A indexação foi o "remédio" que permitiu à economia brasileira conviver com a inflação crônica e aguda. Mas esse longo tempo de convivência gerou uma dependência que alimenta a doença. E para se livrar dela não é fácil, a não ser que os chamados preços livres despenquem, o que pode causar sérios desequilíbrios e inibir investimentos em setores vitais (agricultura, por exemplo).
O IPCA de fevereiro índice de preços ao consumidor calculado pelo IBGE que serve de parâmetro para as metas de inflação estabelecidas pelo governo mostrou claramente esse problema. Na média, os preços teriam variado 0,55%, mas só a contribuição do segmento educação foi de 0,36%. Isso impediu que o índice acumulado em 12 meses recuasse, pois em fevereiro de 2007 a oscilação havia sido de 0,5%.
O IBGE, como sempre nos dois primeiros meses do ano, registrou esse impacto porque é a época que as escolas e faculdades particulares reajustam suas mensalidades. E se não o fizerem dificilmente terão condições de absorver o aumento de custos inevitável nos meses seguintes, em função dos reajustes nos salários determinados por acordos coletivos com sindicatos de professores, de tarifas mais altas nas contas de luz, água e esgoto, telefone, de correção nos aluguéis, no IPTU, no vale transporte etc. Ou seja, aumentos causados também pela indexação.
Para que os preços livres neutralizem parte desse efeito da indexação, o Banco Central normalmente mantém superelevadas as taxas básicas de juros, pois com o consumo reprimido a concorrência se encarregaria de anular as tentativas de aumento de preços pelos produtores e comerciantes (que também têm parte de seus custos pressionados pela indexação).
A médio prazo, a saída para esse beco é um salto de produtividade na economia como um todo ou em setores fundamentais. As cadeias produtivas devem encontrar caminhos que lhes permitam expandir a oferta de bens e serviços sem que os seus custos se elevem em igual proporção. Mas para que isso possa acontecer são necessários investimentos em modernização, tecnologia, treinamento de pessoal, marketing etc.
Nesse caso, os juros básicos superelevados funcionam como uma faca de dois gumes, pois acabam encarecendo o capital capaz de financiar tais investimentos. E assim, o beco fica sem saída.
Até o agravamento da crise financeira internacional, a opção brasileira era de convivência com a inflação em um patamar considerado suportável pela sociedade (algo como 4% a 6% ao ano), na esperança que pouco a pouco um ganho ou outro de produtividade fosse surgindo para possibilitar futuras quedas nas taxas de juros, num processo de redução lenta (lentíssima, na verdade) e gradual.
Então a crise financeira nos apanhou em momento ainda de taxas de juros superelevadas e inflação num patamar incômodo. Como o Banco Central sempre vacila muito antes de promover qualquer corte nos juros (as reduções geralmente são decididas meio na base do ensaio-erro, o que leva as autoridades a optar por doses homeopáticas, pois assim só correm o risco de errar pouco), as autoridades ficaram esperando a confirmação do impacto negativo da crise sobre o Brasil.
Os números do emprego vieram aterrorizantes; e os do Produto Interno Bruto (PIB) do último trimestre de 2008 deram a dimensão exata do tamanho do problema.
Não há agora muito o que se possa fazer se não cortar mais as taxas de juros básicos a cada reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Como as taxas estavam superelevadas, o corte desta última reunião 1,5 ponto porcentual mesmo sendo o maior que as autoridades já ousaram pôr em prática, não altera substancialmente o cenário. Juros básicos de 11,25% ao ano o Brasil já teve no início do ano passado, e em um ambiente de crescimento econômico. Será preciso um corte de mais 1,5 ponto porcentual para a política monetária de fato fazer diferença.
Se vale um palpite, tal corte só virá em duas etapas, provavelmente um ponto e depois 0,5 ponto porcentual, nas reuniões do Copom de fim de abril e início de junho.
Antes tarde do que nunca.
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A redução de 1,22% nas tarifas residenciais e comerciais (baixa tensão) de energia elétrica cobradas pela Ampla em 66 municípios do Estado do Rio incluindo Niterói e parte da Baixada Fluminense foi consequência direta da diminuição do furto de eletricidade. O remanejamento da rede de distribuição e o uso da medição eletrônica (por meio de chips) dificultou os "gatos" e com isso, na média, o furto diminuiu 4,22% de 2003 a 2008 na área de concessão da Ampla. Em algumas regiões, o furto que chegava a 80% caiu a zero.
De acordo com a legislação, as perdas de energia decorrentes de furto fogem da responsabilidade da concessionária e por isso tal custo acaba sendo repassado para os consumidores que pagam suas contas em dia. Se o furto diminui, a recuperação de receita é também considerada no cálculo quando a tarifa é revista pela agência reguladora (Aneel).
Desde 2005 até hoje as tarifas residenciais da Ampla tiveram uma alta acumulada de 3,6%. No mesmo período o IGP-M variou 2,34% e o IPCA, 20,59%. Todos ganham com o combate ao furto de eletricidade.