Ficha técnica
One Single Life
- Plataforma: iPod, iPad e iPhone
- Produtora: Fresh Tone
- Categoria: Plataforma
- Preço: grátis
- Pró: Desafiador
- Contra: Jogabilidade muito simples
A narrativa dos videogames é extremamente nova em comparação com a do cinema, fotografia ou artes plásticas. A pouca idade, tomando como base os anos 70, no entanto, não impede que o meio já tenha seus dogmas bem sedimentados. Uns dos mais explícitos são os gráficos de informações, muito presentes, por exemplo, nas barras de energia dos jogos de luta localizadas nos cantos das telas. Desde Pitfal, no Atari, criou-se um padrão para a utilização de uma camada informativa sobre a história que está sendo contada ou jogada. Outros dogmas são mais abstratos, como o uso da morte (ou da quantidade de vidas) para representar o fim de uma jornada.
A morte é a representação da derrota na maioria das vezes. Poucos jogos se habilitam a discutir estas amarras. Um deles é Limbo, já analisado nesta coluna, que brinca com a morte ao jogar o personagem principal, desde o começo, numa aventura pós-vida. "A morte não é o fim nem o começo. É apenas mais um algoritmo de um ambiente controlado. Uma ideia binária de tentativa e erro. Sim e não. E não é, necessariamente, uma penalidade", descrevi na época. Outra exceção que justifica a regra é a versão de 2008 de Prince of Persia. Os produtores usaram um personagem secundário para livrar o protagonista da morte. Toda vez que o jogador falha e acaba caindo num abismo ou atingido por pedras uma princesa mágica vai de encontro para livrá-lo das agruras fatais.
Os exemplos citados acima também podem gerar um outro tipo de conclusão: o conceito de morte é tão arraigado nos games que o máximo que conseguimos fazer é achar uma metáfora para o "continue". Se apenas se troca o conceito de múltiplas vidas por outras maneiras de dar uma nova chance ao jogar, no fim não se quebrou nenhum paradigma. Apenas se usou um novo artifício. É aqui que entra o jogo a ser analisado nesta semana, One Single Life, disponível para iPhone, iPad e iPod.
Só pelo nome já dá para ter uma boa ideia da proposta dos desenvolvedores: apenas uma vida. Nada mais. O jogo pode ser baixado gratuitamente pela Appstore. Então não é dinheiro que está em jogo. Mas só o fato de a descrição mencionar que o jogador terá apenas uma única chance de chegar ao fim já é o suficiente para deixar os nervos à flor da pele. E não adianta apelar para instalar/desinstalar várias vezes. É apenas uma tentativa por aparelho. A morte representa um fim definitivo e irrevogável. É "game over" sem "continue".
Radical? Muito. Com uma jogabilidade espartana toque na tela para correr e toque mais uma vez para pular, One Single Life é dividido em dez fases. Basicamente se deve saltar de um prédio a outro. Se cair, já era. Não haverá outra oportunidade. O que gera uma tensão acima do normal e torna tudo mais interessante. Para deixar o ambiente ainda mais sádico, a cada salto bem-sucedido o jogador é recepcionado por um tela de estatísticas mórbidas. "Atenção, 22% dos jogadores morrerão nesta fase". Nada muito animador. A única escapatória é treinar antes de tentar a sorte. Segundo o criador Anthony O'Dempsey, somente 4% dos jogadores conseguem chegar ao final. "A razão pela qual eu nunca tive medo de saltar num jogo de aventura foi a de que eu sabia que o pior que poderia acontecer seria ter que começar a fase novamente ou retornar ao último 'checkpoint'", disse em seu blog.
A experiência de se jogar One Single Life é certamente única, mas será que o jogo ganharia tanta notabilidade caso não fosse de graça? Não se pode afirmar o contrário. O grau de ansiedade provavelmente subiria ainda mais com dinheiro em jogo. A estratégia de dar uma única oportunidade certamente é arrojada e já foi aplicada parcialmente em Diablo II, um dos melhores RPGs da história. No nível mais difícil, o personagem criado tinha uma única vida. No caso de morte, meses de desenvolvimento iam por água abaixo. One Single Life não é um grande jogo. A sua principal qualidade é, justamente, trazer uma nova perspectiva para a questão da morte nos games. Não dar uma segunda chance mexe num dos pilares que sustentam a narrativa dos videogames desde os primórdios, escondido em continues, novas fichas nos fliperamas - ou checkpoints. Mesmo assim, o jogo recua ao dar a oportunidade de treino, no qual a mesma fase pode ser jogada inúmeras vezes. Mas radicaliza, no sentido paradigmático, ao travar o aparelho para novas partidas.
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