O mercado brasileiro ficou pequeno para a indústria automotiva nacional. Os bilhões de reais investidos nos últimos anos em novas fábricas e ampliações elevaram a capacidade de produção, mas a demanda encolheu – e continua encolhendo – a uma velocidade assombrosa.
Estima-se que as 33 fábricas de carros, caminhões e ônibus em operação no país sejam capazes de produzir 5,1 milhões de veículos por ano, mas hoje elas fazem cerca de 2,6 milhões. O setor, portanto, ocupa pouco mais da metade da capacidade instalada, muito abaixo dos índices de utilização considerados “saudáveis”, de algo entre 80% e 85%.
Há casos extremos. A fábrica da DAF em Ponta Grossa, nos Campos Gerais, pode produzir até 10 mil caminhões por ano, mas não entregará muito mais que 500 em 2015. A chinesa Chery deve produzir menos de 5 mil carros, ante uma capacidade de 50 mil em sua planta de Jacareí (SP), acionada em fevereiro. Outra situação emblemática é a da Honda. Mesmo com vendas em alta, a montadora decidiu que só vai inaugurar sua segunda fábrica, que está pronta em Itirapina (SP), quando o cenário melhorar.
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Em seu auge, o mercado brasileiro comprou mais de 3,8 milhões de veículos leves e pesados. Nos últimos 12 meses, não passou de 2,8 milhões. Uma solução seria ganhar terreno lá fora. A indústria até está exportando mais, mas os embarques devem ficar perto de 400 mil unidades neste ano, volume incapaz de compensar a retração doméstica.
O ajuste começou pelos quadros de pessoal, dois anos atrás. Desde o fim de 2013, as montadoras demitiram 18 mil pessoas, mas o corte ainda parece insuficiente. Tanto que, dos 117 mil empregados no setor ao fim de outubro, 45 mil estavam afastados – pelo Programa de Proteção ao Emprego (PPE), com contratos suspensos no regime de layoff ou em férias coletivas.
Sem melhoras no horizonte, as montadoras podem tomar decisões drásticas, como fechar fábricas. “O maior desafio que eu vejo é para as grandes montadoras, instaladas no país há muito tempo e que tem muita capacidade ociosa espalhada por várias fábricas”, diz Martin Bodewig, diretor da consultoria Roland Berger. “As empresas deixaram de pensar só em cortar custos operacionais e já pensam em como reduzir custos estruturais, o que significa inclusive reduzir o número de plantas.”
O último dado oficial da Anfavea (associação das montadoras) indica que em 2012, quando a demanda doméstica atingiu seu pico, as empresas do setor podiam produzir anualmente até 4,5 milhões de carros, caminhões e ônibus. Na época, o país tinha 27 unidades industriais em funcionamento. De lá para cá, enquanto o mercado se retraía, seis fábricas entraram em operação e várias foram ampliadas. Outras ainda estão em construção.
Muitas novatas no país, como Chery e BMW, se instalaram aqui para poder se enquadrar no programa governamental Inovar-Auto. Para o consultor Raphael Galante, da Oikonomia, também houve otimismo em excesso. “Tinha gente esperando para logo um mercado de 5 milhões de unidades, uma visão baseada em projeções extremamente favoráveis, e irreais.”
Se tudo der certo, mercado reage em 2017, diz consultoria
As vendas de automóveis e comerciais leves, em queda pelo terceiro ano consecutivo, recuaram 23% até outubro. Na avaliação de quem acompanha o setor, dificilmente 2016 será melhor. “Vemos no próximo ano um mercado um pouco pior que 2015. O mais cedo que podemos imaginar para uma recuperação seria muito no fim de 2016, mais para 2017, caso a economia resolva seus problemas, o que está muito relacionado ao âmbito político”, diz Martin Bodewig, diretor da Roland Berger.
Mesmo que o mercado melhore no ritmo esperado, a consultoria projeta que as vendas de veículos leves chegarão a 2,8 milhões de unidades em 2018, pouco acima das registradas em 2008.