Eu não estava por aqui, mas o que dizem é que em 1929 as coisas andaram muito feias. O registro histórico que temos é terrível: nos Estados Unidos, centro da crise, pessoas que perderam tudo o que tinham no mercado financeiro estavam desesperadas, na pobreza. O Brasil caiu junto. De um ano para o outro (de 1929 para 1930), as receitas cambiais do país caíram pela metade. A razão desse desastre estava, principalmente, no café. Em setembro de 1929, um mês antes de a bolsa desabar, a libra de café (medida que equivale a 453 gramas) custava US$ 0,22. Em setembro do ano seguinte, estava em US$ 0,08.
Naquele tempo, o café respondia por mais de 70% das vendas do país no mercado internacional. Depois dele, os produtos mais importantes eram o cacau e a banana ou seja, nossa pauta de exportações era mais parecida com o cardápio de sobremesas de um restaurante. O problema é que no nosso principal mercado consumidor as pessoas estavam passando fome. Café e chocolate não são exatamente gêneros de primeira necessidade, então não havia mais quem comprasse os nossos produtos.
Como já observei, eu não assisti àquela crise. Pouca gente hoje em dia pode falar dela como testemunha ocular. Lá se vão 79 anos a serem completados, aliás, na sexta-feira. Para compreender direitinho que ocorreu naqueles tempos seria preciso que o indivíduo já estivesse na idade adulta. Ou seja, alguém que hoje estaria com mais de 100 anos de idade, situação em que se enquadram perto de 25 mil brasileiros, segundo o IBGE.
Estou falando disso porque me dei conta de que as comparações da crise atual com a de 1929 são muitas, inclusive aqui na Gazeta. E elas não me parecem justas.
Que ninguém se engane: os eventos deste ano a quebra de bancos, o socorro trilionário a instituições em perigo, as perdas no mercado de capitais não são corriqueiros. Mas o mundo é diferente do que era há 79 anos. A começar pelo Brasil, um país bem mais seguro do que o daquela época. Um país de 190 milhões de brasileiros, que sustentam uma economia diversificada e uma das democracias mais estáveis do continente. Não o aglomerado rural de 1929, com seus 35 milhões de habitantes.
Talvez esteja exagerando, mas creio que comparar a crise atual com a de 1929 seja como equiparar o surto inflacionário que tivemos este ano com os episódios dos anos 80 e 90. Este ano talvez o índice de preços ao consumidor chegue aos 7%. Nos anos 90, a média ficou em 325% ao ano. Dá para comparar? Acho que não.
De minha parte, me comprometo a não embarcar mais nessa onda. A não ser, quem sabe, para contar para os meus netos que assisti à maior crise econômica desde 1929. Isso se eles se interessarem pelo assunto, o que eu duvido.
De volta ao Tesouro
O leitor Cadu pergunta se a LFT (Letra Financeira do Tesouro), um dos títulos públicos negociados via Tesouro Direto, é um bom negócio nesse momento. A resposta é: depende.
O ideal é fugir dos títulos prefixados (como LTN e NTN-F). A LFT, que tem como referência a taxa Selic, também pode ser uma boa opção, embora ainda não esteja muito clara a forma de ação do Banco Central no que se refere às taxas de juros nesse momento de crise. Vale lembrar, no entanto, que o ambiente atual pode vir a se alterar nos próximos tempos, com reflexos para o investimento. O melhor é olhar para a frente, sem se preocupar tanto com as circunstâncias atuais.
Migração
Com os bancos fechados, o público descobre outros canais para resolver seus problemas. Quem foi à agência dos Correios da Marechal Deodoro ontem encontrou uma fila bem maior do que de costume quase todo mundo que estava nela queria os serviços do Banco Postal. Um correspondente bancário que acabou de abrir as portas na Rua José Loureiro (a meia quadra do Banco do Brasil da Praça Carlos Gomes, que não abre as portas há um tempão) tinha filas ontem à tarde.
Ocasiões como essas são boas para mudar hábitos. Uma boa parte dessa turma talvez passe a pagar suas contas em outros locais.
Então tá!
Na próxima semana tem mais Financês. Até lá, você pode enviar suas observações e dúvidas para o e-mail que está aí embaixo.