O Nintendo DS ruma para se tornar o videogame mais popular da história. Ainda longe de chegar ao fim de sua vida útil, já está perto de bater, com 125 milhões de unidades vendidas, a impressionante marca do PlayStation 2 (140 milhões). O que fez o portátil de duas telas ter se tornando um fenômeno cultural? Difícil saber, mas uma combinação de jogos simples, criativos e uma enorme biblioteca apontam para uma resposta. Quem possui o videogame se impressiona, em algum momento, com algum jogo fora de série. Este colunista passou a adorar a plataforma após jogar Ninja Gaiden Dragon Sword. Empacado em uma fase na qual havia apenas uma pessoa deitada e várias paredes que não levavam a lugar nenhum, um grito destemperado com um palavrão ecoou no quarto onde rolava a jogatina. Por um "milagre", o personagem acordou e, assim, a missão pôde ser completada. Genial, não? Quem jogou Nintendogs sabe muito bem o grau de imersão que alguns jogos exigem.Longa introdução para apresentar o game que abriu o ano de 2010 com chave de ouro. De antemão, poderia se esperar algo bom de um novo título da série Zelda. Mas The Legend of Zelda: Spirit Tracks vai além. É um aprimoramento dos jogos anteriores, como Wind Waker e Phantom Hourglass. Uma sequência arrebatadora de boas ideias bem executadas, que deve agradar os jogadores casuais e os mais experientes.
Pela primeira vez a princesa Zelda se torna um personagem ativo na história. Nos anteriores, o objetivo era sempre resgatá-la. Não que ela não seja sequestrada pela milésima vez. Desta vez, porém, deixará o corpo para ajudar o intrépido Link em uma jornada pelo reino de Hyrule. Em forma de espírito, pelo menos. A história mostra Link como um aprendiz de maquinista de trem. No dia da formatura, ele vai até o castelo da princesa para receber seu diploma e se vê metido em mais uma aventura. Um funcionário trai a nobreza, destrói as linhas férreas (principal meio de transporte local) e deixa todas as vilas isoladas. Hora de colocar tudo o que aprendeu na prática.
Este novo ofício do protagonista, que já foi marinheiro e cavaleiro em outros enredos, é um dos pontos altos do jogo. As passagens de fases são feitas a bordo de uma locomotiva, manobrada por Link. O jogador deve escolher o melhor caminho, prestar atenção na linha para não atropelar animais distraídos e evitar colisões contra outros trens. Pode-se escolher as bifurcações, a velocidade e até puxar uma buzina para espantar bovinos que resolveram pastar no lugar errado. Apesar de parecer simples, é divertido comandar o veículo enquanto se dirige para um novo desafio, principalmente quando a rota prevê neve e até passagens aquáticas. A malha férrea cresce conforme se avança no enredo.
Spirit Tracks é recheado de quebra-cabeças inteligentes e inimigos bem bolados. A participação da princesa é fundamental para solucionar grande parte dos desafios. Ela dá dicas de como explorar um mapa e, em alguns casos, pode até possuir inimigos para facilitar a empreitada. Em vários momentos, o jogador precisará controlar os dois personagens ao mesmo tempo, como na fase em que Link precisa escapar do castelo de Zelda. Quase tudo é feito por meio de toques na tela, um dos grandes trunfos do DS. A movimentação, exploração e lutas se dão de forma suave com uma baixíssima curva de aprendizagem. Zelda é uma espécie de jogo que foca mais na usabilidade que na história. Por mais que se tenham legiões de fãs mundo afora, o que importa é o acabamento do produto em termos de jogabilidade. É uma experiência entre jogador e videogame. Como resolver os enigmas com as poucas ferramentas que tenho? Como passar por inimigos gigantescos com apenas um arco? Pouco a pouco o controlador dos personagens vai se desligando cada vez mais da história para curtir a interação. Não importa muito se eu recuperarei o corpo da princesa. O que atrai os jogadores são as montagens de criativos quebra-cabeças ligados por um enredo leve. Por isso não estranhe se encontrar alguém assoprando o Nintendo DS, ele pode estar tocando uma flauta imaginária.