Ana passou por uma experiência profissional bastante negativa, mas que é comum entre os empresários brasileiros. Ela, após nove anos investindo no próprio negócio, se forçou a declarar falência e fechar as portas. Sua loja de móveis, fruto de muito trabalho e dedicação, não agüentou a concorrência e a falta de movimentação financeira do mercado, sempre instável e imprevisível. Então, sem muita escolha, precisou despedir os oito funcionários que mantinha desde o início do projeto e vendeu o estoque da loja para sanar todas as dívidas (inclusive as tributárias).
Do dia para a noite, a empresária se viu sem trabalho e rendimentos. O que havia conquistado, desde a satisfação pessoal aos ganhos materiais, estava comprometido. Embora se mantivesse atualizada e tivesse construído uma rede de relacionamentos sólida, Ana sempre direcionou sua vida para a gestão de sua empresa. Seu aprendizado era voltado para o negócio: os seminários e cursos que fazia tratavam de empreendedorismo, gestão de pessoas, economia, entre outros assuntos. Tudo era pensado para satisfazer as necessidades inerentes à função de dona de loja de móveis.
Por isso, ela sabia muito a respeito de seu mercado e participava de todas as feiras do setor. Seus contatos diários eram mantidos, exclusivamente, com fornecedores e com clientes. As revistas que assinava, bem como os programas que acompanhava na televisão, abordavam temas referentes a seu negócio.
Ana gostava de seu trabalho. Desde pequena sentia atração por mobiliário e comércio eis por que não hesitou em investir em uma loja de móveis assim que conseguiu reunir dinheiro suficiente para o empreendimento. Agora, Ana estava sem perspectiva ou segurança. Mas, após um período de depressão, a empresária foi chamada à realidade e percebeu que precisaria agir logo, pois suas reservas financeiras estavam acabando.
Optou, assim, por escrever todas as suas alternativas, para aí definir sua retomada profissional. A primeira idéia foi um novo negócio. Mas com uma análise mais detalhada de suas dívidas e poupança, percebeu que seria impossível cultivar outra empresa. Ela também não poderia fazer um empréstimo, porque as dívidas adquiridas dificultavam o crédito em instituições financeiras.
A segunda idéia foi mais viável: trabalhar como gerente em uma loja concorrente. Para isso, Ana tinha a seu favor a experiência no ramo de móveis e a desenvoltura no atendimento ao público. Decidida, ela preparou seu currículo e elencou as empresas para as quais gostaria de trabalhar. Porém, logo após as primeiras entrevistas, Ana sentiu que seria complicado voltar ao mercado por essa via. O salário oferecido era muito inferior ao adquirido com seu próprio negócio, sem mencionar que ela precisaria cumprir uma carga horária rígida, algo bem diferente de sua antiga rotina.
Mesmo tendo sido chamada por duas lojas e precisando do salário, Ana recusou a oferta das vagas e descartou a hipótese de ser empregada de alguém. A solução foi emprestar dinheiro de uma amiga muito próxima enquanto pensava em saídas para sua carreira. No entanto, após alguns meses sem planejar nada e sem gostar do que lhe era ofertado, Ana começou a se desesperar, pois a quantia cedida pela amiga estava chegando ao fim. Ela sabia que precisaria achar algo rápido, mas se recusava a retroceder, voltar ao estágio da juventude, quando trabalhava para outras empresas e dependia do salário fixo mensal.
Ana, agora, sentia que estava em outro patamar, que sua essência estava mudada para sempre. Uma vez dona do próprio negócio, independente financeiramente e livre para organizar seus horários, ela jamais conseguiria se adaptar à rotina do funcionário padrão. Além disso, os cargos que ela almejava eram impossíveis de conquistar, visto que não tinha todos os diplomas necessários, nem mesmo o conhecimento em idiomas exigido pelas grandes empresas.
Desanimada, Ana pediu ajuda para a irmã, que lhe cedeu outra quantia em dinheiro. Todavia, a ex-empresária ainda hoje não decidiu o que fazer e já está pensando em quem se apoiar quando o valor emprestado por sua irmã acabar.
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A realidade da falta de trabalho afeta profundamente o indivíduo (esteja este acostumado a ser funcionário ou empresário), sobretudo aquele que experimentou um certo conforto e segurança na carreira; que, em algum momento da vida, gozou de bons cargos e rendimentos. Essas pessoas têm maior dificuldade para se adaptar a realidades mais difíceis, pois valorizam sua história de vida e os conhecimentos adquiridos.
E não deveria ser diferente, já que um profissional que consegue, a custo de muito esforço e competência, chegar a um certo patamar jamais deveria ter que se submeter a funções com menos desafios, valorização inferior e remuneração precária. Contudo, infelizmente a realidade brasileira nos obriga a buscar adaptação e humildade. Assim, de nada adianta usar "salto alto" perante as dificuldades impostas. O profissional de sucesso sabe que começar de novo, quantas vezes for necessário, faz parte do processo e não deprecia o seu valor real.
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Esta coluna é publicada todos os domingos. O espaço é destinado a empresas que queiram divulgar suas ações na gestão de pessoas e projetos na área social, bem como àquelas que queiram dividir suas experiências profissionais. A publicação é gratuita. As histórias publicadas são baseadas em fatos reais. O autor, no entanto, reserva-se o direito de acrescentar a elas elementos ficcionais com o intuito de enriquecê-las. Contato: coluna@debernt.com.br, ou (41) 3352-0110. Currículos: cv@debernt.com.br