Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Preços em alta

Dois motivos para a alta nas commodities. E dois efeitos no Brasil: um bom e um ruim

commodities
Complexo de mineração da Vale em Canaã dos Carajás, no sudeste do Pará: demanda aquecida e busca por rendimentos jogou para cima os preços de commodities como o minério de ferro. (Foto: Ricardo Teles/Agência Vale)

Ouça este conteúdo

A forte alta no preço das commodities minerais e agrícolas nos últimos meses tem duas razões principais. E dois efeitos importantes sobre o Brasil – um positivo e um negativo.

Nesta segunda-feira (24), a China assustou os mercados ao avisar que vai "punir severamente" monopólios de commodities (leia mais abaixo), o que levou o minério de ferro ao menor preço em 20 dias.

Ainda assim, as cotações seguem muito acima dos patamares do ano passado. E os impactos dessa valorização nos mercados globais e no Brasil, um dos principais produtores de commodities do mundo, que já são bem visíveis, tendem a persistir por algum tempo.

Motivo 1: demanda aquecida no mundo

Uma série de fatores explica a continuidade da alta nos preços das commodities. Um dos motivos, segundo analistas do Banco Fibra, é que as duas maiores economias do mundo – Estados Unidos e China – deverão registrar, simultaneamente, pela primeira vez na história recente, taxas de crescimento superior a 7%. Os dois países representam 40% da economia global.

Patrícia Krause, economista para a América Latina da Coface, afirma que os estímulos fiscais e monetários concedidos por algumas das principais economias globais estão contribuindo para manter a demanda aquecida.

Outro fator que está contribuindo para a aceleração da demanda nas maiores economias do mundo é a ampliação na escala de vacinação. “Isto contribui para o aquecimento da demanda”, diz o economista da Siegen. Ele lembra que muitas empresas estavam sem estoques.

Do lado dos minerais há uma forte procura por parte da China e de outras grandes economias. No país asiático, a produção de aço cresceu 16% no primeiro quadrimestre do ano, comparativamente a igual período de 2020.

No caso do minério de ferro – que no início do mês chegou a estar cotado, pela primeira vez, a mais de US$ 200 por tonelada –, há a suspensão do acordo comercial entre a China e a Austrália, maior produtor mundial e principal fornecedor da segunda maior economia mundial.

As exportações brasileiras de minério de ferro cresceram 16% no comparativo entre os quatro primeiros meses de 2020 e 2021, segundo dados compilados pela XP Investimentos.

A demanda aquecida também contribui para a alta nos preços das commodities agrícolas. Não bastasse isso, o rebanho suíno da China está em expansão, após uma epidemia de peste suína africana. “A procura por ração está em alta no país e a soja é um importante insumo”, afirma a economista da Coface.

Ela aponta que há um cenário otimista para as exportações brasileiras impulsionada pela safra maior – que deve crescer 5,7%, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) – e pela recuperação dos preços dos minerais.

Segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), as exportações do agronegócio aumentaram 39% em abril, comparativamente ao mesmo mês do ano anterior. O destaque, de acordo com analistas do Itaú BBA, são os preços obtidos em dólares para o suco de laranja (+143%), açúcar (+110%), couros (+68%) e dos produtos integrantes do complexo soja, que variaram entre 22%, para a soja em grão, e 58%, para o óleo de soja.

O que também pode beneficiar o Brasil é o estabelecimento de restrições à exportação de carne por parte da Argentina, depois que os preços no mercado doméstico aumentaram mais de 60% nas últimas semanas.

A KPMG ressalta que o cenário é de contínuo crescimento de produção e renda na agropecuária em 2021, em um contexto de safras recordes e preços elevados para os grãos e forte demanda de exportação. Riscos climáticos ainda estão presentes, com preocupações com potenciais impactos do La Niña nas lavouras.

Motivo 2: busca por melhores rendimentos

Segundo o Banco Fibra, a expansão monetária dos principais bancos centrais por meio de instrumentos de política monetária não convencionais tem contribuído para a injeção de trilhões de dólares na economia global. O resultado é que há uma pressão para baixo nas taxas de juro.

“Tais recursos 'procuram' remuneração alternativa às taxas de juros reais negativas das economias centrais e as encontram em ativos reais como as commodities”, apontam os economistas do banco.

No ano, o cobre acumula uma alta de 29,08% em dólares. O petróleo do tipo brent, 27,22%; o café, 18,89% e o milho, 36,18%.

Este cenário já desperta a atenção da China. A Comissão da Reforma e Desenvolvimento (NDRC, na sigla em inglês) informou que irá "punir severamente" monopólios de commodities. Ela atribui a recente alta nos preços à "especulação excessiva."

Com a declaração das autoridades chinesas, os contratos futuros de minério de ferro caíram 6,5% na bolsa de Dalian na madrugada de segunda-feira (24).

O efeito positivo: impulso no PIB

O lado bom da forte alta das commodities é que o fenômeno está ajudando a impulsionar a economia brasileira. Nas últimas cinco semanas, o ponto médio (mediana) das projeções de expansão para o PIB passou de 3,04% para 3,52%, segundo o relatório Focus, uma pesquisa feita semanalmente pelo BC junto a instituições financeiras.

Projeções mais otimistas indicam taxas superiores a 4%, o que poderia contribuir para recuperar as perdas registradas em 2020. Mas as expectativas são de crescimento menor do que a média mundial. O Fundo Monetário Internacional espera uma expansão de 6% para o PIB global.

O impacto mais evidente da valorização das commodities é sobre as exportações brasileiras. Economistas do Bradesco projetam que elas alcançarão US$ 258,2 bilhões em 2021, um crescimento de 22,5% em comparação ao ano anterior. Com isso, o saldo na balança comercial subiria para US$ 66,4 bilhões – um recorde nos últimos cinco anos.

Fábio Astrauskas, economista e CEO da Siegen Consultoria, aponta que a expansão nas cotações das matérias-primas está exercendo um poderoso efeito, principalmente sobre o dólar: “Está ajudando a amortecer os efeitos das instabilidades políticas e dos problemas fiscais.” E a aprovação da MP da privatização da Eletrobras na Câmara, na quarta-feira (19), também contribui para a valorização do real frente à moeda americana.

O efeito negativo: aumento na inflação

Se, por um lado, há expectativas favoráveis com o crescimento das exportações e uma tendência à valorização do real, por causa da maior entrada de dólares, o aumento nas commodities embute o risco de aumento na inflação. Nos 12 meses encerrados em abril, o IPCA, o índice oficial, fechou em 6,76%, bem acima do teto da meta, que é de 5,25%.

“É difícil precisar até quando teremos esse efeito negativo. Acredito que, pelo menos, até setembro, haja uma aceleração nos preços”, diz Patrícia. Segundo ela, como as commodities agrícolas estão ficando mais caras, isto tem um impacto social grande.

A demanda aquecida está favorecendo o repasse do preço dos metais ao consumidor. Segundo a Fundação Getulio Vargas (FGV), nos 12 meses concluídos em abril, as matérias-primas brutas tiveram um incremento de 66,58% em seu preço médio.

Astrauskas avalia que a pressão inflacionária vai continuar no mundo todo ao longo do resto do ano. E deve se estender até o primeiro semestre de 2022.

Isto deve favorecer, no Brasil, novas altas na taxa Selic, o juro que baliza a economia. Atualmente ela está em 3,5% ao ano. Projeções divulgadas no relatório Focus sinalizam que ela pode encerrar o ano a 5,5%, um quarto de ponto percentual a mais do que o que se esperava na segunda quinzena de abril. “O BC está focado no combate à inflação”, diz o economista.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.