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Míriam Leitão

Crianças e velhos

NOVIDADE | Mauro Campos
NOVIDADE (Foto: Mauro Campos)

As crianças no Brasil são mais pobres, muito mais pobres, do que os velhos. Essa constatação feita pelos economistas é perturbadora. Na avaliação crítica da Pnad feita pelo economista Ricardo Paes de Barros para o presidente Lula, está registrado que "o grau de pobreza entre as crianças é mais de quatro vezes maior que entre os idosos". Isso cria um desafio a mais para as políticas sociais.

Confira nos gráficos abaixo de Paes de Barros, Mirela Carvalho e Samuel Franco. De zero a 5 anos, quase a metade das crianças é pobre ou extremamente pobre, enquanto na faixa dos 70 anos ou mais só 5% são pobres.

– Na faixa dos extremamente pobres estão 20% das crianças e apenas 1% dos velhos – diz Paes de Barros.

A conta é feita pela renda familiar per capita das famílias onde estão os mais velhos e a renda familiar per capita das famílias com crianças. Isso significa que os benefícios previdenciários, como as pensões e aposentadorias ou os Benefícios de Prestação Continuada, têm sido mais eficientes para tirar da pobreza seus recebedores.

Um país que protege mais seus velhos que suas crianças pode estar construindo um futuro assustador. Esses dados, segundo informa o ministro Paulo Bernardo, serão avaliados mais detidamente pelo governo, a pedido do próprio presidente.

O que eu mostrei aqui ontem na coluna foi que o país tem a comemorar a queda da desigualdade e a redução da pobreza que se acelerou recentemente, passando a andar mais rapidamente do que em toda a América Latina. Tem a comemorar o aumento da renda dos mais pobres, que é muito maior do que a média nacional. Mas tem de se preocupar com o fato de que a renda dos mais pobres aumenta mais pela ajuda do governo do que pela melhoria da renda do trabalho.

– Apesar de programas como Pronaf, microcrédito, educação de jovens e adultos, o que realmente está aumentando a renda dos muito pobres são as transferências públicas como o Bolsa-Família, o que deixa os mais pobres sem uma porta de saída – diz Paes de Barros.

O Brasil perde muito tempo com discussões bizantinas sobre políticas sociais. Na década de 1970 os economistas se dividiram: um grupo achava que a redução da pobreza se daria pela redistribuição da riqueza, outro grupo achava que era pela educação. Evidentemente, sem educação não há distribuição de riqueza sustentável. Hoje no Brasil há debates esdrúxulos sobre a paternidade dos avanços: se pertencem aos tucanos ou aos petistas. Evidentemente, sem a continuidade e o aperfeiçoamento das políticas sociais, não há projeto de melhoria social que apresente resultados.

Há também muitas críticas às políticas de transferências de renda, acusando-as de serem mero assistencialismo. Podem ser ou podem não ser, depende do que se faça com elas. Se forem só dinheiro dado ao mais pobre é bom, alivia, mas não constrói o futuro. Se houver um bom cadastro e fiscalização, há mais garantia de que está indo para quem realmente precisa. Se houver exigências de presença na escola e fiscalização, há mais chance de se romper o ciclo da pobreza no futuro.

Por isso toda a atenção deve ser dada às avaliações técnicas de cada política. As políticas precisam ser avaliadas e testadas para saber onde estão os avanços e onde estão os perigos. No diagnóstico feito por Paes de Barros, fica claro que os extremamente pobres melhoraram, mas não estão encontrando uma porta de saída ainda, e que, no seu conjunto, as políticas sociais estão sendo mais eficientes para tirarem os mais velhos da pobreza do que as crianças. Dois avisos prévios de que é preciso aperfeiçoar mais as políticas sociais brasileiras.

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