagrada inicialmente contra 107 contribuintes. Eles teriam se utilizado da isenção mais de uma vez no mencionado período de cinco anos. Somente na capital paulistas, estão previstos lançamentos de créditos tributários na ordem de R$ 23 milhões.

Nota divulgada pela Receita esclarece que, em apenas um dos casos analisados, constatou-se a ausência de recolhimento do ganho de capital e a utilização da isenção por quatro vezes no mesmo período de cinco anos.

Informou-se ainda que o próximo passo será um pente fino nas declarações de contribuintes que não respeitaram outras isenções sobre ganho de capital na alienação de imóveis, como sua utilização para aquisição de imóveis não residenciais no prazo de 180 dias. A propósito dessa isenção, a legislação dispensa do imposto de renda o ganho auferido por pessoa física residente na venda de imóveis residenciais desde que o alienante, no prazo de 180 dias, contado da celebração do contrato, aplique o produto da venda na aquisição de outros imóveis residenciais localizados no país.

É oportuno destacar que esse teto de R$ 440 mil estabelecido para fins de isenção na venda do único imóvel do contribuinte revela-se gritantemente defasado. Foi fixado há mais de 20 anos. Assim como a tabela progressiva do Imposto de Renda das pessoas físicas, está a reclamar uma efetiva atualização, ao menos pelos índices da inflação oficial dos últimos anos.

Diga-se o mesmo em relação aos defasados limites mensais de isenção – também para apuração do ganho de capital – na alienação de bens e direitos de pequeno valor – R$ 20 mil, no caso de alienação de ações negociadas no mercado de balcão, e R$ 35 mil nos demais casos.

Vale frisar que não é dado a nenhum cidadão o direito de descumprir as leis do seu país. Mas não é menos certo que quando o Fisco ignora a realidade econômica dos súditos, principalmente sua capacidade contribuinte, está, ao mesmo tempo, estimulando a busca de caminhos outros em nome da sobrevivência. Eis porque é preciso evitar que o preço da honestidade não se distancie tanto do alcance dos justos...

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