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A proposta de reforma tributária da Câmara dos Deputados (PEC 45/2019) tem potencial para elevar o Produto Interno Bruto (PIB) de 4,1% a 20% e os investimentos de 16,4% a 25% nos próximos 15 anos.
Os dados fazem parte de estudo elaborado pelos economistas Edson Domingues e Debora Freire Cardoso, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com consultoria de Samuel Pessôa e Bráulio Borges, a pedido do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), do tributarista Bernard Appy, mentor da PEC 45.
O estudo calcula os impactos da proposta em três diferentes cenários. O cenário base não considera eventual aumento de produtividade com a implementação da reforma e leva em conta apenas os efeitos da redução da cumulatividade e da uniformização da alíquota incidente no consumo.
Os outros dois cenários são o conservador e o otimista. O conservador considera, além dos aspectos da simulação base, metade dos demais efeitos positivos sobre a produtividade. O otimista, por sua vez, leva em conta todos os efeitos positivos sobre a produtividade que a reforma pode trazer.
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PIB e investimentos
No cenário base, o PIB cresceria 4,1% em 15 anos e os investimentos, 16,4%. Na simulação conservadora, a economia avançaria 12% e os investimentos, 20,3%. No cenário mais otimista de todos, o PIB teria uma variação positiva de 20% e os investimentos, 25%.
Segundo Appy, o principal motivo para a reforma é seu impacto sobre o crescimento econômico em longo prazo. Ainda assim, será possível ter ganhos de curto prazo. “Ganho é de longo prazo, mas no curto prazo há efeito positivo via expectativas e juros de longo prazo”, resumiu em audiência pública virtual da comissão mista do Congresso que analisa as propostas de reforma tributária. Além da PEC 45, estão em tramitação a PEC 110/2019, do Senado, e o PL 3887/2020, de autoria do governo.
O tributarista atribui o efeito positivo da reforma a vários fatores, entre eles:
- redução do custo de conformidade e do contencioso;
- redução dos custos dos investimentos e exportações, que decorrem da cumulatividade do sistema tributário atual;
- organização mais eficiente da economia; e
- maior transparência e redução das tensões federativas.
“O sistema tributário atual faz a economia se organizar de forma extremamente ineficiente, porque, ao invés de as economias, de as empresas se organizarem da forma em que elas são as mais eficientes do ponto de vista econômico, produzindo o máximo possível com um mínimo de trabalho e capital, elas se organizam para ter o melhor benefício tributário. E isso tem um impacto muito negativo sobre o crescimento da economia”, diz Appy.
Ele completa que, em todos os cenários analisados no estudo, todas as variáveis macroeconômicas (importações, exportações, trabalho, consumo da família) crescem (veja infográfico no fim do texto).
“Investimento no cenário base cresce muito, porque é o mais prejudicado pela cumulatividade do sistema tributário atual, as exportações também têm um bom desempenho e o consumo das famílias têm um desempenho menor porque aquela tributação que incide hoje, cumulativamente, sobre exportações e investimentos, passa a ser cobrada do consumo, mas de forma transparente e o aumento da renda mais do que compensa esse efeito.”
A PEC 45 propõe a unificação de cinco tributos atuais – IPI, PIS, Cofins (federais), ICMS (estadual), ISS (municipal) – em um imposto sobre valor adicionado (IVA), denominado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Esse imposto incidirá sobre a produção e consumo de bens e serviços e não será cumulativo. A arrecadação do IBS será compartilhada entre União, estados e municípios e cada parte terá autonomia para fixação da alíquota, que valerá para qualquer bem, serviço ou direito.
Consumo das famílias
Em relação ao consumo das famílias, o estudo feito pelos economistas da UFMG conclui que o resultado final é positivo, pois o efeito do crescimento da renda ao longo do tempo compensará o aumento nos preços de determinados produtos e, principalmente, dos serviços, que tendem a subir com a implementação da IBS. A expectativa é de que o consumo das famílias cresça entre 1,5% (cenário base) a 24,2% (otimista), mesmo com esse aumento de preço ao consumidor final.
“Com a eliminação dos tributos no consumo intermediário, a tributação do IBS recairia integralmente sobre o consumo final, o que encarece o preço ao consumidor de certos produtos. No entanto, dois pontos são importantes. Por um lado, a variação do preço ao consumidor reflete a queda nos preços básicos (redução de preços decorrente da desoneração dos insumos) e o aumento marginal dos impostos, que agora têm maior incidência no consumo final. Por outro lado, a renda das famílias apresenta uma tendência de crescimento em decorrência do aumento do emprego”, explicam os pesquisadores.
Eles também avaliaram aspectos do impacto da reforma sobre a desigualdade de renda e consumo das famílias. Os resultados mostram que a reforma beneficia todos os grupos de renda, mas especialmente as famílias das faixas inferiores. Famílias com renda de até oito salários mínimos apresentam ganhos acima da média em todas as simulações feitas.
“Esse resultado decorre essencialmente do fato de que, no sistema atual, a cesta de consumo das famílias de maior renda (mais intensiva em serviços) é menos tributada que a cesta de consumo das famílias mais pobres (mais intensiva em mercadorias)”, explicam Cardoso e Domingues.
Para Appy, o efeito da IBS sobre o consumo das famílias prova que se trata de um imposto progressivo, isto é, onera mais os mais ricos.
“Ele [o IBS] é claramente progressivo, e a principal causa dessa progressividade é o fato de que hoje os tributos atuais oneram menos a cesta de consumo dos ricos do que a cesta de consumo dos pobres. A regressividade do sistema tributário atual brasileiro não é só porque pobre consome uma parcela maior da renda. É que, mesmo com a proporção do consumo e mesmo considerando a desoneração da cesta básica, o que o rico consome, que é dominantemente serviços, é menos tributado do que o que pobre consome, que é mercadoria."