Em uma sessão tumultuada e que durou mais de 13 horas, a comissão especial da proposta de emenda à Constituição (PEC) 32 na Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (23) o substitutivo do relator Arthur Maia (DEM-BA) da reforma administrativa. Com placar de 28 votos favoráveis e 18 contrários no colegiado, a matéria segue agora para votação no plenário da Casa em dois turnos. Se aprovada, passa à fase de tramitação no Senado.
Além do texto-base, a comissão analisou 20 destaques, dos quais apenas um, apresentado pelo bloco formado por PROS, PSC e PTB, foi aprovado, dando status de polícia às guardas municipais.
Com previsão de novas regras para servidores públicos, a PEC é alvo de críticas por setores ligados ao funcionalismo desde que foi enviada pelo governo à Câmara, em setembro do ano passado. De lá para cá, passou por diversas alterações desde a fase de análise pela Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC). Na comissão especial, a negociação em torno de mudanças que agradassem à pressão de diversos segmentos e bancadas levaram a sucessivos adiamentos da votação do texto.
Somente entre quarta (22) e esta quinta-feira, foram apresentadas três diferentes versões do substitutivo, a última poucos minutos antes da sessão de votação, iniciada às 11h10.
As bancadas de PT, PDT, PSB, PSOL, PCdoB, Solidariedade, PV e Rede fecharam questão contra a reforma já na terça-feira (21). Nesta quinta, representantes do funcionalismo protestaram em frente ao anexo da Câmara onde ocorria a reunião. Parlamentares da oposição tentaram retirar a matéria de pauta e adiar a votação por cinco sessões, mas acabaram vencidos.
A intenção do presidente da comissão, Fernando Monteiro (PP-PE), era concluir a votação do texto-base ainda na noite de quarta-feira, mas uma confusão durante um período em que a sessão estava suspensa acabou levando ao seu encerramento.
Diante da possibilidade de rejeição ao texto, blocos favoráveis à reforma administrativa substituíram oito membros na comissão. A apreensão por parte da base do governo surgiu após um placar apertado, com diferença de apenas três votos, na votação de um pedido de retirada de pauta da matéria na sessão de quarta-feira.
As principais divergências dizem respeito à criação do vínculo temporário para o serviço público e ao artigo 37-A, que prevê a possibilidade de União, estados e municípios firmarem instrumentos de cooperação com órgãos e entidades privadas para a execução de serviços públicos.
Outros pontos criticados foram a possibilidade de redução de jornada com diminuição proporcional de salário de servidores em até 25% em situação de crise fiscal, e a inclusão da possibilidade de contratos temporários mesmo para carreiras exclusivas de estado, “cujas atribuições sejam complementares, acessórias, de suporte ou de apoio”.
Também gerou controvérsia a inclusão de artigo que autoriza que seja regulamentado, por medida provisória, normas sobre “criação e extinção de cargos públicos, concurso público, critérios de seleção e requisitos para investidura em cargos em comissão, estruturação de carreiras, política remuneratória, concessão de benefícios, gestão de desempenho, regime disciplinar, processo disciplinar, cessão e requisição de pessoal”.
Vários desses pontos foram incluídos de última hora no parecer. Maia chegou a acenar aos blocos de esquerda, reduzindo o prazo máximo para os contratos por tempo determinado para seis anos em uma versão do relatório protocolada na tarde de quarta-feira (22), mas, à noite, durante a sessão de discussão do substitutivo protocolou novo parecer, retomando a redação original do dispositivo, gerando protestos por parte de oposicionistas.
A possibilidade de parcerias com entidades privadas também havia sido retirada, mas retornou ao texto. Já as prerrogativas de regulamentação pelo Executivo não estavam no texto até a versão anterior.
No plenário da Câmara, a proposta precisará de ao menos três quintos, ou 308 votos, nos dois turnos de votação, para ser aprovada.
O que prevê o substitutivo da reforma administrativa aprovado
A versão da PEC que acabou aprovada e será votada em plenário prevê a manutenção da estabilidade para todos os servidores de carreira, ao contrário do que queria o governo. Na proposta original, apenas carreiras específicas manteriam o direito.
Por outro lado, o texto cria o vínculo de contrato temporário. Nessa modalidade, o ingresso é feito por meio de seleção simplificada, sem concurso público, e o funcionário permanece na função por um prazo determinado, de até 10 anos, sem possibilidade de recontratação. O novo vínculo, no entanto, só poderá ser utilizado “com o intuito de suprir lacunas excepcionais e transitórias, que atrapalhem o funcionamento da máquina pública”, segundo o texto.
Qualquer cargo poderá ser ocupado por servidor temporário, com exceção daqueles pertencentes às chamadas carreiras exclusivas de estado. Entram nessa classificação os cargos que “exerçam diretamente atividades finalísticas afetas à segurança pública, à manutenção da ordem tributária e financeira, à regulação, à fiscalização, à gestão governamental, à elaboração orçamentária, ao controle, à inteligência de Estado, ao serviço exterior brasileiro, à advocacia pública, à defensoria pública e à atuação institucional do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, incluídas as exercidas pelos oficiais de justiça, e do Ministério Público.”
Além de policiais civis, federais e rodoviários, Maia definiu como cargos afetos à segurança pública peritos criminais, policiais legislativos, guardas municipais, agentes de trânsito e agentes socioeducativos.
Por outro lado, aquelas funções cujas atribuições sejam consideradas complementares, acessórias, de suporte ou de apoio, não estariam cobertas pelo dispositivo.
O texto da reforma administrativa também cria diretrizes para a avaliação de desempenho dos servidores, que a reforma administrativa enviada pelo Executivo deixava para ser regulamentada em lei complementar posterior. Entre os pressupostos que podem ser incluídos na Constituição estão a utilização de plataforma digital para o procedimento e com participação do usuário do serviço público.
Um desempenho considerado insatisfatório pode levar à demissão do servidor, o que hoje só pode ocorrer por decisão judicial transitada em julgado ou por processo administrativo disciplinar. Para isso seriam necessárias duas avaliações negativas consecutivas ou três intercaladas em um período de cinco anos. A partir daí, será aberto um processo administrativo para apurar a responsabilidade do servidor, abrindo caminho para o desligamento.
Entre as novas regras está prevista ainda a extinção de uma série de vantagens para servidores, como férias superiores a 30 dias, licença-prêmio, progressão ou promoção baseadas exclusivamente em tempo de serviço e aposentadoria compulsória como modalidade de punição.
A mudança, no entanto, é limitada: atinge apenas novos servidores e não alcança membros do Judiciário e do Ministério Público. As categorias chegaram a ser incluídas em uma versão anterior do relatório, mas acabaram retiradas novamente. O relator, no entanto, deixou aberta possibilidade de apresentação de emendas para retomar a medida em plenário e disse que, na ocasião, votará favoravelmente.
O texto também traz uma benefícios para carreiras policiais, como integralidade e paridade nas aposentadorias e aumento da pensão por morte para dependentes. Outros direitos que estavam previstos, como foro privilegiado para o delegado-geral da Polícia Federal e para os delegados-gerais de policias civis, foram retirados da versão final do texto.
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