Está faltando trigo e feijão no Brasil. E não é entressafra, o que significa que também falta planejamento e sobra descaso com duas das principais cadeias da base alimentar do Brasil. Culturas que, muito antes do viés econômico, têm a ver com segurança e abastecimento alimentar. Uma responsabilidade que vai além da porteira. É do governo e das cooperativas, da agroindústria e do trade, do público e do privado. Porque plantar ou não plantar trigo e feijão não é uma decisão exclusiva do produtor. São culturas de risco climático intenso, alta volatilidade de preço e liquidez incerta, fragilidades que exigem muito mais que vontade de plantar.
Reduzir ou até zerar a tarifa de importação pode ser uma saída temporária e paliativa. Porque a solução vai muito além. Ela é estrutural. Ao final, o impacto é sempre econômico, seja ele positivo ou negativo, na rentabilidade do agricultor ou na mesa do consumidor. Garantir o abastecimento tem que ser política de governo, pensada enquanto estratégia. As medidas de socorro têm sempre um preço maior que as ações preventivas.
O problema maior, no entanto, ainda está por vir. Em teoria, as medidas do Brasil para desonerar a importação do feijão e do trigo até que tem a sua lógica: estimular as compras externas para ampliar a oferta e regular preço no mercado interno. Na prática, porém, as importações devem sim aliviar o aperto na demanda, mas com pouco impacto em preço no varejo, na gôndola do supermercado e ao consumidor final. Porque comprar lá fora também está mais caro. Isso quando há produto disponível.
A Argentina, nosso principal e tradicional fornecedor de trigo, fechou as fronteiras e suspendeu as exportações do cereal. Redução de área e safra menor levaram o governo daquele país a proteger e priorizar o consumo local. Com o feijão não é diferente. Além de enfrentar uma barreira cultural, de hábitos alimentares em relação à variedade mais consumida aqui dentro e o feijão produzido lá fora, a oferta da leguminosa no ambiente internacional está escassa.
O lado bom dessa história está no campo. O legítimo produtor de trigo e feijão está sendo remunerado. E remunerado justamente, é bom que se diga. Nas últimas décadas não foram raras as temporadas com frustrações climáticas ou econômicas para as duas culturas. Para quem permanece fiel às origens, uma espécie de compensação aos anos ruins, da dedicação e do acreditar em culturas com altos e baixos e uma liquidez que desafia o bom-senso econômico e os conceitos mais básicos da relação e da necessidade entre produção e consumo.
Agora, não restam dúvidas da pressão que o cenário exerce sobre o consumo, os preços ao consumidor e à inflação. Feijão a preço de carne e pão a preço de brioche mexe no bolso, reduz consumo e ameaça as metas de crescimento e de inflação. Sem falar do prejuízo à imagem do Brasil exportador, que prioriza a produção de commodities em detrimento e descaso com a saúde e segurança alimentar. Produzir para exportar é uma vocação econômica do Brasil. Mas produzir para garantir o abastecimento interno de produtos básicos é mais que uma obrigação. É questão de soberania de uma nação.
Para ter uma ideia de como o feijão com arroz e o café da manhã estão mais salgados basta olhar o histórico dos preços. Isso, na ótica do consumidor, que nada tem a ver com a situação do produtor. Aliás, são duas realidades, que apesar de serem as duas pontas de uma mesma cadeia não podem ser colocadas na seara das comparações. Se o preço ao consumidor está inflacionado, não é porque o produtor está sendo melhor remunerado. Essas distorções ocorrem porque o país ainda carece de uma política agrícola que priorize o econômico, a geração de emprego e renda e desenvolvimento econômico e social, características peculiares ao agronegócio, mas sem esquecer do abastecimento e segurança alimentar.
Na semana passada o feijão preto atingiu máximas de R$ 150 a saca de 60 quilos no mercado do Paraná, o maior produtor. O feijão de cor, denominação das variedades do feijão branco, até R$ 200/saca. A cotação média em julho de 2012 foi de R$ 100 e R$ 108. O trigo, com cotação linear para todo o estado, R$ 40 a saca. A média aferida em julho do ano passado foi de R$ 26,96. Os preços são da base de dados e acompanhamento do Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria da Agricultura do Paraná (Seab).
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