O leitor deve ter em casa algum objeto cujo valor sentimental supera em muito o econômico. Um relógio que pertenceu ao avô, uma joia que foi da mãe...
Isso é normal, mas a pessoa deve estar ciente de que são coisas diferentes. Às vezes, pode acontecer de o apreço por um determinado bem "contaminar" a ideia de valor econômico. Entro no assunto por causa do e-mail do Marcelo, leitor da coluna. Ele conta que ele e os irmãos precisam decidir o que fazer com um imóvel rural que fazia parte dos bens de seu pai, morto recentemente. Os irmãos concordam em vender e ele está inclinado a adquirir as cotas deles. "Fico na dúvida se realmente vale a pena, pois o dinheiro da eventual venda é pouco pelo que acredito que o imóvel poderá valorizar no futuro", observa. "Não existem mais imóveis como esse na região e penso em mantê-lo por conta de um passeio eventual em fins de semana, como lazer. No futuro, ainda poderei lá residir, afora também toda a questão sentimental, pois é um imóvel que pertenceu a meus bisavós e está na família há mais de 100 anos."
Conversei sobre o tema com Fabio Araújo, sócio da consultoria Brain Bureau de Inteligência Corporativa e especialista em mercado imobiliário. A principal recomendação dele, antes de pensar em preço, é justamente separar o aspecto sentimental do econômico. "O sentimento é só da gente, não vale para o outro. É normal achar que um imóvel vale mais por causa do valor sentimental, por isso é preciso ser bem objetivo. Se ele quiser vender, precisa fazer uma avaliação profissional. Deve chamar umas três imobiliárias e fazer dessa uma avaliação exclusivamente financeira", diz.
Sobre a valorização futura, é difícil saber que rumos ela pode tomar. "Não tem como saber. Se valorizar, será pelo terreno e não pela infraestrutura que ele tem. Os terrenos tendem a se valorizar com o tempo, mas nunca se sabe quanto essa valorização pode demorar", observa Araújo. "Se a ideia for vender, o momento atual parece ser propício, porque o mercado está bastante aquecido."
Mas as lembranças não têm preço. O leitor pode, simplesmente, ignorar o mercado e ser feliz na chácara que foi de seus bisavós. Taí uma decisão difícil, Marcelo.
Acres cúbicos?
Ao escrever sobre o caso acima, me lembrei de um exemplo extremo de valor sentimental. Nas histórias em quadrinhos, Tio Patinhas é o pato mais rico do mundo. Na sua caixa forte, orgulha-se em manter três acres cúbicos de dinheiro. O lugar de honra, entretanto, é de uma singela moedinha, conhecida como a Número 1 o primeiro trocado que ganhou na trajetória que o transformaria num quaquilionário. A tal moeda deve ter um pequeno valor econômico, mas o personagem a tem em grande estima pelo que ela representa.
Não sei se o leitor, fã de quadrinhos ou não, já chegou a refletir sobre o mitológico tamanho da caixa forte do Tio Patinhas os três acres cúbicos mencionados no início desta coluna. Trata-se de uma interessante armadilha mental criada pelos roteiristas da Disney. É que as medidas cúbicas são sempre calculadas a partir de outra medida, linear. Assim, um metro cúbico equivale ao volume contido dentro de um cubo cujos lados medem um metro. Acontece que um acre é uma medida de área, equivalente a pouco mais de 4 mil metros quadrados. Assim, um acre cúbico é uma medida impossível imagine, por exemplo, uma caixa dágua com capacidade para um metro quadrado cúbico de líquido. Não faz sentido: é apenas uma forma de jogar os leitores a imaginar uma quantidade de dinheiro tão colossal que não pode sequer ser medida.
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