São Paulo Uma vaca européia ganha, em média, US$ 75 por mês em subsídios governamentais. Se o valor fosse encarado como um salário, isso significaria que o rebanho bovino do Velho Continente ganha mais do que 50% da humanidade ou 3,3 bilhões de pessoas que, segundo o último levantamento do Banco Mundial (Bird), recebem menos de US$ 2 por dia de trabalho. Ativistas ao redor do mundo costumam lançar mão desse fato ao defender um comércio internacional mais justo. A consultora em política comercial, Katherine Daniels, não agiu diferente: "Os negócios entre os países têm um grande potencial de diminuir a pobreza global, mas ele, por si só, não está correspondendo a todas as expectativas", disse ela, após participar da conferência "Um passo além da OMC", organizada pelo Instituto do Direito e do Comércio Internacional e Desenvolvimento (IDCID), e que reuniu especialistas em relações internacionais há poucos dias em São Paulo.
Desenvolvimento
O conceito baseia-se na idéia de que é possível promover o desenvolvimento social a partir do intercâmbio de produtos entre os países desde que nações mais desenvolvidas se disponham a abrir mão de certos protecionismos (como as barreiras tarifárias e os próprios subsídios agrícolas). Os que defendem essa idéia vêm ganhando cada vez mais voz pois agradam tanto aos liberais, com seu discurso em prol do livre-comércio, quanto àqueles que vêem nas multinacionais e nos países ricos um caráter opressor. "A campanha do comércio justo não prega o fim da globalização nem nada parecido", diz Katherine, que trabalha para a Oxfam International, organização não-governamental que fornece ajuda a comunidades carentes em 100 países. Se há uma posiçãos de centro-esquerda no espectro da política internacional, a turma do comércio justo (ou do "fair trade", como preferem os acadêmicos) parece estar nela.
Mas, se essa teoria é sedutora, os avanços concretos promovidos pelo "fair trade" ainda são muito pontuais. De acordo com a assessora econômica da missão permanente do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC) em Genebra, Vera Thorstensen, ele corresponde a 0,01% dos fluxos globais de comércio. Os números mais otimistas apontam para US$ 1,2 bilhão em produtos vindos de fabricantes que promovem o "fair trade". "As certificações de fair trade são interessantes, mas podem ser encaradas como mera estratégia de atração de compradores. Essa prática não conseguiu até agora grandes mercados, pois se utiliza de processos mais caros que os tradicionais", completa o conselheiro-sênior do Banco Mundial, Carlos Alberto Primo Braga.
Transformação
É por esse motivo que o conceito clássico (de criar regras solidárias nas transações comerciais) parece estar mudando. No encontro, ficou claro que os palestrantes têm hoje um entendimento mais amplo dele. A própria quebra de barreiras tarifárias, por exemplo, passou a ser considerada um passo em direção à "justiça comercial". O diretor do Centro de Estudos Brasileiros da Universidade Colúmbia, nos Estados Unidos, Albert Fishlow, aponta a própria rodada de Doha (negociação, iniciada em 2001, entre integrantes da OMC para diminuir barreiras comerciais) como exemplo de preocupação com um comércio justo. "O desenvolvimento social está no núcleo da rodada de Doha", completa Primo Braga, do Bird.
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