Certa vez dei uma entrevista sobre a forma ideal de montar um negócio, como escolher o local, a melhor maneira de mobiliar o ambiente etc. Durante essa entrevista, acabei me lembrando de uma situação lamentável, porém, razoavelmente comum. Janete, filha de um querido amigo, havia acabo de se formar. Vinda de família rica e, obviamente, bancada pelo pai, um executivo de renome, Janete montou um escritório assim que recebeu seu diploma. Agora arquiteta, a moça não queria mais ter que se subordinar a ninguém, como nos estágios que frequentou. Guiada pelo seu bom gosto e criatividade, além do pomposo "paitrocínio" que recebeu, em pouco mais de seis meses Janete inaugurava um dos escritórios mais chiques da cidade.
Comprou uma casa de três andares situada num bairro cobiçado pelos ricaços do local. Reformou o espaço de maneira que podia dispor os ambientes a seu modo e seu gosto. No primeiro andar, montou uma espécie de showroom. O mais interessante é que os projetos de seu portfólio eram obras da época de faculdade. Apesar de ter estagiado durante algum tempo em um ateliê, a moça não tinha absolutamente nada assinado por si mesma, além de trabalhos do curso.
No segundo andar, Janete tentou abrir o espaço, quebrando paredes e incluindo portas e janelas capazes de interligar os ambientes de forma clean. Nesse andar, ela instalou baias moderníssimas de trabalho para abrigar seus novos funcionários, na maioria estudantes que buscavam uma oportunidade de estágio. Ao lado da sala maior, a moça montou uma grande e ostensiva sala de reuniões, com uma mesa para dez lugares, telão de mais de 52 polegadas e um aquário com espécies raríssimas de peixe, que dava o toque final àquele ambiente que, ela nem sabia, jamais seria usado, a não ser para comemorar o aniversário de dois ou três funcionários.
O terceiro andar (inteirinho) era o escritório de Janete. Lá ela montou uma pequena cozinha para não ter que descer sempre que quisesse tomar um café. Instalou também uma TV de tela plana, um pouco menor que a da sala de reuniões, mas tão moderna quanto. No fundo da sala, em frente a uma janela realmente muito grande, ficava sua mesa de trabalho, que mais parecia uma obra de arte, tantas eram as firulas da mobília. Sua cadeira possuía o encosto tão alto, que sobrava muita cadeira para pouca Janete.
Pra completar, por toda a empresa era possível encontrar telefones diferentes, plantas ornamentais de espécies raras e quadros de artistas conhecidos. Por fim, para arrematar o local, o ambiente externo era composto por um jardim muito bem cuidado e ornamentado. Na parte de trás da casa, ainda havia um deck e uma piscina que, obviamente, estavam ali apenas para enfeite, pois mesmo que a empresa tivesse prosperado, jamais seriam utilizados.
Como disse, se tivesse prosperado, pois, na verdade, o escritório de Janete não durou nem um ano. O investimento que seu pai fizera foi altíssimo e, em contrapartida, a moça não conseguiu muitos retornos, apesar de ter feito propagandas em massa. Em dez meses de empresa, a moça conseguiu dois ou três pequenos projetos, vindos de parentes que queriam ajudar a impulsionar a carreira de Janete. Os salários de seus estagiários (que ficavam estudando e conversando para passar o tempo) eram pagos por seu pai, pois o que ela conseguiu arrecadar com os projetos, mal dava para sustentar a manutenção da casa.
Quando, enfim, viu que não conseguiria obter muito sucesso, Janete resolveu ter uma conversa séria com seu pai e, juntos, chegaram à conclusão que precisariam tomar uma atitude rápida e certeira para não perder ainda mais dinheiro. O primeiro a fazer foi colocar a casa à venda e alugar um pequeno escritório num bairro mais central. Os móveis, quadros, eletrônicos e demais objetos que poderiam ser descartados, foram vendidos em um bazar que a moça promoveu. Os estagiários foram dispensados, com exceção de uma das moças que ficou para ajudar Janete como recepcionista e secretária.
Aos pouquinhos, a arquiteta conseguiu se fortalecer e criar um nome na cidade. Em meio a idas e vindas, conseguiu criar uma carteira de clientes e depois de um ano e meio já possuía projetos suficientes para manter o escritório e ainda tirar dali o seu sustento. Ela precisou, primeiro, entender que ainda não era hora pra ostentar tanta coisa. E, muito menos, havia necessidade para isso. Com a quantidade de clientes e projetos que tinha, o pequeno escritório que montou já estava de bom tamanho.