Se tem uma coisa que abomino num perfil profissional é a preguiça. Afinal de contas, ninguém está isento de sentir uma moleza vez ou outra, mas profissionais que vivem numa eterna preguiça são execrados pelo mercado de trabalho. Foi mais ou menos o que aconteceu com Dionísio. Quem lia o Curriculum Vitae dele, encantava-se com tantos diferencias. Aparentemente era o profissional ideal para assumir qualquer vaga em sua área, logística. Porém, sempre que iniciava em um emprego, em pouco tempo seus colegas e superiores começavam a observar que ele não era tão bom assim quanto parecia.
Ainda não o conhecia quando sua fama rondou meu escritório num processo seletivo do qual ele participou. Durante a sequência de entrevistas ele foi muito bem, só nos deixou com dúvidas em alguns testes comportamentais que apresentaram alterações em seu desempenho. Ele seguiu como terceira opção no processo e quando ligamos para pedir referências sobre seu passado profissional, ouvimos três opiniões semelhantes de diferentes ex-chefes.
O primeiro, Ronaldo, comentou que Dionísio começou muito bem na empresa. Apresentava resultados, fazia suas tarefas muito bem feitas e tinha uma capacidade técnica e intelectual muito grande. Porém, ele percebia que Dionísio demorava mais que seus colegas para apresentar seu trabalho e isso acontecia, normalmente, porque ele deixava para fazer em cima da hora da entrega. Ronaldo contou, inclusive, que chamou Dionísio para uma conversa, acreditando que ele pudesse estar com algum problema que o impedisse de executar suas tarefas em tempo hábil. Percebeu, porém, que não havia absolutamente nada de errado acontecendo e optou por apenas observar um pouco mais de perto o trabalho do rapaz. Foi assim que Ronaldo entendeu que Dionísio apenas procrastinava as coisas. Sempre que podia, optava por se dedicar a coisas mais prazerosas, muitas vezes nem condizentes com seu escopo de trabalho. Foi assim durante um longo ano, até que outros gestores pediram sua demissão, já que nada acontecia para melhorar a situações.
A segunda ligação que fizemos foi para uma ex-colega que trabalhava diretamente com Dionísio. Janaína era seu par numa das empresas por onde ele passou e lamentava tê-lo perdido. Segundo ela, era muito bom trabalhar com o rapaz, pois suas ideias eram excepcionais. Porém, ele tinha um defeito quase irreversível. Sempre que desenvolviam um projeto em conjunto, Dionísio pedia, sem vergonha nenhuma, à moça que ela fizesse as partes mais trabalhosas. E não tinha o que ela contra argumentasse que fosse capaz de fazê-lo entender que ambos deveriam ter responsabilidades e deveres iguais. Para ela, era nítido que o rapaz tinha, simplesmente, preguiça de realizar todos aqueles trabalhos.
Por fim, a ligação que confirmou a impossibilidade de Dionísio permanecer no nosso processo, foi com um ex-subordinado, que agora ocupava um cargo de coordenação. O jovem, aparentemente muito inteligente e capaz, contou, com certa indignação, que na época em que Dionísio foi seu chefe, ele era tão preguiçoso que havia uma quase impossibilidade em trabalhar com ele. Bernardo utilizou exatamente essas palavras para definir o perfil de Dionísio. Disse que ele pedia as coisas mais absurdas, como pegar coisas em seu próprio gaveteiro, que ficava ao lado dele. Contou que muitas vezes precisava do auxílio do seu chefe, mas que quando ia consultá-lo, encontrava-o na cozinha tomando cafezinho, uma prática muito constante.
As três referências foram suficientes para percebemos que as alterações comportamentais que apareceram em seus testes tinham ligações diretas com a disposição. E, numa entrevista decisiva, percebemos que Dionísio, infelizmente, não passava de um preguiçoso. Ele até podia ter várias outras qualidades, mas para desempenhar um trabalho bem feito, é preciso de disposição, coisa que nem de longe ele tinha.
Após alguns meses, conheci Dionísio. Engraçado como que apenas olhando-o já é possível identificar seu jeitão vagaroso. Trocamos algumas palavras e, apesar de perceber sua imensa capacidade, identifiquei um quê de preguiça em cada relato seu. Sem dúvida, havíamos feito uma boa escolha ao excluí-lo do processo. Uma pena, pois se não fosse isso, certamente seria uma um excelente profissional para apresentarmos ao nosso cliente.
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