A renda dos 10% mais pobres cresceu de 2001 a 2006 a proporções chinesas, ou 9% ao ano. O Brasil fez em cinco anos o que a América Latina fez em 15. Mas o avanço, principalmente em 2006, foi mais das transferências públicas do que das rendas do trabalho. Os mais pobres estão melhorando pelo Bolsa-Família e outras políticas sociais, mas não pelo trabalho. Essas informações estão na mesa do presidente Lula.
Assim que saiu a Pnad, o presidente pediu que o economista Ricardo Paes de Barros, do Ipea, preparasse uma análise crítica dos dados para ele olhar. O economista, que está em Washington, em reuniões no Banco Mundial, preparou em Power Point, com Mirela Carvalho e Samuel Franco, uma coleção de gráficos chamando a atenção para fatos excelentes e riscos preocupantes nas políticas de combate à pobreza e desigualdade. Eles trazem motivos de comemoração para o país e alertas que não devem ser ignorados.
A queda da pobreza entre o fim de 2002 e 2006 foi de 8,6 pontos percentuais. A América Latina, entre 1990 e 2005, reduziu a pobreza em 8,5 pontos. Ou seja, o Brasil fez em cinco anos o que a América Latina fez em 15. O México fez também um progresso forte. Quando se compara o total do avanço naquele país em 15 anos, é maior do que o nosso. O México tem também um forte programa de política de transferências de renda, que vem passando de governo a governo só trocando de nome, mas que tem o mesmo formato do Bolsa-Família. Quem recebe tem de cumprir uma série de condições. Até onde eu acompanhei o debate lá, eles parecem mais conscientes de que isso é o ponto central: a transferência tem de ser feita sob condições que precisam ser cumpridas para que assim se construa a porta de saída. As bolsas se justificam como meio do caminho para construir um futuro em que as crianças atualmente beneficiadas não precisem delas para seus filhos por terem, através da educação, dado o salto para outro patamar social.
Segundo o estudo dos três economistas do Ipea, a queda da pobreza se deve, em partes quase iguais, à queda da desigualdade (que explica 48% da redução da pobreza de 2002 a 2006) e ao crescimento econômico (que explica 52%). No passado mais recente, entre 2005 e 2006, o crescimento foi a explicação mais forte. Mas a queda da desigualdade, forte, persistente, numa taxa de 1,2 ponto porcentual por ano, faz com que o crescimento tenha beneficiado, segundo os economistas, prioritariamente os mais pobres.
No qüinqüênio de 2001-2006, claramente os mais pobres foram mais beneficiados. Os 10% mais ricos é que tiveram o menor aumento. Na média nacional foi 2,5% ao ano. Nos 10% mais pobres, 9% ao ano. Em 2006, no entanto, inverteu-se: a taxa de crescimento da renda familiar per capita foi mais acelerada para todos, exceto para os 10% mais pobres, alertam os economistas. A queda da desigualdade no último ano deveu-se basicamente às transferências, sejam benefícios previdenciários seja o Bolsa-Família.
Onde está o problema? Na renda do trabalho. Ela explica uma parte pequena da melhora. A taxa anual de crescimento da renda do trabalho é muito maior nos segundo, terceiro e quarto décimo de distribuição de renda e bem pequena nos 10% mais pobres (veja o segundo gráfico). Esse é um ponto crítico importante: a renda desses trabalhadores tem subido menos do que o salário mínimo. Os dados mostram que o Bolsa-Família alivia, mas não está construindo a porta de saída. A renda dos mais pobres aumenta, mas não pela renda do trabalho, e sim pelas transferências públicas. Há outro sinal amarelo importante neste painel da Pnad, sobre o qual falarei amanhã.