Teodoro é comerciante em uma cidade do interior. Desde que foi herdado do pai, seu negócio hoje até com filiais prosperou e cresceu bastante. A história do empresário poderia servir de espelho para muitos brasileiros, pois, de origem humilde, sem estudo formal nem apoio de ninguém, Teodoro conseguiu ser bem-sucedido. Porém o caráter duvidoso e a falta de ética desse senhor fazem dele uma triste realidade da cultura brasileira, em vez de um exemplo positivo.
Teodoro sente-se bem quando leva vantagem sobre os outros. Sua política de "passar a perna" em todos lhe garantiu má fama na comunidade local. Ali, onde acordos ainda são firmados no "fio do bigode", as mercearias mantêm cadernetas para vender fiado e todos se tratam pelo primeiro nome, o empresário é conhecido por dar troco errado aos clientes sempre a menos, claro!
Outras marcas suas são a demora para pagar prestadores de serviço e a mania de recusar-se a arcar com as multas relativas aos atrasos. Além disso, ele vende mercadorias com o prazo de validade próximo de expirar, pois as compra com melhor preço dos produtores o que, todavia, não o faz conceder descontos aos clientes. Teodoro discute sempre sobre tudo, para tudo, pois sua finalidade é tirar vantagem, mesmo no que não é importante. Seu interesse exclusivo é ganhar, mostrar para si mesmo que é mais esperto que qualquer um.
Certa vez, o comerciante foi procurado pela proprietária da escola de inglês, na qual seus filhos estudavam. Na época, ela solicitava que Teodoro sustasse um cheque com o qual ele havia pago o material de escritório adquirido em uma papelaria próxima. O motivo era que o dono da papelaria, com a intenção de quitar a mensalidade dos próprios filhos que estudavam na mesma escola de inglês , havia repassado o cheque de Teodoro para ela. No entanto, ao sair de casa naquela manhã, a mulher, que estava com esse cheque e com o de outro cliente, havia sido roubada. Esse outro cliente, por sua vez, já havia avisado ao banco e refeito o cheque no mesmo valor.
Teodoro, contudo, recusou-se a repetir o gesto, já que não tinha culpa pelo assalto e tinha entregue o cheque à papelaria, não a ela. Na tentativa de contra-argumentar, a proprietária da escola de inglês disse que, de fato, entendia o transtorno causado pelo incidente, mas que, em nome do relacionamento que mantinham, insistiria naquele pedido até porque a medida não traria prejuízo algum ao empresário. Porém, de nada adiantou o apelo: Teodoro foi intransigente e recusou-se a ajudá-la. Enquanto ele via a dona da escola deixar sua sala, pensou com satisfação que era muito esperto e que, mais uma vez, tinha levado vantagem. Chegou a rir baixinho pensando em sua esperteza.
Entretanto, para o infortúnio de Teodoro, o episódio repercutiu pela cidade e foi comentário de todas as rodas de conversa entre vizinhos e compadres. A dona da escola fez questão de informar o maior número de pessoas sobre a falta de cortesia e solidariedade daquele cliente, comprovando a má fama do comerciante.
A partir desse ponto, gradualmente os fregueses deixaram de comprar no estabelecimento de Teodoro, pela antipatia e pelo desprezo que passaram a nutrir por ele. Resultado: as vendas caíram, e ele precisou fechar uma das filiais enquanto remanejava as outras lojas adquirindo menos estoque. Seu crédito no comércio local diminuiu poucos aceitavam que ele pagasse fiado, uma vez que ele nunca tivera esse tipo de tolerância com ninguém.
Os convites sociais também foram rareando e, por conseqüência, o empresário foi ficando cada vez mais recluso, convivendo apenas com a mulher e os dois filhos. Em menos de dois anos, todo seu patrimônio encolheu surpreendentemente, obrigando-o a se desfazer de alguns bens. E ainda: já não conseguia mais negociar com os credores e prestadores de serviço, pois sua lábia, antes infalível, parecia ter desaparecido. Pouco tempo mais tarde, Teodoro sofreu um derrame e morreu no hospital. Ao seu enterro compareceram alguns poucos amigos e um punhado de curiosos, que questionavam se o falecido havia sido, de fato, um homem esperto.
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Nossa sociedade nos ensina, pela mídia e pelas instituições públicas e privadas que um homem vale o que tem. Baseado nessa máxima, o brasileiro busca o crescimento econômico, a aquisição de bens específicos, a presença em determinadas rodas, para que seu status seja valorizado. Com esse objetivo, vale tudo para chegar ao topo da pirâmide social desde vender gato por lebre, enganar no troco da padaria, furar a fila do cinema, falsificar CDs e DVDs ou adquirir cópias piratas, vender produtos sem qualidade e recusar-se a indenizar o consumidor, oferecer um serviço e não entregá-lo no prazo combinado, passar para a frente um automóvel danificado ou um imóvel com problemas sérios sem informar ao comprador, etc.
São tantos os delitos que cometemos que seria impossível descrevê-los em uma só coluna, em um só domingo. Mas, afinal, o que aconteceu para que nós, brasileiros, trocássemos o significado da palavra esperto (perspicaz, inteligente), tornando-a sinônimo de malandro (indolente, gatuno, marginal)? Será que os espertalhões não percebem que, ao final, o que importa para um homem são seu nome e o respeito conquistado por meio de suas ações em vida? Para mim, esperteza de verdade é ser honesto!
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Esta coluna é publicada todos os domingos. O espaço é destinado a empresas que queiram divulgar suas ações na gestão de pessoas e projetos na área social, bem como àquelas que queiram dividir suas experiências profissionais. A publicação é gratuita. As histórias publicadas são baseadas em fatos reais. O autor, no entanto, reserva-se o direito de acrescentar a elas elementos ficcionais com o intuito de enriquecê-las.
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