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Míriam Leitão

Parada estratégica

O que vai acontecer com a Secretaria de Longo Prazo? A curto prazo, ficará suspensa no ar. O governo está estudando as alternativas. Segundo o ministro Paulo Bernardo, a medida provisória não pode ser reapresentada, já que o voto que a derrubou considerava que não havia urgência para o tema. "A alternativa seria apresentar um projeto de lei", disse o ministro.

Se for isso, ela deixaria de existir por um tempo. A MP tem força de lei e entra em vigor imediatamente. No PL, só depois da tramitação é que o órgão vira lei e pode, portanto, existir, gastar, contratar, nomear. Os 660 DAS que foram distribuídos em vários ministérios ficam suspensos também.

O Senado, com o protagonismo do PMDB, fez certo por linhas tortíssimas. As decisões de derrubar um ministério cuja função ainda não se sabe e de suspender uma orgia de DAS ocorreram porque o PMDB quer cargos na Petrobrás e porque o senador Renan Calheiros achou que todo o apoio que recebeu do PT não foi suficiente. Renan se sente abandonado e quer mais apoio.

O ideal é que a derrota do governo servisse para se pensar um pouco mais sobre a necessidade ou não do órgão. Ninguém tem dúvidas de que é preciso pensar o longo prazo do Brasil. Mas a Secretaria, quando surgiu, foi para atender aos pedidos de curto prazo do PRB, que queria mais espaço, mais cargos em comissão e um posto para o professor Mangabeira Unger.

Os dois representantes do senador Marcelo Crivella que chegaram a ir ao Ipea saber o número de DAS no órgão abriram uma temporada inédita: a da intervenção política num instituto que nasceu para ser uma espécie de grilo falante do governo, a consciência crítica, o pensamento independente. A declaração do novo presidente do Ipea, Márcio Pochman, na posse, de que era preciso organizar o dissenso, deu também um mau sinal. O ideal é que o dissenso exista, porque esse é o melhor ambiente para um centro de pensamento, de análise crítica das políticas públicas, de balanços sem qualquer submissão à conjuntura política.

Seria bom se neste momento de reversão o governo realmente pensasse se os 660 cargos comissionados a mais são mesmo necessários. O governo tem inchado muito a máquina pública. Ela não é raquítica, ao contrário do que pensa o presidente do Ipea. Ela tem deixado raquíticos os contribuintes que se dispõem a pagar todos os impostos e andar em dia com todas as exigências burocráticas e esse mar de taxas, impostos, contribuições, regulações tributárias do país.

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, numa entrevista que me concedeu ontem no programa "Espaço Aberto", da Globonews, defendeu a existência da Secretaria.

– Foi decisão do presidente criá-la, e há muito tempo o Estado brasileiro deixou de fazer o planejamento estratégico, de pensar o futuro.

Eu perguntei se isso não era, em parte, uma função do Ministério do Planejamento e do Plano Plurianual, que é feito em sua pasta. Ele disse que o PPA é o planejamento das ações de governo por três anos, por um mandato, e que é preciso pensar como vai ser, por exemplo, a educação daqui a 15 anos, como vai ser a Previdência no futuro, e garantiu que a Secretaria de Longo Prazo tem-se dedicado a estudos relevantes sobre o Brasil.

É ideal fazer cenários do futuro, antecipar-se aos problemas, ter uma ação conseqüente de remover os obstáculos aos objetivos nacionais. Não necessariamente foi isso que indicou a maneira como começou a ser organizado esse ministério do futuro. A rejeição da MP é um bom momento para se pensar como fazer isso unindo os esforços e as inteligências das quais o país dispõe, em vez de criar um órgão que elege um grupo vencedor que se impõe aos outros. O Brasil tem carências demais para desperdiçar esforços.

O ministro Paulo Bernardo também defendeu o que está acontecendo na Petrobrás. Segundo ele, é natural que o governo partilhe o poder, e para ele a empresa tem um excelente sistema de governança.

– Cada decisão, quando é tomada, passou por diversas instâncias técnicas dos quadros permanentes da Petrobrás. Inicialmente, quando o José Sérgio Gabrielli foi escolhido como diretor financeiro, foi criticado, e hoje já se sabe do trabalho que ele fez pela empresa.

Tomara que o ministro tenha razão e que o corpo técnico da Petrobrás proteja a empresa da maneira bizarra como estão sendo divididos os cargos da sua diretoria. Tem uma pergunta de difícil resposta: o que tanto querem os políticos na Petrobrás? Por que os políticos governistas são capazes de se unir à oposição neste momento de conflagração no Senado para jogar por terra 660 DAS, apenas para mostrar ao governo que não estão satisfeitos com a partilha dos postos estratégicos da Petrobrás? Como uma empresa que tem de ter transparência, que deve prestação de contas aos seus acionistas, pode ficar neste balcão? Qual é o preço final da CPMF para a sociedade brasileira, além dos R$ 38 bilhões?

Seria bom se esse fosse um momento de reflexão, aproveitando-se o freio dado pelo Senado – sejam quais forem os motivos deste – para se pensar na marcha da insensatez do Brasil que compromete não apenas o futuro, mas até o tempo presente. Num momento em que a economia consegue a proeza de passar tão bem por uma crise internacional, o país não tem projeto de reformas, e se os tivesse não conseguiria aprová-los a não ser por meio de farta distribuição de cargos, emendas e favores.

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