A oportuna reportagem de Camille Bropp Cardoso intitulada "Pessoas físicas fogem da bolsa", publicada na Gazeta de ontem, chamou atenção para um fenômeno interessante na bolsa brasileira: o refluxo dos investidores individuais. Ele faz parte de um conjunto de sintomas que afeta o mercado de capitais, que também mexe com as empresas.
No fim da década passada, um público novo descobria a bolsa e alimentava um dos mercados mais promissores do planeta. Tanto que, em 2009, a BM&F Bovespa fixou uma meta ambiciosa: multiplicar por dez o número de investidores pessoa física. Hoje, eles estão procurando outros ares. O que mudou?
Uma parte da explicação está no bom retorno de outros mercados, em especial a renda fixa (com a alta dos juros nos últimos meses faz cada vez mais sentido deixar o dinheiro render em fundos desse tipo, com risco menor que o da bolsa) e aplicações derivadas do mercado imobiliário, que são isentas de Imposto de Renda no rendimento mensal.
Outra parte está nas decepções que o investidor levou. Muita gente perdeu bastante dinheiro por acreditar nas promessas de altos ganhos das empresas X, e não quer saber de ações nem que venham cobertas de ouro.
Finalmente, há a questão das eleições. Elas trazem muita incerteza para o mercado, principalmente porque a principal blue chip da bolsa brasileira, a Petrobras, é estatal. Isso não é de hoje: desde 1989, quando foram restabelecidas as eleições diretas para presidente da República, os anos de eleição são difíceis na bolsa. De lá para cá, tivemos seis eleições gerais. Em quatro desses anos o índice Ibovespa registrou perdas. Apenas nas duas últimas eleições tivemos alta, sendo que a de 2010 foi discretíssima: 1,04%, bem menos que os 5,9% da inflação naquele ano.
Ou seja: ano de eleição é mesmo mais complicado para quem investe em ações. No livro Hoje é dia de alta na bolsa, que cobre o período até abril de 2009 (portanto sem contar a última eleição), o especialista Carlos Carvalho Júnior faz as contas: "O risco médio nos anos de eleição para presidente é de 48,91% bem superior aos anos normais".
Empresas paradas
A paradeira na bolsa também afeta as empresas. Passada a grande onda de abertura de capital, ocorrida em fins da década passada, agora estamos em um período de seca total no que se refere às ofertas públicas iniciais (IPOs). Os IPOs são formas de empresas captarem dinheiro para crescer, sem precisar pedir nada emprestado. Quando não ocorrem IPOs, é sinal de que as empresas conseguem dinheiro mais barato nos bancos ou estão congelando seus planos de crescimento, ou ainda estão adiando seus planos porque creem que não conseguirão uma condição vantajosa na bolsa.
O primeiro semestre de 2014 não teve nenhum IPO. É a primeira vez em dez anos que isso ocorre.
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