Na semana passada, encontrei-me com jornalistas da América Latina em um evento ligado ao setor de tecnologia. A certo ponto da conversa, um colega argentino me perguntou por que razão os brasileiros são tão loucos por compras quando viajam um fenômeno que nós conhecemos, mas que eu não sabia que era assim tão público. "São os impostos", comecei a explicar. "São muito altos no Brasil, e fazem com que os produtos industrializados custem muito caro por lá." E passei a citar o exemplo de um videogame que, nos Estados Unidos, custa pouco mais de US$ 200. "No Brasil custaria uns US$ 300", ele cortou. "Não. Dificilmente você acharia por menos de US$ 500", respondi.
Ele ficou surpreso. Eu também, e não foi por causa do número em si. Foi porque me toquei que a explicação convencional, que todos estamos acostumados a ouvir e a dar, é falsa. Convenhamos: por maiores que sejam os impostos brasileiros, eles não vão triplicar o preço de um produto. Não sozinhos. E a questão não se limita aos eletrônicos, é até pior quando se fala em roupas: um moletom que custa R$ 40 nos EUA sai por R$ 288 em uma loja aqui de Curitiba. Como? Por quê?
Conversei a respeito com o economista Fábio Araújo, professor da PUC, e repeti a pergunta do hermano: porque os brasileiros compram tanto no exterior? Para ele, há dois elementos que explicam a situação. Um é psicológico, outro é econômico. A questão psicológica diz respeito ao nosso passado produto bom vem do exterior, não é aquele feito aqui. Pensamento típico de colônia, afinal, quando o Brasil era uma dependência portuguesa, os melhores produtos eram mesmo destinados à corte, e não àquela distante terra de selvagens, o Brasil.
Já o componente econômico é aquele que nós conhecemos muito bem: é bem mais barato comprar no exterior do que em casa. A causa desse fenômeno inclui o problema dos impostos e, principalmente, a margem de lucros. "As margens aqui são muito maiores do que nos Estados Unidos, por exemplo", observa Araújo. "Nos Estados Unidos, as margens médias estão entre 7% e 8%. É fato a ser comemorado quando alguma empresa consegue uma margem de dois dígitos. Aqui, ninguém sai de casa por menos de 30%."
Nos últimos anos, a economia brasileira passou por uma transformação e tanto. O país cresceu, o número de pessoas aptas a consumir aumentou, a inflação acabou, os juros baixaram (estão maiorzinhos agora, mas é consenso que este é um movimento que não durará mais do que um ano). Mas a margem de lucro, que era enorme para dar aos empresários uma compensação por fazer negócios num ambiente tão louco como era o Brasil dos anos 80, por exemplo, ficou lá em cima.
Pode até haver razões para ela ter-se mantido alta. Uma delas é justamente a ampliação do mercado, que manteve a demanda em alta. Outra é a disposição de uma parte do público em pagar valores altos. Preço é assim: se o consumidor aceita, porque o vendedor iria baixar?
É muito conveniente para o empresariado pôr a culpa no governo e na sua fome por arrecadação. Mas ele não é o único culpado pelos preços altos que você, leitor, paga no shopping e no hipermercado. "O governo tem de fazer a parte dele, mas o empresário tem de se acostumar com uma situação em que o lucro não vem de margens enormes, mas de volumes de vendas maiores", diz Araújo.
Noutras palavras: se a ganância for menor, o preço baixa, vende-se mais e todo mundo fica contente.
Euro
Tem leitor perguntando se vale a pena comprar euros como investimento, já que a moeda europeia vem se desvalorizando fortemente desde o início da crise dos Piigs ("apelido" dado ao grupo de países com problemas fiscais: Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha Spain, em inglês). A resposta é do consultor Friedbert Kroeger, da Financonsult: "O que está acontecendo agora é um movimento contrário, os investidores estão deixando a Europa e preferindo investimentos que consideram mais seguros. É difícil investir num mercado como esse porque não se sabe onde é o fundo do poço pode ser que você compre euros agora e eles continuem perdendo valor por mais alguns meses. Além disso, pegar moeda e guardar normalmente é ruim, porque não há nenhuma correção, não há taxa de juros. A única indicação para compra antecipada de moeda é no caso de alguém que tenha compromissos futuros nessa moeda. Um empresário que vai pagar uma importação ou uma pessoa que pretende fazer uma viagem nos próximos meses pode comprar euros e tirar proveito dessa situação". Se derrubar...
... é pênalti. Na semana que vem, o colunista passa a fazer jornada dupla. Financês continua a sair nas terças-feiras, e nas quartas passo a assinar uma crônica no caderno Copa 2010. O time montado pela casa é de primeira, por isso me comprometo a dar duro nos treinos para cumprir com o esquema tático.
Na concentração
Enquanto a Copa não vem, espero seu comentário, crítica ou dúvida sobre finanças pessoais. Escreva para financaspessoais@gazetadopovo.com.br.