Como é impossível falar em preço de soja ou milho sem olhar para a Bolsa de Chicago, referência mundial na formação de preço, também é impossível tratar da quebra na produção de grãos dos Estados Unidos sem avaliar os reflexos, positivos e negativos, no agronegócio brasileiro. Resultado de uma relação de oferta e demanda cada vez mais globalizada, não resta dúvida de que a seca norte-americana se traduz em oportunidade ao Brasil. Com menor oferta no maior produtor, não tem nenhum segredo: mercado em alta, preço aquecido e grãos supervalorizados.
Parece fácil e bastante conveniente ao Brasil, que se destaca ao lado dos Estados Unidos como um dos principais fornecedores de grãos ao comércio mundial. Com um ciclo diferente, o país consegue abastecer e ocupar parte do mercado que fica descoberto em função da produção menor na América do Norte. Mais do que isso, o Brasil consegue atuar e se preparar de maneira estratégica e planejada, ampliar área, aumentar o investimento em tecnologia e fazer apostas mais seguras de acordo com a conjuntura, doméstica e internacional. Como ocorre neste momento, quando o país se organiza para plantar e colher uma safra com potencial para superar as 180 milhões de toneladas 150 milhões somente de soja e milho.
A se cofirmar as projeções iniciais para o ciclo 2012/13, em apenas três temporadas a safra brasileira terá dado um salto superior a 20 milhões de toneladas. Isso tudo, apesar da seca que castigou a Região Sul na colheita passada. Em 2013, também vamos consolidar a posição de maior exportador de soja, conquista que veio em 2012, quando os embarques brasileiros da oleaginosa superaram, pela primeira vez na historia, as vendas dos Estados Unidos. A marca a ser estabelecida agora é a de maior produtor mundial de soja, o que não será difícil, a julgar as primeiras projeções ao plantio, que tem início agora em setembro.
Contudo, não é tão simples assim. Numa avaliação simples e direta, melhor remuneração à produção de grãos no Brasil. Na aldeia global do agronegócio, porém, na visão ampliada dos sistemas de produção, algum elo da cadeia produtiva acaba sendo prejudicado. É o caso do segmento de carnes, em especial aves e suínos, que tem no preço da soja e do milho seu principal custo de produção. Como consequência, a redução no alojamento de frangos e o abate de matrizes na suinocultura, que num efeito cascata leva ao aumento de preço do produto na outra ponta, que está gôndola do supermercado. Ou seja, reflexos dentro e fora da porteira. Para o agronegócio e para a economia em geral.
E se mexe no bolso do cidadão, seja ele urbano ou rural, mexe com o governo, com o PIB (Produto Interno Bruto) e com a inflação. O que significa intervenção para apoiar, racionar, controlar ou simplesmente para estabelecer limites, do interesse público ao privado. As cotações das commodities agrícolas devem se acomodar naturalmente em patamar superior de preços com o avanço da colheita nos Estados Unidos e o plantio da safra sul-americana. Mas até lá o que será dos produtores e da produção de frango? O que esperar então do preço da carne ao consumidor? Vai aumentar 10%, 20% ou 30%? Perguntas que a cada dia ficam mais difíceis de serem respondidas.
O governo federal não quer ver a carne de frango aumentando de preço. Mas acontece que já houve aumento e haverá ainda mais se a causa não for combatida na base, que está na produção. O setor está consciente de que é preciso pisar no freio, reduzir o ritmo e agir com cautela. Mas somente isso não é suficiente. O milho continua caro, apesar da safra recorde e do excedente de produção. Nem mesmo a exportação maior do cereal está sendo capaz de regular o mercado interno, que continua espelhado em Chicago, quase que ignorando os fundamentos domésticos de oferta e demanda. Um cenário onde o frango não precisa apenas de milho, mas precisa do governo. Não para ter acesso a um produto barato, mas com preço justo, competitivo e sustentável.
A conta na verdade nunca vai fechar. Mas pode ser equacionada, a depender da disposição e nível de intervenção do governo, porque não dá para esperar que operando nos extremos esse mercado se regule sozinho. Até pode, mas antes que isso ocorra o prejuízo será grande e em muitos casos irreversível. Tem frigorífico fechando as portas e produtor deixando a atividade. Enquanto isso, o contrassenso bate à porta. A safra de milho é tão grande que começa a ser armazenada, ou melhor, acumulada no pátio das empresas que recebem grãos no Mato Grosso, como mostrou reportagem da semana passada do Agronegócio Gazeta do Povo.
Daqui a pouco o mercado interno vai cair na real e pode sobrar milho, não necessariamente porque o preço está bom ou ruim, mas por conta da redução no alojamento da avicultura, o principal consumidor do cereal no Brasil. Se existe algo para ser feito, isso precisa ser feito agora, ou então pode ser tarde demais.