No vão da jaula

• A incapacidade do Leão de separar a praga do trigo, em se tratando de justiça fiscal, também se constata nas imposições legais atinentes ao abatimento da renda bruta de gastos com menor pobre dependente do contribuinte. Para coibir fraudes, a legislação exige que o cidadão honesto e com senso humanitário percorra infindáveis corredores da Justiça para obter um papel que, por si só, pouco representa. Somente com guarda judicial do menor o contribuinte poderá considerá-lo como encargo de família e deduzir despesas com a instrução do mesmo. A virtude de criar e educar um menor carente não é suficiente para obter o "favor" do Estado!

• É certo que existem as fraudes engendradas por contribuintes desonestos em benefício próprio. Mas não é menos certo que crianças necessitadas e cidadãos com grandeza de espírito e com coração grande não podem ficar à mercê de tão estúpida desconfiança, que, a rigor, decorre da inoperância do Estado. A cegueira do Leviatã para os dramas sociais não consegue distinguir a coisa daninha entre as boas. Quando todos pagam por um, perderá sempre o mais fraco. No caso, a própria sociedade.

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As normas do Imposto de Renda das pessoas físicas está recheada de passagens em que a frieza do calculismo arrecadatório é de cavalar insensibilidade diante da nossa realidade social.

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Exemplo disso é a insensata tributação sobre alimentos recebidos por menores e as pensões de mães separadas, quando necessários à sobrevivência e à dignidade da pessoa humana. A cartilha do Leão manda tributar, como se renda fosse, qualquer valor acima do limite de isenção recebido em dinheiro, a título de alimentos ou pensões decorrentes de acordo ou decisão judicial, inclusive alimentos provisionais ou provisórios dos infantes. Sequer a incapacidade civil do alimentado é causa excludente da incidência tributária ou merecedora de tratamento especial. Nesses casos, a tributação opera-se em nome do incapaz, via tutor, curador ou responsável por sua guarda.

A única justificativa aceitável para exigir tributo sobre tais valores – que, em regra, são destinados à garantia das condições mínimas de vida das pessoas favorecidas – reside na desconfiança do Fisco em relação a possíveis mágicas perpetradas por contribuintes com grande potencial econômico. De fato, elas existem. De quando em vez a fiscalização descobre engenhosos truques camuflados sob o manto de obrigações supostamente disciplinada pelo Direito de Família. Mediante atos dissimulados, o fraudador ora diminui, ora anula a base tributável de sua renda, "transferindo" para a ex-mulher (não obstante mantendo com ela os mesmos vínculos matrimoniais) ou para os filhos vultosos rendimentos que ele deveria oferecer à tributação. A separação do casal, com a guarda dos filhos em poder de um dos cônjuges, às vezes existe só no papel.

Joio e trigo

Certamente por conta dessa censurável possibilidade de fraudar o erário, o Fisco neutraliza os presumíveis efeitos de eventuais mágicas jurídicas, tributando indistintamente todos os beneficiários de alimentos e pensões judiciais baseados nas regras do Direito de Família. Em consequência, tanto as pessoas inocentes quanto as que inescrupulosamente agem em conluio recebem o mesmo tratamento.

Devido à constatação de carência de recursos humanos no aparato fiscalizatório, as garras da fera não se prestam a separar o joio do trigo. Por duas razões, fica mais cômodo para o controle da fiscalização exigir a declaração do imposto de "renda" de todos os beneficiários cujos alimentos estejam acima da faixa de isenção: morder uma parte da sagrada pecúnia alimentar e monitorar, concomitantemente, a veracidade dos valores lançados na declaração dos alimentantes.

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O Fisco, com isso, adota a política do "toma-lá-dá-cá". Como é sabido, as importâncias efetivamente pagas a título de pensão alimentícia em cumprimento de prévia decisão ou acordo judicial são dedutíveis, em sua integridade, na determinação da base de cálculo sujeita à incidência mensal do Imposto de Renda. O mesmo ocorre na declaração de ajuste anual do IR, onde, obrigatoriamente, devem ser informados os nomes dos beneficiários.

A propósito, vale registrar que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda, tribunal administrativo composto de representantes do Fisco e dos contribuintes, já decidiu, contrariando a fiscalização, que a homologação, pelo juiz, de pagamentos de pensão alimentícia já efetuados antes da sentença legitima a dedução, obedecida a época do pagamento.

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