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Com menor demanda por crédito, bancos aumentam taxas para gerar receita

As receitas com tarifas subiram 14,1% entre 2014 e 2015, considerando os cinco maiores bancos do país, de R$ 26,1 bilhões para R$ 29,8 bilhões | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
As receitas com tarifas subiram 14,1% entre 2014 e 2015, considerando os cinco maiores bancos do país, de R$ 26,1 bilhões para R$ 29,8 bilhões (Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo)

Mais restritivos na oferta de crédito e com menos clientes interessados em tomar empréstimos, os bancos passaram a buscar outras fontes além da intermediação financeira para aumentar suas receitas. Uma das estratégias para elevar ganhos tem sido turbinar o faturamento com tarifas, apontam analistas. Para os clientes, isso significa condições mais rígidas, com menos isenções de taxas e desembolso maior pelos serviços.

O aperto é uma forma de diminuir os efeitos da recessão sobre o setor. Com a taxa básica Selic estacionada em 14,25% ao ano há sete meses, ficou difícil aumentar ainda mais os juros nos financiamentos. Ao mesmo tempo, o consumidor está menos disposto a se endividar. Segundo pesquisa da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), 82% dos brasileiros não têm planos de contratar empréstimos.

Nas redes sociais aparecem cada vez mais reclamações sobre reajuste de tarifas bancárias sem explicação. Matheus Pereira, que trabalha com marketing digital, conta que abriu sua conta no Itaú em fevereiro, numa agência de Caldas Novas, em Goiás. Semanas depois, recebeu um SMS do banco dizendo que a tarifa de sua conta estava sendo reajustada em cerca de 10%. A tarifa de manutenção da conta saltou de R$ 26 mensais para R$ 28.

“Até agora, o banco não conseguiu me explicar o motivo deste aumento”, afirmou Pereira.

Procurado, o Itaú informou que “os reajustes de tarifas efetuados estão compatíveis com os índices praticados pelo mercado financeiro”. Sobre o reajuste ter ocorrido duas semanas após a abertura da conta, não se pronunciou.

Em alguns casos, quem já tinha direito a isenção de tarifas está sendo obrigado a oferecer mais contrapartidas ao banco para manter o benefício. Um cliente que não quis se identificar conta que, às vésperas da renovação do contrato de seu cartão de crédito, o banco informou que, para manter a isenção da anuidade, teria que aumentar o valor de suas aplicações, de R$ 100 mil para R$ 150 mil. A razão, disse o gerente, foi “a mudança de target (alvo) para concessão do benefício”.

“Os bancos acabam criando mais dificuldades para os clientes ficarem fora da faixa de benefícios, especialmente nesta época em que a concessão e a busca por crédito estão mais fracos”, diz Ione Amorim, do Instituto Brasileiros de Defesa do Consumidor (Idec).

Receitas

Levantamento feito pela agência de classificação de risco Austin Rating mostra que as receitas com tarifas subiram 14,1% entre 2014 e 2015, considerando os cinco maiores bancos do país, de R$ 26,1 bilhões para R$ 29,8 bilhões.

Já os dados do Banco Central (BC) mostram que a concessão de crédito está encolhendo. Os chamados recursos livres, que consideram todas as linhas de financiamento ao consumo, encolheram 3,5% entre 2014 e 2015. Este ano, ainda segundo o BC, as novas concessões de crédito já recuaram 5,3%.

“Há realmente uma tentativa de aumentar a receita com tarifas. É uma maneira de compensar parte da queda no volume de empréstimos, diversificando a carteira”, explica Luis Miguel Santacreu, analista da Austin Rating.

O forte aumento de 44,6% das provisões contra inadimplência — de R$ 71,4 bilhões em 2014 para R$ 103,2 bilhões em 2015 — é outro fator que, além de demonstrar que o risco de inadimplência aumentou, afeta o lucro dos bancos.

Há casos de cobrança de tarifas mesmo para quem é isento por determinação do BC. A estudante carioca Carolina Pedro Lazari vem brigando com o Bradesco para ter isenção da tarifa de manutenção, que não pode ser cobrada em conta-salário. Ela abriu a conta em novembro, quando foi contratada como estagiária. Na ocasião, o gerente confirmou que ela estava isenta de tarifa, mas, para sua surpresa, semanas depois houve uma primeira cobrança de R$ 17,25, o que contraria determinação do BC.

“Fui à agência reclamar da cobrança, pedir o estorno e o cancelamento de próximos débitos. Cheguei a assinar um documento atestando o cancelamento”, contou.

Um mês depois, porém, houve outro débito e, este mês, o banco reajustou a tarifa para R$ 18,25. Procurado na semana passada, o Bradesco informou ter entrado em contato com a cliente e resolvido o problema. Carolina confirmou o contato do banco. Mas a instituição não explicou por que cobrara a tarifa numa conta-salário. Em nota, o banco disse que “é opção do cliente permanecer no segmento que está ou migrar para o segmento que foi proposto pelo banco”.

Falta de transparência

Maria Inês Dolci, coordenadora da Proteste, associação de defesa do consumidor, afirma que os bancos são pouco transparentes em informar que critérios estão utilizando para cobrar tarifas, como mostra o caso de Carolina.

“Os bancos tomam as decisões unilateralmente para aumentar suas receitas, e o cliente acaba sendo prejudicado”, afirma Dolci.

Inês, do Idec, afirma que os bancos se aproveitam da falta de atenção de muitos consumidores no acompanhamento das tarifas para reajustar ou cobrar valores indevidos. Como geralmente não pedem cópia do termo de adesão ao pacote de serviços, os clientes ficam de mãos atadas para questionar os valores cobrados.

Analista da consultoria Lopes Filho, João Augusto Salles, especialista em bancos, diz que as instituições financeiras também têm buscado reforçar receitas vendendo produtos, como seguro de vida, ou até mesmo estimulando o uso do rotativo do cartão de crédito, que tem juros de 430% ao ano, aumentando os limites dos clientes.

Às vezes, essa oferta de produtos vem de uma forma casada com outro serviço, o que é proibido pelo Código de Defesa do Consumidor. O aposentado Francisco Marinho, de 63 anos, afirma que fez um empréstimo no Banco do Brasil, no ano passado, e que também foi oferecido um seguro de vida no valor de R$ 1.000. Embora garanta que não tenha assinado qualquer documento aceitando o seguro, o valor foi debitado de sua conta.

Procurado, o Banco do Brasil informou que o débito foi feito em julho do ano passado e tem proposta assinada pelo cliente. Depois dessa data, diz o banco, nenhum desconto de seguro foi feito na conta do aposentado.

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