Com o presidente da Chi­­na, Hu Jintao, visitando os Estados Unidos, as histórias sobre a força do crescimento econômico chinês estão por toda parte. E essas histórias são inteiramente verdadei­ras: embora a China ainda seja um país pobre, está crescendo rapidamente e, dado seu tamanho, avança a passos largos para fazer frente aos Estados Unidos como superpotência econômica.

CARREGANDO :)

O que também é verdade, po­­rém, é que a China esbarra numa confusão monetária que só piora a cada mês. Além disso, a resposta do governo chinês a esse problema – uma paralisia nas decisões por deferência a certos interesses, falta de clareza sobre o que pensa e o hábito de culpar os outros – desmente qualquer ideia de que se possa confiar nos líderes da China para agir de forma decisiva e eficaz. Na verdade, os chineses acabaram ficando parecidos, bem, conosco.

Até que ponto as coisas ainda podem piorar? Os alertas de al­­guns analistas de que a China poderia provocar uma crise mun­­dial parecem exagerados. Mas o fato de estarem dizendo coisas do tipo é uma indicação do quanto a situação ficou fora de controle.

Publicidade

A principal causa da confusão na China é sua política de moeda fraca, que alimenta um superávit artificialmente alto. Como já enfatizei outras vezes, essa política prejudica o resto do mundo, aumentando o desemprego em muitos outros países, Estados Unidos inclusive. Mas uma política econômica pode ser ruim para nós sem ser boa para a Chi­­na. Na verdade, a política cambial do país asiático é daquele tipo em que todos saem perdendo: simultaneamente derruba os níveis de emprego aqui e produz superaquecimento e tendência à inflação na própria economia chinesa.

Uma maneira de pensar sobre o que está acontecendo é olhar a inflação como o modo encontrado pelo mercado para reverter a manipulação da moeda. A China tem se valido da moeda fraca para manter seus salários e preços baixos quando convertidos em dólar; as forças de mercado reagiram, empurrando os salários e os preços para cima e mi­­nando essa vantagem competitiva artificial. Algumas estimativas que ouvi sugerem que, com as atuais taxas de inflação, a desvalorização chinesa pode desaparecer em dois ou três anos – não tão logo, mas mais cedo do que muitos esperavam.

Os líderes do país, no entanto, tentam evitar esse desfecho, não apenas para proteger os interesses dos exportadores, mas porque a inflação é ainda mais im­­popular na China do que em ou­­tros lugares. Uma grande ra­­­zão para isso é que lá já vigora, de fato, a repressão financeira dos cidadãos (e outros tipos de re­­pressão também, mas isso não é relevante aqui). As taxas de juros que remuneram depósitos bancários estão limitadas a apenas 2,75%, abaixo da taxa oficial de inflação – e a crença geral é de que o índice real de aumento do custo de vida é substancialmente maior do que o admitido pelo governo.

A rápida subida dos preços, mesmo se acompanhada de aumentos salariais, tornará essa exploração dos cidadãos muito pior. Não é à toa que o povo chinês está irritado com a inflação, e que seus líderes querem detê-la. Mas, seja lá por que motivo – os poderosos interesses dos exportadores, a recusa em fazer qualquer coisa que se pareça com ceder às exigências dos Esta­­dos Unidos, ou a simples incapacidade de pensar com clareza –, os chineses não estão dispostos a atacar as causas do problema, permitindo que sua moeda se valorize. Em vez disso, estão tentando controlar a inflação au­­mentando as taxas de juros e res­­tringindo o crédito.

De um ponto de vista global, é um comportamento destrutivo: com grande parte da economia mundial ainda deprimida, a última coisa de que precisamos é que atores importantes adotem apertos em suas políticas monetárias. Ainda mais porque, do ponto de vista da China, isso não está funcionando. A limitação do crédito se mostra difícil de manter, situação que tende a piorar com a entrada de capital especulativo do exterior.

Publicidade

Como seus esforços para es­­friar a economia não têm funcionado, a China vem tentando conter a inflação com controle de preços – uma política que raramente funciona. A estratégia fracassou miseravelmente, em particular, da última vez que foi tentada aqui, durante a administração Nixon (e, sim, isso significa que agora é a China que visita Nixon).

Então, o que sobra? Bem, a China voltou-se para o jogo da culpa, acusando (sem razão) o Federal Reserve, o banco central americano, de ter criado o problema ao imprimir muito di­­nheiro. Mas, ainda que responsabilizar o Fed possa fazer os líderes chineses se sentirem melhor, isso não vai mudar a política monetária dos EUA, nem vai adiantar alguma coisa quando se trata de domar o monstro da inflação chinesa.

Será que isso tudo pode realmente se transformar numa crise propriamente dita? Se não conhecesse história econômica, acharia a ideia implausível. Afinal, a solução para a trapalhada monetária da China é simples e óbvia: basta valorizar sua moeda, e já. Mas conheço essa história, o que significa que sei o quanto os governos se recusam, às vezes por muitos anos, a fazer o certo e o óbvio – especialmente quando o que está em jogo é o valor da moeda. Normalmente, tentam mantê-la artificialmente forte, em vez de artificialmente fraca; mas a confusão pode ser grande de um jeito ou de outro.

Portanto, nossa mais nova superpotência econômica pode realmente estar na rota de algum tipo de crise econômica, com danos colaterais para o mundo como um todo. Será que precisamos disso?